Por Ana Carolina Amaral, especial de Paris para Envolverde –
Uma avalanche de eventos concorrentes. Um turbilhão de informações. Um furacão de anúncios, notícias, novas parcerias e investimentos. Tudo isso compõe – licença para o trocadilho – os eventos climáticos extremos da COP do Clima. Muitas vezes alertados em cima da hora, eles podem ser extremamente enganosos. Dão a impressão de que está tudo bombando (sem trocadilho aqui, gente!).
Se a decisão é cobrir o evento do fim dos subsídios aos combustíveis fósseis (pauta bombada da segunda-feira), vamos lá ouvir o ministro da Nova Zelândia no palco – quem logo depois ganhou o respaldado antiprêmio Fóssil do Dia, por ter aprovado mais finaciamento à produção de combustíveis no seu país. Se a pauta é florestas, vamos lá ouvir o ministro Joaquim Levy atribuindo ao novo Código Florestal o sucesso da conservação brasileira – elogiada por outros líderes como um modelo a ser seguido, apesar do desmatamento ter aumentado no último ano. Alguns alertas de eventos atribuiram às florestas o grande foco de atenção da terça-feira. Já para essa quarta os lançamentos, anúncios e parcerias decidiam – como que em um movimento orgânico, só que não – dar atenção aos esquecidos oceanos e à questão primordial do clima: a água. Para o últimos dias da semana estão programados eventos sobre resiliência e adaptação.
É impressionante que em três dias de COP esses temas importantes tenham marcado presença na agenda com discursos que tocam na ferida, junto a anúncios de parcerias e investimentos voluntários. Desta vez, o que nos distrai do que está em jogo não é um problema, mas um chafariz jorrando permanentemente litros de soluções voluntárias, envolvendo os vários setores da sociedade. Elas incidem sobre o cerne das questões climáticas e, por isso, fazem parecer que a COP está dando certo. Quando, factualmente, os acordos, investimentos e parcerias que nos trazem aqui mal começaram a acontecer.
Esta é a chance, em cima da hora, de se chegar a um acordo climático que substitua o findo Protocolo de Kioto e inaugure uma fase de compromissos centrais com a questão climática, já que o futuro chegou e estamos falando de consequências já presentes. O texto desse documento ainda está praticamente todo entre colchetes, ou seja, com múltiplas sugestões que podem firmar ou afrouxar os nível de comprometimento dos países. Ainda não se sabe se o documento terá força de lei, como vamos financiar essa transição para uma economia de baixo carbono, como distribuir as responsabilidades diferenciadas entre os blocos de países, como se darão as parcerias para transferência tecnológica e o suporte aos países mais afetados. As propostas que os países fizeram ao longo do ano para corte de emissões (os INDC) ajudam e criam disposição para um acordo, mas não são suficientes para limitar o aquecimento médio a menos de 2oC. E, adivinha? Também não se sabe ainda qual instrumento vai complementar o que faltou nas metas voluntárias.
Além dos chamados para os anúncios voluntários no espaço das negociações, no pavilhão vizinho acontece a conferência paralela, organizada pela sociedade civil – espalhada também em outros prédios no Centro de Paris. São milhares de iniciativas locais que vêm mostrar seu trabalho e dar um recado ao mundo: a transição para a economia de baixo carbono já está acontecendo. Localmente, mas pelo mundo todo. Ao andar por lá, a intuição fala alto: vivemos uma transição poderosa e irreversível.
A COP-21 representa bem este momento de transição: aqui temos a conclusão e início, em que se espera concluir uma acordo climático global e também dar a largada para um novo modelo econômico. Ela prova que a mudança acontece nos dois sentidos: de baixo para cima e de cima para baixo, o tempo todo, em um sistema de retroalimentação natural. Porém, a retroalimentação só funciona sob a pressão dos que se relacionam. Aí mora minha pergunta: como delegações e sociedade civil podem se influenciar se pouco se relacionam, pressionam, propõem? Apartados em diferentes espaços, com pautas distintas e mensagens concorrentes – “o que importa está aqui e não lá” -, esses dois grupos de atores perdem a chance de diálogo – justamente o que deveria ser o cerne de uma conferência mundial. Saímos de todos os cantos para, no umbigo do planeta, marcar encontro com os nossos? Por ora, tem sido assim: cada macaco no seu galho. E o jogo segue entre colchetes. (#Envolverde)
*Ana Carolina Amaral é jornalista formada pela Unesp, mestra em Ciências Holísticas pelo Schumacher College (UK) e moderadora da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental.