Internacional

Projeto de emprego juvenil no Quênia

Mohammed Omar compra um tíquete para utilizar o banheiro no mercado de Kongowea, no Quênia, onde cerca de 1.500 pessoas utilizam os serviços sanitários a cada dia. Foto: Miriam Gathigah/IPS
Mohammed Omar compra um tíquete para utilizar o banheiro no mercado de Kongowea, no Quênia, onde cerca de 1.500 pessoas utilizam os serviços sanitários a cada dia. Foto: Miriam Gathigah/IPS

Por Miriam Gathigah, da IPS – 

Nairóbi, Quênia, 17/11/2015 – Embora o governo do Quênia tenha se comprometido a tirar os jovens da pobreza, em particular os habitantes dos assentamentos informais, a corrupção reinante continua afetando os projetos de emprego concebidos para esse grupo de população. Uma dessas iniciativas, na órbita do estatal Serviço Nacional da Juventude, está envolvido em um escândalo de malversação de fundos estimado em US$ 7,8 milhões.

“Do projeto participam jovens dos bairros pobres. Administramos os resíduos por meio da coleta de lixo sólido, limpeza dos sistemas de drenagem e dos caminhos de acesso dentro do bairro”, explicou Calvin Otieno, morador do assentamento de Kibera, um dos maiores da África. A iniciativa foi aplicada em 63 dos 290 distritos do Quênia, e beneficiou 70 mil jovens nesse país de 44 milhões de habitantes na costa oriental africana.

Estatísticas do Banco Mundial indicam que mais de 40% dos jovens quenianos vivem com menos de US$ 1 por dia. Por isso, “os US$ 4 diários que receberam (pela participação no projeto) durante cinco dias por semana foram uma renda significativa”, apontou o analista Ted Ndebu, de Nairóbi.

Para ajudá-los a melhorar sua situação financeira, os jovens deveriam economizar obrigatoriamente um dólar por dia em uma conta aberta para eles pelo Serviço Nacional da Juventude. Mas é possível que o esforço tenha sido em vão por causa das acusações de malversação de fundos vinculados ao projeto.

“Após uma série de projetos falidos destinados à juventude, desenhados e administrados por funcionários do governo, necessitamos de um modelo eficaz para garantir que esse tipo de projeto não seja destruído por funcionários cobiçosos”, ressaltou Ndebu.

Hamisa Zaja, da organização não governamental Maji na Ufanisi, dedicada aos problemas de água, saneamento e higiene, pontuou à IPS que esse modelo poderia seguir o exemplo de um projeto juvenil que começou a ser aplicado há um ano no mercado Kongowea, no condado de Mobasa. O setor dos mercados públicos, um dos mais dinâmicos da economia informal do Quênia, sofre muitos problemas que devem ser transformados em oportunidades de geração de renda para os jovens, destacou.

Os grandes mercados estão equipados com sanitários que, na maioria dos casos, também tem chuveiros, “mas a maioria das instalações ficou em mau estado porque não são limpas frequentemente e apresentam um grave risco para a saúde de milhares de usuários”, explicou Zaja. “Às vezes a situação leva ao fechamento indefinido dos mercados, o que afeta, direta e indiretamente, milhões de quenianos que dependem do mercado como meio de vida e para adquirir a comida”, acrescentou.

Essa era a situação no mercado de Kongowea em 2014, o que inspirou Zaja a fazer uma proposta ao governador do condado de Mombasa, Hassan Joho. “Há tantos jovens desempregados e nosso país também é conhecido pelo abuso de drogas e outras substâncias, e, mais recentemente, pelo extremismo religioso e a consequente radicalização” da juventude, afirmou.

“O que aconteceria se tivéssemos um projeto para o qual esses jovens seriam contratados para assumir os serviços de limpeza nos mercados, cobrar dos usuários e usar o dinheiro para pagarem a si mesmos ao final do mês?”, perguntou Zaja ao governador. Para isso, no dia 2 de setembro de 2014, Maji na Ufanisi, o governo de Mobasa, os usuários dos mercados e os jovens que trabalhariam como limpadores, caixas e gerentes assinaram um memorando de entendimento.

A iniciativa recebeu o nome de Projeto de Água e Saneamento do Mercado de Kongowea. Zaja recrutou e capacitou os 33 primeiros jovens contratados. “Tivemos apoio do governo do condado e da embaixada da Suécia para comprar equipamentos de limpeza antes que o projeto pudesse se autossustentar. Quando as instalações ficaram prontas, começou a ser cobrada uma pequena tarifa dos usuários. Assim, no primeiro mês do projeto, foram arrecadados US$ 6 mil. No segundo mês esse número subiu para US$ 8 mil, e atualmente arrecada pelo menos US$ 16.600 por mês.

Cerca de 1.500 pessoas utilizam cada um dos seis banheiros, por isso estamos muito ocupados. Embora o mercado abra às 3h00, nós abrimos às 5h00 e fechamos às 18h30”, explicou Adnaan Dino, um faxineiro beneficiário do projeto. Dino também é uma das muitas histórias de êxito do projeto, já que deixou para trás uma vida marcada pelo crime. Alguns de seus companheiros também são ex-detentos, mas agora são capazes de funcionar como membros produtivos da sociedade.

Mohammed Omar, outro beneficiário, destacou que agora há pelo menos 90 jovens com emprego no mercado. “Isso significa que podemos trabalhar em turnos, e muitos voltaram a estudar. O projeto oferece bolsas completas a vários jovens em colégios e universidades”, afirmou. Cerca de dez jovens assistem aulas noturnas na universidade, confirmou Zaja. “Também pagamos as mensalidades para 34 alunos que vivem com deficiências”, acrescentou.

Omar disse que se avizinham mais oportunidades de emprego, “já está quase pronto o novo bloco, que será maior do que o restante, com 20 sanitários com chuveiros”. Zaja afirmou que os jovens também trabalham para cuidar da gestão de resíduos do mercado, que conta com 42 seções. Os beneficiários trabalharão em turnos e receberão no total pelo menos US$ 300 por dia pelo serviço.

O projeto não só recebeu elogios em nível local como também ganhou o Prêmio Juvenil de Saneamento da África 2015, vencendo mais de mil competidores de 54 países africanos. Envolverde/IPS