As hortas escolares estão semeando na Guatemala a esperança de que este país saia da severa crise alimentar que sofre.

Cidade da Guatemala, Guatemala, 8 de agosto de 2011 (Terramérica).- “Ontem plantei 20 pés de brócolis em minha casa. Darão seu fruto e vamos comê-los”, disse Juan Francisco Ordóñez, de 12 anos, aluno de uma escola do departamento guatemalteco de Totonicapán, onde uma iniciativa de hortas escolares tenta aplacar a fome. Até o final deste ano, o programa “Aliança para melhorar a situação da infância, a segurança alimentar e a nutrição”, iniciado em 2010, terá organizado 44 hortas escolares em Totonicapán como recurso didático para apoiar o ensino e, também, ajudar a combater a desnutrição crônica deste país da América Central.

“Aprendemos como plantar e quando regar as plantas. Temos rabanete, beterraba, cebola, acelga, erva-moura (Solanum nigrum) e brócolis”, disse Ordóñez, que está na sexta série primária e também fez em sua casa uma horta para ajudar seus pais e seis irmãos. O diretor da escola de San Cristóbal Totonicapán, onde o garoto estuda, Benjamín Tax, disse ao Terramérica que “estamos felizes porque crianças e pais de família vêm pedir sementes para plantar em casa”.

A fome fica evidente nas aulas. “Se reflete na falta de atenção e no baixo rendimento. Quando as crianças veem que está sendo preparada a merenda escolar, proporcionada pelo governo, perdem a atenção”, queixou-se Tax. No começo de julho, a escola, de 211 alunos, fez sua primeira colheita. “Fizemos salada com acelga, também a usamos em sopa de espinafre, mas foi tudo consumido na hora”, explicou.

“A ideia é que na próxima vez possamos consumir metade e o restante vender para conseguirmos dinheiro para comprar mais sementes e que o projeto cresça”, acrescentou o diretor. A horta também ensina matemática, geografia e valores como cooperação, respeito e disciplina. Os cursos de educação pré-escolar “têm figuras geométricas dentro da horta, a sexta série trabalha a regra de três, enquanto aos outros são ensinadas as propriedades nutritivas do rabanete e da cenoura”, explicou o professor.

A palavra “alimentação” frequenta a lista de entidades que promovem hortas pedagógicas: a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Alimentação, a Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional, o Ministério de Saúde Pública e Assistência Social, e o Ministério da Educação. Também participam a Organização Pan-Americana de Saúde e o Programa Mundial de Alimentos, com apoio financeiro do governo espanhol.

A Guatemala, de 14 milhões de habitantes, sofre a maior desnutrição crônica infantil da América Latina, com 49,3% de crianças menores de cinco anos, e uma das mais altas do mundo, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Em Totonicapán, onde começaram as hortas escolares, a situação é mais grave. Mais de 74% das crianças entre três e 59 meses de idade têm desnutrição crônica, e quase 33% sofrem desnutrição severa, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde Materno-Infantil 2008/2009.

A desnutrição crônica se manifesta em baixa estatura para a idade e dificuldades de aprendizagem, enquanto a severa é evidente pela magreza extrema causada pela fome. “O primeiro resultado que esta iniciativa pretende é que as famílias tenham disponibilidade de alimentos para seu consumo”, disse ao Terramérica o funcionário da FAO na Guatemala, Paúl Orozco. Mas, como conseguir isso?

“Os técnicos chegam às escolas e ensinam as crianças sobre produção de hortaliças, segurança alimentar, desnutrição, higiene e outras atividades relacionadas com a produção”, temas também ensinados a pais, mães e professores, explicou Orozco. As instituições que apoiam o programa proporcionam ferramentas para trabalhar a horta, adubo orgânico e depósitos para colher água da chuva. A escolha das hortaliças se baseou em uma análise nutricional.

Trabalhamos com espinafre, acelga, beterraba, brócolis, rabanete e cenoura, e também com espécies nativas como erva-moura, caruru (Amaranthus spp.) e erva-de-Santa-Maria (Chenopodium ambrosioides)”, disse o especialista. Aura Scheel, do Ministério da Educação, disse ao Terramérica que a meta principal é que as hortas “se institucionalizem para melhorar a situação alimentar e nutricional não só dos estudantes, com também das comunidades”.

O Ministério implantou sete mil hortas escolares em todo o país, mas estas ainda não possuem cooperação interinstitucional, como Totonicapán, o que dificulta a obtenção de insumos. O órgão pediu apoio técnico a outras instituições para implementar outras 284 hortas pedagógicas em Totonicapán. “Queremos que se continue cultivando a terra para garantir a disponibilidade de alimentos, mas que as pessoas consumam esses alimentos em casa, que não sejam apenas para venda”.

* O autor é correspondente da IPS.

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Alianças para melhorar a situação da infância, a segurança alimentar e a nutrição, em espanhol

Ministério de Agricultura, Pecuária e Alimentação, em espanhol

Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional, em espanhol

Ministério de Saúde Pública e Assistência Social, em espanhol

Ministério de Educação, em espanhol

Organização Pan-Americana da Saúde, em espanhol e inglês

Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação – Guatemala, em espanhol

Programa Mundial de Alimentos, em espanhol, inglês, francês e italiano

Fundo das Nações Unidas para a Infância – Guatemala, em espanhol

Pesquisa Nacional de Saúde Materno-Infantil 2008/2009, pdf em espanhol

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.