Internacional

Parlamentares querem erradicar a fome

O legislador peruano Jaime Delgado lê a declaração final do VI Fórum da Frente Parlamentar Contra a Fome da América Latina e do Caribe, em Lima. Na mesa, da esquerda para a direita, John Preissing, representante da FAO no Peru, a legisladora equatoriana María Augusta Calle, e sua colega uruguaia, Bertha Sanseverino, com outros participantes do encontro. Foto: Aramís Castro/IPS
O legislador peruano Jaime Delgado lê a declaração final do VI Fórum da Frente Parlamentar Contra a Fome da América Latina e do Caribe, em Lima. Na mesa, da esquerda para a direita, John Preissing, representante da FAO no Peru, a legisladora equatoriana María Augusta Calle, e sua colega uruguaia, Bertha Sanseverino, com outros participantes do encontro. Foto: Aramís Castro/IPS

Por Aramís Castro e Milagros Salazar, da IPS- 

Lima, Peru, 23/11/2015 – Com oito compromissos específicos para impulsionar leis e políticas a favor da segurança e da soberania alimentar, da agricultura familiar e da alimentação escolar, legisladores de 17 países encerraram o VI Fórum da Frente Parlamentar Contra a Fome da América Latina e do Caribe, realizado na capital peruana entre os dias 15 e 17 deste mês.

Durante o encontro, os delegados dos capítulos nacionais da Frente Parlamentar Contra a Fome (FPF) reafirmaram a determinação de impulsionar leis que permitam “romper o círculo de pobreza e realizar o direito à alimentação” na região. Os mais de 60 legisladores que participaram do fórum, incluídos convidados da África e da Ásia, indicaram em sua declaração final que a região foi a que conseguiu a maior queda das taxas de subalimentação no mundo, ao baixá-las em mais da metade, no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), vigentes nos últimos 15 anos.

Mas, após destacar esses resultados, John Pressing, representante no Peru da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), exortou os parlamentares a não se contentarem “com médias”, que escondem desigualdades entre os países e dentro deles. Também destacou que “será muito mais difícil” a região baixar os índices de fome para 2% ou 3%, do que tê-los reduzido de 32% para 7%. Na América Latina e no Caribe, aproximadamente 37 milhões de seus quase 600 milhões de habitantes ainda sofrem fome, do total de 795 milhões de pessoas nessa situação no mundo, afirmou-se durante o fórum.

Na declaração é ressaltada a importância de a FPF trabalhar junto com os governos de cada país para criar programas e promulgar leis que erradiquem a fome e promovam os três eixos escolhidos para fazê-lo: segurança e soberania alimentar, agricultura familiar, alimentação escolar. Para impulsionar esses três eixos complementares, foram fixados oito acordos específicos, entre eles a necessidade de os parlamentares da FPF participarem do debate sobre os orçamentos públicos, para assim garantir que os governos financiem programas de luta contra a fome.

A declaração final se alimentou das conclusões das mesas de trabalho sobre os três grandes eixos, onde um dos temas centrais foi a importância de impulsionar políticas públicas para beneficiar os pequenos produtores. Em outro acordo, os legisladores regionais se comprometeram a apoiar um novo conceito acordado de soberania alimentar.

“Depois de seis anos de debates, entendemos como soberania alimentar eliminar a injustiça para preservar o ambiente e a biodiversidade”, ressaltou à IPS a legisladora equatoriana María Augusta Calle, ratificada pelo Fórum como a coordenadora regional da FPF. Para ela, o próximo passo será entregar os acordos (principalmente os vinculados à soberania alimentar) aos chefes de Estado e de governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac), durante a cúpula que realizarão em janeiro de 2016. “Eles pediram a elaboração do conceito de soberania alimentar que foi discutido nesse espaço”, acrescentou.

Integrantes da Frente Parlamentar Contra a Fome da América Latina e do Caribe assinam a declaração final do VI Fórum dessa iniciativa, durante seu encerramento no dia 17 deste mês em Lima, no Peru. Foto: Aramís Castro/IPS
Integrantes da Frente Parlamentar Contra a Fome da América Latina e do Caribe assinam a declaração final do VI Fórum dessa iniciativa, durante seu encerramento no dia 17 deste mês em Lima, no Peru. Foto: Aramís Castro/IPS

Os parlamentares também acordaram apoiar o grande plano da Celac de que em seus países membros se alcance a meta de “fome zero” até 2025, cinco anos antes do que estabelecem os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aprovados pela comunidade internacional em setembro. Bertha Sanseverino, deputada uruguaia e coordenadora sub-regional da América do Sul da FPF, afirmou à IPS que no encontro foram fixados compromissos de longo prazo para “erradicar a fome até 2025” na região, destacando que para isso será necessária “toda uma engenharia de políticas públicas e leis”.

Um eventual obstáculo para avançar nas muitas iniciativas que impulsionam os capítulos nacionais da FPF é a inevitável e democrática renovação dos parlamentos afirmou Sanseverino. “Às vezes se tem uma boa Frente, mas esses legisladores encerram seus mandatos. No ano seguinte nos vemos diante da necessidade de voltar a ordenar a Frente”, explicou. Pressing reconheceu que “estamos em uma corrida contra o que está pendente” para a erradicação da fome. “Mas podemos fazê-lo, há evidências aqui, há compromissos ali”, pontuou, otimista.

O Fórum apoiou expressamente a agricultura comunitária e camponesa, bem como os conhecimentos e as práticas ancestrais dos povos indígenas latino-americanos como instrumentos de uma alimentação saudável e diversa. Também alertou para um novo problema alimentar que começa a afetar a população latino-americana, a “comida não saudável”, cujo consumo está trazendo à região problemas de saúde nunca vistos até agora, como a obesidade.

Antes do encerramento do Fórum, todos os participantes enviaram um comunicado ao presidente do Peru, Ollanta Humala, exortando-o a aprovar o regulamento da lei de promoção de alimentação saudável, promulgada em maio de 2013. A falta dessa regulamentação impede sua aplicação. “Essa lei foi pioneira na América Latina e eles (os participantes do Fórum) se surpreenderam pelo fato de mesmo pioneiros não a termos regulamentado”, contou à IPS o coordenador do capítulo peruano da FPF, Jaime Delgado, recordando que a lei foi tomada como modelo por países como o Equador.

Delgado acrescentou que a FPF local vigia para que no orçamento de 2016, que está para ser aprovado, sejam destinados recursos para erradicar a pobreza, e criticou o fato de “não haver programas que beneficiem os pequenos agricultores”, que são o principal elo da segurança alimentar do país.

No próximo ano, os membros da frente regional se reunirão no México, em uma nova edição do fórum parlamentar. Envolverde/IPS