A crescente necessidade de diesel com baixo teor de enxofre abriu as portas para a Amyris Brasil, empresa com sede em Campinas (SP), que tem desenvolvido a produção de um diesel proveniente da cana de açúcar como alternativa ao derivado do petróleo. As duas maiores cidades brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro, já têm testado a tecnologia em parte da frota de ônibus que atendem suas respectivas populações.
Voltada para oferecer alternativas sustentáveis a uma ampla variedade de produtos derivados do petróleo, a empresa utiliza sua plataforma industrial de biologia sintética para converter açúcares de plantas em diversas moléculas de hidrocarbonetos – substâncias de estrutura flexível que podem ser utilizadas em vários produtos.
O diesel renovável da Amyris demonstrou ter desempenho superior em baixas temperaturas, alto teor de cetano e densidade de energia comparável ao oriundo do petróleo, o que possibilitou que a empresa obtivesse o registro de mistura na categoria máxima da Agência de Proteção Ambiental norte-americana.
Na terça-feira, 26 de julho, foi lançado no Rio de Janeiro o projeto Diesel de Cana – rumo a 2016, durante o Seminário de Tecnologias Sustentáveis no Transporte. A iniciativa é resultado de parceria entre o governo fluminense, a prefeitura carioca e a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor). Nos próximos 12 meses, o projeto testará a adição ao diesel fóssil de 30% de diesel obtido a partir da cana-de-açúcar em 20 ônibus. Depois, serão 30 veículos de transporte de passageiros. Eles vão operar nas linhas 125 (Central do Brasil-Praça General Osório) e 409 (Praça Saens Pena-Jardim Botânico). A produção em escala do diesel de cana está prevista para o ano que vem.
A avaliação de desempenho, de redução de emissões, controle de consumo, impactos na durabilidade e nos dispositivos de injeção de motor durante os testes será feita pela Coordenação de Programas de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), em conjunto com a Mercedes Benz, a BR Distribuidora e a Michelin, também parceiras no projeto.
“A gente está falando de um potencial de redução de emissão de gases de efeito estufa de até 90%, porque o combustível é feito a partir de biomassa renovável, no caso a cana-de-açúcar. Em vez de o usineiro fazer álcool, ele pode botar a matéria-prima em outra linha e fazer diesel”, destacou à Agência Brasil o gerente de Planejamento e Operações da Fetranspor, Guilherme Wilson.
Grandes eventos
Os resultados dos testes serão apresentados durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que será realizada na capital fluminense em junho de 2012. Wilson adiantou que esses resultados determinarão a estratégia de adoção do produto pela frota de veículos de passageiros.
A principal vantagem do diesel de cana, destacou o gerente da Fetranspor, é que não haverá necessidade de alteração mecânica nos motores. Com isso, as empresas não terão que fazer investimentos adicionais para substituir o diesel fóssil pelo de cana. O presidente da Amyris Brasil, Paulo Diniz, observou que isso acaba também refletindo no bolso do consumidor, “uma vez que a população não vai ter que pagar por nenhuma adaptação a mais, por nenhum tipo de aditivo diferente”.
Tendo em vista a realização no Rio de Janeiro de eventos como a Rio+20, em 2012; a Copa das Confederações, em 2013; a Copa do Mundo, em 2014; e as Olimpíadas, em 2016, Diniz confirmou que a ideia é ir ampliar cada vez mais o número de ônibus das frotas movidos a diesel de cana, de forma a permear todo o mercado.
São Paulo implanta a novidade em agosto
A empresa, que investiu cerca de US$ 500 milhões no desenvolvimento dessa nova tecnologia, iniciará o fornecimento para 160 ônibus de São Paulo a partir de agosto deste ano, por meio de uma mistura de 10% de diesel renovável, sendo que os 90% restantes virão do biodiesel e do diesel de petróleo fornecidos pela Petrobrás Distribuidora. O contrato de fornecimento vai até o final de 2012.
“Após o lançamento bem sucedido de nossa primeira unidade de produção em escala industrial e os resultados positivos dos testes com frotas no Brasil, estamos entusiasmados por sermos o fornecedor comercial de combustível renovável para ônibus na maior cidade brasileira. Ao longo do próximo ano, à medida que expandimos nossos acordos de fornecimento com as frotas de ônibus de São Paulo, esperamos alcançar US$ 10-12 milhões em vendas anuais”, projetou John Melo, CEO da Amyris.
A crescente demanda de diesel com baixo teor de enxofre no Brasil cria uma grande oportunidade para destacarmos a superioridade do desempenho e dos benefícios de nosso diesel renovável ao mesmo tempo em que possibilita ao país reduzir a importação de combustível diesel, que compreende aproximadamente 20% da necessidade de diesel no Brasil em 2010 – John Melo.
A cidade de São Paulo tem mais de 15.000 ônibus que consomem cerca de 450 milhões de litros de diesel por ano. O diesel de cana de açúcar da Amyris objetiva, segundo a empresa, ajudar a cidade a alcançar a meta de reduzir o uso de combustíveis fósseis no sistema de transporte público. Em consonância com a legislação municipal, São Paulo está trabalhando para reduzir o uso de diesel fóssil em 10% a cada ano até 2018.
“Os testes que realizamos no ano passado com nossos parceiros, a SPTrans, a Mercedes-Benz, a Petrobrás Distribuidora e a Viação Santa Brígida, confirmaram que uma mistura de 10% do diesel da Amyris no diesel de baixo teor de enxofre da Petrobrás (B5 S50) pode reduzir a opacidade (fumaça) em até 40%”, reforçou Paulo Diniz.
Aviação estuda possibilidade
Outro setor da área de transportes que poderá implantar o diesel da cana de açúcar, em breve, é o da aviação, que responde por 2% das emissões mundiais de gases-estufa, segundo dados da ONU. Recentemente, a Boeing Company, a Embraer e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) anunciaram que, juntos, financiarão uma análise de sustentabilidade para produção do biocombustível para jatos desenvolvido pela Amyris a partir da cana-de-açúcar brasileira.
Coordenado pela Icone, uma incubadora brasileira de pesquisas com vasta experiência na agricultura e análise de biocombustíveis, o estudo avaliará condições ambientais e mercadológicas associadas ao uso do combustível de fonte renovável para jatos. O World Wildlife Fund (WWF) atuará como consultor independente.
* Publicado originalmente no site EcoD.