No início da década de 1990, chegou à casa dos meus pais um PC-AT 486. Na época, era uma sensação – não havia nada mais rápido. Meu pai trabalha com engenharia, então aquilo era visto como um instrumento necessário e não um “brinquedo” – como ressaltava a minha mãe. Ou seja, havia até certa reverência à máquina branca, que desbancou a televisão e um vaso de estimação e ocupou o lugar de objeto mais importante da sala. Lembro que o meu micro Expert, da família do Hotbit, que rodava programas a partir de fitas cassetes, fugiu de casa de vergonha. Nunca mais foi visto.
Os programas vinham em vários disquetes de 5¼ ou 3½ e levavam horas para serem instalados. Mas quem se importava? O ruído da impressora matricial mastigando a fita – que fazia o cachorro latir e só podia ser usada durante o dia, pois à noite acordava os vizinhos – era o estado da arte da tecnologia.
E, é claro, havia o acesso à rede. O computador da casa tinha uma placa de modem discado de 2.400 bps de velocidade, com a qual eu acessava BBSs e trocava arquivos com amigos. Trocar arquivos era um programa lúdico – para baixar uma merreca de 1Mb levava-se uma eternidade. Hoje, meu celular faz isso na velocidade de um torpedo.
Um dia especial foi quando criei meu primeiro e-mail. Hoje, olhando daqui, me sinto um completo idiota. Com medo de não ser achado ou ser confundido com outra pessoa, criei o endereço [email protected] (sim, eu tenho um nome do meio). Faltou só o RG e o CPF para poder abrir conta em banco. Tirando os informes do provedor, nunca recebi uma mensagem sequer.
Feito esse preâmbulo, chego à história que motivou o post.
Na época, um amigo me ligou para fazer uma consulta:
– Cara, você que sabe dessas coisas de tecnologia (ter um computador em casa dava, imediatamente, um título honoris causa em tecnologia – mesmo que a pessoa não soubesse o que era um HD. E se eu tivesse ganhado um poodle micro toy, seria especialista em tosa?), me explica como é que eu faço para mandar um e-mail para todo mundo.
– Todo mundo quem, amigos, família?
– Não, não sacaneia. Você entendeu: todo mundo.
– Todo mundo quem?
– Todo mundo, o mundo inteiro. Todos. Sabe a loja do meu pai? Então, ele pediu para eu mandar um e-mail para todo mundo que tem e-mail fazendo uma propaganda (E Deus disse: Haja spam! E houve spam. E ele viu que era bom.).
– Sei lá se dá. Coloca “all” no destinatário, de repente chega para quem você tem registrado.
– Sabe de uma coisa, você é o maior picareta, não entende de nada mesmo. Vou deixar em branco. Acho que deve dar.
Anos depois, meu pai vendeu o 486 e comprou outro, mais novo. Lembro que minha mãe ficou possessa porque iam pagar apenas uma parte ínfima do valor que havíamos pago, em suadas e longas prestações. Não adiantou falar que a tecnologia avança, barateia, Lei de Moore, essas coisas. Se o carro podia ser vendido por mais da metade do preço de compra, por que o micro não?
Acabei de fazer um download de um vídeo. Demorou menos tempo que escrever este post. Ou seja, a tecnologia me fez ganhar muito tempo nas duas últimas décadas.
Tempo que alguém comeu, porque eu não vi.
* Publicado originalmente no Blog do Sakamoto.