Por Dal Marcondes –
(…) O homem busca e imortalidade no lugar errado. Na verdade todos são imortais (ou pelo menos sentem-se como) entre os 15 e os 25 anos (..) Os 40 são a idade das resoluções: paramos de fumar, beber menos, comer direito, nos preservar para, quem sabe, ter 50, 60, e assim por diante. Com 40 acabamos por perceber que não apenas não somos imortais como aos 20, mas que a mortalidade nos assombra à porta(…)
Creio que a primeira vez que tomei consciência de mim foi próximo aos 10 anos. Até então eu não era mais do que um adendo de meus pais, junto com meus irmãos. Um bando de crianças barulhentas que pouco se importava se os adultos tinham ou não problemas. Afinal, servíamos apenas para satisfazer nossas próprias necessidades.
Aos 10 anos olhei em volta e descobri que poderia cometer coisas diferentes daquelas que fazia abertamente na frente dos meus pais. Comecei por roubar cigarros e fumar escondido. Depois passei a roubar cigarros para dar à vizinha de 15 anos que, assim nos deixava, a mim e ao Cláudio, filho a tia Alba, vizinha e diretora da escola primária, ver seus seios.
Outro salto de qualidade na minha vida se deu aos 13 anos. Foi quando tive a primeira namorada de beijo na boca. Emocionante. Comecei a me sentir dono de meus destinos, viajar e a olhar pela janela em busca de horizontes mais largos, tipo as pernas da moça dirigindo o carro ao lado do ônibus. Aos 15 realmente a independência, a vida como ela é. Ao menos era o que eu imaginava. Um imortal capaz de tudo realizar, de tudo conseguir e de tudo possuir, inclusive uma amiga de mamãe, que depois de tomar mais conhaque do que deveria passou a me olhar com um jeito diferente, me acariciar de uma forma estranha e colocar as mãos onde nenhuma mulher jamais esteve. Adorei!!!
Ai começou um turbilhão. O homem busca e imortalidade no lugar errado. Na verdade todos são imortais (ou pelo menos sentem-se como) entre os 15 e os 25 anos. Viajei, fumei, cheirei, bebi, trepei e fiz milhares daquelas coisas que ou engordam, ou são ilegais, ou são imorais. Me preparei para ser “gente grande”.
Aos 25, formado, passei a achar que já sabia realmente tudo. Homem vivido, cheio de experiência para dar e vender, sempre um conselho na ponta da língua. Em suma, um perfeito e lindo idiota. Dos 25 aos 30 é a época da arrogância. Começamos as perceber que a imortalidade acaba, mas apenas para os outros, que a vida é difícil, mas não para nós, que as pessoas são injustas, mas nunca conosco e que se não tomarmos cuidado, nos ferramos, porque somos exatamente iguais a todo mundo.
Chegam os 30 anos. A idade da razão. Temos a beleza, o conhecimento e a virtude. Temos também filhos, dívidas, aluguel atrasado, estresse, falta de tempo, dois empregos, um (ou mais) chefes pentelhos que não nos dão o devido valor, uma parceira em crise (quando você diz bom dia ela responde que precisamos conversar sobre a relação) e, se tiver sorte, uma amante.
A década dos 30 passa como uma corrida de obstáculos. As rugas se acumulam e os cabelos embranquecem diante de desafios cada vez maiores e inusitados. Derrepente o dinheiro passa a ter uma dimensão nunca antes prevista, o mundo fica estressante, principalmente porque ler jornal não é mais um prazer, mas uma infernal obrigação. Na verdade não quero saber nada do que está escrito lá. Quero mesmo é encontrar um confortável buraco no chão e lá enfiar a cabeça para sempre. Como não temos coragem de fazer isto, chegam os 40.
Ah! Os 40. Metade da vida (se tiver sorte). Já percebemos que, com o tempo, tudo cai e tudo dobra, mas será que é tão ruim assim? Os 40 são a idade das resoluções: paramos de fumar, beber menos, comer direito, nos preservar para, quem sabe, ter 50, 60, e assim por diante. Com 40 acabamos por perceber que não apenas não somos imortais como aos 20, mas que a mortalidade nos assombra à porta. Contudo, não podemos olhar para os 40 com a visão dos 30. Qualquer um que olhar os 40 com a ótica de 30 vai apreciar uma leve decadência. Mas tire-se a arrogância da idade da razão e coloque-se as lentes da compreensão e vê-se um mundo novo se descortinando. Neste novo mundo os valores se transformam e um certo toque de sabedoria começa a surgir. Ainda não é a consciência cósmica dos 50/60, quando os netos preenchem os vazios que a vida criou, mas lampejos de que, de alguma maneira, viver é bom.
Aos 40 surge o senso crítico que seria impossível anos antes. A tranqüilidade que seria taxada como irresponsável ao ascensor social e profissional dos 30. Aos 40 ganha-se peso na cintura e uma esbelta lucidez na alma.
É um bom tempo para viver, ter amigos, construir relações, escrever livros. É um tempo onde pode-se relaxar sem medo de parecer desatento. Pode-se amar sem medo da paixão, pode-se construir e pode-se olhar os amigos com afeto. Eles são amigos de muito tempo e já provaram que gostam de ti, não precisam fazer mais nada além de estar ali. (#Envolverde)
* Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde, passou por diversas redações da grande mídia paulista, como Agência Estado, Gazeta Mercantil, Revistas Isto É, Exame e Carta Capital. Desde 1998 dedica-se a cobertura de temas relacionados ao meio ambiente, educação, desenvolvimento sustentável e responsabilidade socioambiental empresarial.