Somente quatro dos 12 países da Ásia ocidental estão acima do limite da escassez de água, de mil metros cúbicos por pessoa ao ano, o mínimo viável para um ser humano.
Por Manipadma Jena, da IPS –
Nairóbi, Quênia, 21/6/2016 – “A escassez de água potencialmente poderia ter maior impacto nas qualificações de crédito soberano do que as catástrofes naturais, já que as condições de escassez de água demoram a aparecer”, apontou Moritz Kraemer, diretor-gerente da agência qualificadora Standard & Poors Global Ratings.
“A escassez de água, a migração e os conflitos ainda não são levados em conta para a Análise da Integração do Risco Ambiental ao Crédito Soberano (Erisc), mas certamente temos que fazê-lo”, opinou Kraemer.A Erisc pretende ajudar as instituições financeiras a integrarem os riscos ambientais às suas avaliações de risco e às decisões de investimento, mediante a identificação e quantificação da forma em que podem afetar o rendimento econômico dos países e, portanto, o custo do crédito no mercado da dívida soberana.
A análise parte da base de que o risco soberano pode ser materialmente afetado por riscos ambientais como a mudança climática, escassez de água, degradação dos ecossistemas e o desmatamento.“Até o momento não temos dados suficientes sobre as possíveis consequências econômicas da escassez de água ou da mudança nos padrões de chuva para simularmos numericamente o resultado, mas sabemos que os países com grandes problemas hídricos terão repercussões muito além de suas fronteiras, o que desatará movimentos migratórios, para começar. A Europa é um exemplo”, alertou Kraemer.
A Ásia ocidental é importante geopoliticamente porque vincula África, Ásia e Europa.“A Jordânia era, em 2013, o quarto país com maior escassez de água do mundo, mas em apenas dois anos, em 2015, sua situação se deteriorou e foi para o segundo lugar quando centenas de milhares de refugiados sírios e iemenitas emigraram” para o reino jordaniano, explicou Carl Bruch, do Instituto de Direito Ambiental, com sede em Washington.
“Muitas das economias com problemas hídricos, como Jordânia e Marrocos, já têm baixas qualificações de crédito. Ainda é necessárioinvestigarmais”, ressaltouKraemer à IPS, por ocasião da segunda Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente, realizada no final de maio em Nairóbi, onde ministros de todo o mundo se reuniram para tomar decisões sobre a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável.
“Existe uma estreita ligação entre os problemas políticos e sociais derivados do deslocamento, mas o fato de as pessoas decidirem se trasladar, em última instância, se deve frequentemente a problemas ambientais, cada vez mais em razão da escassez de água que se repete muito na Ásia ocidental”, destacou Jacqueline McGlade, diretora de Alerta e Avaliação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
A degradação do solo, a desertificação e a escassez de recursos hídricos renováveis são os problemas mais graves da Ásia ocidental, na medida em que os conflitos afetam diretamente o ambiente e a saúde, o que prejudica a capacidade de a região produzir alimento suficiente para sua crescente população, especialmente na sub-região de Mashreq, que inclui Iraque, Jordânia, Líbano, os territórios palestinos ocupados, Síria e Iêmen, segundo a sexta Perspectiva de Meio Ambiente Mundial (GEO-6), divulgada em maio pelo Pnuma.
Com o aumento da demanda, a Ásia ocidental agora enfrenta a deterioração da qualidade da água devido à superexploração das águas subterrâneas, invasão marinha, esgotamento e salinização dos aquíferos, além do aumento dos custos para bombear. A região já superou sua capacidade natural para atender sua própria demanda de alimentos e água.
Embora as prioridades da região sejam paz, segurança e ambiente, o ciclo vicioso da degradação, consequência e motivo dos conflitos, pode impedir que as pessoas regressem para suas casas e normalizem suas vidas e, ao mesmo tempo, a economia, destacou Daria Mokhnacheva, especialista da Organização Internacional para as Migrações (OIM).
“A maioria dos refugiados dos conflitos no Iraque não poderá voltar para suas casas e normalizar suas vidas, embora seja o que desejem, se antes forem retiradas as minas e munições sem explodir colocadas no que costumavam ser seus terrenos. E a eliminação das minas pode demorar décadas”, acrescentou Mokhnacheva.
Por outro lado, embora o Iraque tenha a maior superfície de terras de cultivo disponíveis na região, é o país que mais sofre com a salinidade do solo e a erosão eólica. Cerca de 97% do território iraquiano é árido, a desertificação afeta 39% do total, e 54% está sob ameaça, segundo a GEO-6.
“Os agricultores e pastores tradicionais podem permanecer nos acampamentos temporários durante anos, e estes, se estão em áreas com escassez de água ou propensão à seca, poderão provocar numerosos deslocamentos”, pontuou o especialista da OIM.Segundo ele, “a migração para zonas urbanas destrói seus estilos de vida, costumes e formas de vida por completo, o que aumenta a vulnerabilidade. Com uma estada de longo prazo nos acampamentos, as meninas e mulheres se convertem em alvo dos traficantes, e meninas até nove anos de idade são obrigadas a casar para reduzir a pressão por alimentos”.
“Temos evidência da Ásia ocidental de que a transição das áreas rurais para as urbanas começa a semear as sementes do deslocamento que, em última instância, pode levar aos conflitos”, alertou McGlade. “Assim, o verdadeiro problema para a governabilidade ambiental é se podemos detectar com suficiente antecedência as condições em que é provável falhar a segurança alimentar ou hídrica, e se podemos identificar esses pontos críticos para tomar medidas preventivas e as pessoas não abandonem as terras”.
“Já vimos três milhões de pessoas procedentes da Síria e do Iêmen em movimento rumo à fronteira com a Jordânia. Esse êxodo poderia ter sido evitado?”, perguntou McGlade.Para Mokhnacheva, “devemos integrar a investigação sobre as migrações e o ambiente com aquela sobre a vulnerabilidade social, a fim de identificar os pontos críticos de forma precoce. Também temos de melhorar a evidência local para informar às políticas de migração que podem responder às necessidades reais”. Envolverde/IPS