[media-credit name=”178 TERRAMÉRICA Desafio petroquímicoJorge Luis Baños/IPS” align=”alignleft” width=”340″][/media-credit]
Pescadores chegam ao porto próximo da fortaleza de Nossa Senhora de los Ángeles de Jagua, em Cienfuegos.
Cuba prepara uma bateria de instrumentos ambientais para que a Baía de Cienfuegos assimile, sem contaminação, seu iminente desenvolvimento petroquímico.

Cienfuegos, Cuba, 8 de agosto de 2011 (Terramérica).- Predestinada a se converter em entreposto petroquímico estratégico de projeção regional, a cidade cubana de Cienfuegos está diante do dilema de manter sustentável um desenvolvimento que pode comprometer a saúde da Baía, seu principal recurso natural. Quase 85% das bacias do território da província de Cienfuegos lançam suas águas no ecossistema marinho em torno do qual ocorre todo o desenvolvimento industrial e urbanístico de sua capital, de mesmo nome, desde que colonos franceses a fundaram, em 1819, com o nome de Fernandina de Jagua.

Localizada 250 quilômetros a sudeste de Havana, Cienfuegos foi declarada, em 2005, Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Vejo agora estas águas bastante limpas. Houve tempos em que, quando chovia e os rios chegavam ao mar, depois víamos muitos peixes mortos. Parece que essa água doce vinha contaminada”, disse ao Terramérica Jaime Pérez, que fala com a experiência de seus 80 anos, quase todos dedicados ao ofício de pescador.

Os desafios atuais são outros: a poluente indústria petroquímica. O megaprojeto é parte da refinaria de petróleo Camilo Cienfuegos, modernizada com financiamento venezuelano, após 14 anos de paralisação, que processa 65 mil barris (de 159 litros cada) diários. É iminente o começo de novos trabalhos para ampliá-la e elevar sua capacidade de refino para 150 mil barris por dia. Para abastecer a refinaria, a cargo da empresa de capitais cubanos e venezuelanos Cuvenpetrol, nos primeiros seis meses deste ano 200 navios-tanque da Venezuela passaram pelo estreito canal que une o Mar do Caribe e a Baía.

“A refinaria fica no lugar mais adequado, mais ao leste e ao sul”, afirmou o engenheiro Reynaldo Acosta, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente. Para instalar as obras, foram levados em conta, entre outros critérios, as correntes marinhas, os processos de erosão e as águas subterrâneas que podem ser contaminadas, explicou Acosta. O complexo inclui usinas de amoníaco, ureia, policloreto de vinil (PVC, usado na fabricação de “petrocasas” de iniciativa venezuelana) e uma regaseificadora. A expansão conta com investimentos da China, em valores não divulgados.

A obra também faz uma aposta estratégica: o petróleo que Cuba encontrar em poços de águas profundas que começará a perfurar este ano no Golfo do México. A fábrica de amoníaco – que será destinado às indústrias do níquel, frigorífica e de fertilizantes – fica em uma área próxima à que processará gás natural liquefeito, necessário para seu funcionamento. O polo petroquímico consta dos acordos da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), da qual também são membros Antigua e Barbuda, Bolívia, Dominica, Nicarágua, Equador e San Vicente e Granadinas,

A demanda por mão de obra já se dinamizou na província de 407 mil habitantes. Para ampliar a refinaria foram empregados 1.800 engenheiros, enquanto escolas de Cienfuegos estão formando técnicos e operários especializados em petroquímica. A atividade econômica de Cienfuegos nasceu com a pecuária e o açúcar, aproveitando rios que eram navegáveis e tinham saída para a Baía. O porto, fábricas de ração e fertilizantes, um moinho de cereais e o terminal açucareiro a granel marcaram um desenvolvimento que deixou uma pesada herança ambiental para as atuais gerações.

“Os avós diziam que a Baía era um cristal, e que antes havia mais florestas, que foram cortadas para plantar cana-de-açúcar ou abrir caminho para a ferrovia. Sem árvores e com o crescimento da indústria açucareira, aumentaram os processos de erosão e os resíduos sólidos e poluentes em bacias e rios”, explicou ao Terramérica o diretor do Centro de Estudos Ambientais de Cienfuegos, Alain Muñoz. O Centro, criado em 1999 pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, é responsável por controlar a qualidade ambiental da baía, de 88 quilômetros quadrados.

A cada três meses suas águas são monitoradas. É uma das baías mais estudadas do país por ser um ponto de abastecimento no tráfego marítimo do Caribe e pela riqueza de sua flora e fauna. Segundo autoridades do Ministério ambiental, na década de 1990 começou um trabalho de reordenamento da atividade econômica, incluída a agropecuária, destinado a proteger a Baía. Contudo, o polo petroquímico agiganta o desafio ambiental. Com a experiência acumulada será criado no curto prazo um grupo estatal integrado por pessoal especializado para atender a Baía, a fim de harmonizar necessidade industrial e desenvolvimento com o cuidado ambiental.

“Este grupo vai ordenar projetos e ação econômica à luz da nova estratégia”, disse ao Terramérica o especialista Jesús Calvo. Os técnicos consultados pelo Terramérica concordam que se o aumento de resíduos estiver na lógica industrial, as empresas devem prever uma usina para tratá-los e evitar ou minimizar danos na Baía e na atmosfera. Além disso, o canal de entrada para a Baía deve ser ampliado para dar passagem a navios com mais de 228 metros de comprimento sem riscos para a segurança marítima.

Cientistas descartam a possibilidade de essa obra elevar o nível do mar. Entretanto, alertam que na costa sul cubana, mais baixa do que a do norte, as águas poderiam subir cerca de 25 centímetros até 2050 e até um metro até 2100 por efeito da mudança climática. “É preciso adaptar-se e ter em conta esta realidade que terá impacto em nossas comunidades costeiras”, alertou Acosta. Neste aspecto, ao instalar as novas indústrias, levou-se em conta a força dos ventos e o risco de chuvas intensas e furacões formarem sequências de ondas que dentro da baía podem chegar a 2,5 metros de altura. “Embora os furacões sejam pouco frequentes em Cienfuegos, não podem ser deixados de lado”, disse o especialista.

* A autora é correspondente da IPS.

LINKS

Limpeza orgânica de vazamento de petróleo

Risco ou benção?, em espanhol
Petróleo bom mas ainda sem atrativo, em espanhol

O petróleo pode fazer amigos, em espanhol

Risco de escassez põe Cuba na mira, em espanhol

Centro de Estudos Ambientais de Cienfuegos, em espanhol

Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América, em espanhol

Pequiven, Petroquímica da Venezuela, em espanhol

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.