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Europa, um futuro com muitos avós e poucos netos

Roberto Savio. Foto: IPS
Roberto Savio. Foto: IPS

Por Roberto Savio* – 

Roma, Itália, junho/2015 – O Instituto para a Pesquisa Economia (IFO) publicou recentemente um informe sobre as projeções demográficas na Alemanha, confirmando que sua população está diminuindo rapidamente.

Esse país perde 1,5 milhão de habitantes desde o último censo de 2011 e estima-se que baixará dos 82,5 milhões, em 2003, para 66 milhões, em 2060, quando a Grã-Bretanha (se ainda existir como tal), será o país mais povoado da União Europeia (UE).

Entretanto, um estudo encomendado pela Comissão Europeia, órgão executivo da UE, descobriu que 23% dos homens alemães pensam que o tamanho ideal de família é “zero filho”. Isso apesar dos 243 bilhões de euros que o governo gasta anualmente em subsídios familiares.

O informe do IFO, que tem sede na cidade alemã de Munique, também calcula que, sem a contribuição dos imigrantes, o número de nascimentos anuais seria de apenas 400 mil, em um país de 82 milhões de habitantes atualmente.

O documento conclui que a redução da renda e da produtividade em razão do envelhecimento populacional é uma grave ameaça para o futuro próximo.

Isso está acontecendo no país europeu que acolhe o maior número de imigrantes, cerca de dez milhões. No ano passado, a Alemanha aceitou quase 700 mil imigrantes. Porém, mesmo com essa política relativamente aberta, sua população está destinada a uma queda pronunciada.

Em nível europeu observa-se a mesma preocupante tendência. Segundo as projeções de população da Eurostat, a agência de estatísticas da UE, as estimativas projetadas para a população europeia “não têm precedentes em nenhuma população humana”.

A agência afirma que, “enquanto em 1960 havia, em média, cerca de três jovens (0-14 anos) para cada idoso (65 anos ou mais), em 2060 poderia haver mais de dois idosos para cada jovem. Em outras palavras, ao contrário do passado, mais avós para menos netos”.

A tudo isso deve-se acrescentar um documento sobre políticas de migração publicado em 2014 pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) segundo o qual, “contrariamente a uma crença generalizada, os imigrantes pouco educados têm melhor situação fiscal – derivada da diferença entre suas contribuições e os benefícios que recebem – em comparação com seus colegas nativos”.

“Os imigrantes com uma posição fiscal menos favorável não a têm devido a uma dependência maior das prestações sociais, mas pelo fato de frequentemente terem salários menores e, portanto, menor aporte contributivo. Os esforços para melhorar a integração dos imigrantes devem ser vistos como um investimento, não como um custo”.

Por sua vez, o governo britânico reconheceu que, apesar de os imigrantes representarem apenas 8% da população, contribuem com 10% do produto interno bruto (PIB), e que, se a imigração cessasse, o crescimento econômico da Grã-Bretanha seria, aproximadamente, 0,5% menor durante os próximos dois anos.

Agora, o que chama a atenção é que esses dados interessam principalmente aos especialistas, apesar de terem implicações políticas fundamentais. Não são publicados pelos meios de comunicação e nenhum parlamentar – sem falar de governos – os utiliza para propor reformas.

A simples razão é que em todos os países europeus surgiram partidos políticos contrários à imigração, em geral direitistas e contra o euro, sobretudo desde a crise financeira de 2008, o que converteu esse tema em tabu.

Ignorou-se a análise do Fundo de População das Nações Unidas que considera que a Europa deixará de ser competitiva em algumas poucas décadas, em parte porque sua população envelhecida significará uma pesada carga para o sistema social, a menos que abra suas portas a pelo menos dez milhões de pessoas.

Em lugar de se oporem aos partidos populistas com uma campanha baseada nos fatos, os governos europeus tentam neutralizá-los incorporando suas reclamações.

Depois que o Partido pela Independência da Grã-Bretanha, contrário aos imigrantes e ao euro, conseguiu quatro milhões de votos nas eleições de maio deste ano, o primeiro-ministro, David Cameron, empreendeu uma campanha entre seus colegas europeus exigindo que lhe permitam expulsar os imigrantes europeus se não encontrarem trabalho no prazo de seis meses, e, entre outras coisas, anular seus direitos aos benefícios sociais.

Este é um exemplo eloquente da diferença entre um estadista e um político. Um estadista faz o que é bom para seu país, ainda que lhe custe caro.

Quando Helmut Kohl, chanceler alemão entre 1982 e 1998, se mostrou partidário da integração europeia e do euro, teve de enfrentar uma opinião pública muito hostil. Para os alemães, sua moeda, o sólido marco, era um símbolo de estabilidade e confiança.

A ideia de uma nova moeda compartilhada com povos considerados pouco responsáveis reviveu memórias da hiperinflação na República de Weimar (1919-1933).

Para tornar possível o euro, Kohl decidiu aceitar que um não alemão, o holandês Win Duisenberg, fosse o primeiro presidente do Banco Central Europeu.

Hoje em dia, a existência da Pegida, uma organização política alemã de extrema direita e anti-islâmica, que conta com uns poucos milhares de membros, é suficiente para paralisar uma política, a chanceler Angela Merkel, que acabou opondo-se ao acordo proposto pela UE para compartilhar, mediante um sistema de cotas, os imigrantes que entram na Europa pelo Mediterrâneo.

Sua posição foi imediatamente compartilhada pela França. Grã-Bretanha e Dinamarca pediram para serem excluídas, enquanto em vários Estados da Europa central e oriental houve campanhas de agitação contra os imigrantes, mesmo sendo estes os países que aportam o grosso da imigração interna na Europa!

Apesar de esses dados e essas projeções estarem disponíveis para o público, a dura realidade é que a Europa caminha para o abismo, a menos que mude de política e aja para aumentar sua população.

Quando a classe política europeia despertará e se dará conta de que o tempo está acabando?

* Roberto Savio é fundador da agência de notícias IPS e editor do boletim de notícias Other News.