Soja valorizada e expectativa de anistia incentivam desmatamento

Lavoura da soja tem incentivado o desmatamento em diversas áreas do país, aponta pesquisa. Aumento do preço (30% superior à média histórica) e perspectiva de mudança no Código Florestal ajudam a explicar escalada.

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Desmatadores voltaram a usar o "correntão" para a derrubada de florestas nativas.
Com preços 30% superiores a seus patamares históricos, a soja voltou a atrair grandes investimentos no Brasil na safra 2010-2011. O pessimismo que reinou entre os produtores na fase mais aguda da crise financeira internacional ficou para trás. Nesta safra, a área plantada do grão no país cresceu 2,9%, para 24,1 milhões de hectares, e a produção, diante da alta da produtividade, subiu 9,2%, para 75 milhões de toneladas.

As maiores expansões ocorreram no Centro-Oeste, onde a área plantada aumentou 278 mil hectares, puxada pelo Mato Grosso, e no Sul, cuja lavoura cresceu 233 mil hectares, com destaque para o Paraná.

O avanço do grão infla o otimismo dos produtores, mas é motivo de preocupação para outros setores. A lavoura da soja, baseada na grande propriedade monocultora, tem incentivado o desmatamento em áreas do Cerrado e da Amazônia em diversos Municípios brasileiros, onde, até então, a área da cultura já era dada como consolidada. Setores do governo federal que monitoram a derrubada da floresta, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), assim como organizações da sociedade civil, entre eles o Greenpeace, o Instituto Centro de Vida (ICV), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a própria Repórter Brasil, têm alertado para as conexões entre os novos desmatamentos e a soja.

Dados disponibilizados pelo sistema Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), indicaram que, entre março e maio deste ano, o Mato Grosso, maior produtor de soja do país, liderou as estatísticas de derrubada da mata.

Informações semelhantes foram obtidas pelo Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), outro instrumento de monitoramento por satélite da floresta, da ONG Imazon, sediada no Pará. O SAD aponta que, entre agosto de 2010 a junho de 2011, a área desmatada na Amazônia alcançou 6.274 km² – um aumento de 266% sobre o período equivalente anterior –, e os produtores mato-grossenses também lideraram as estatísticas de degradação, com 60% das matas derrubadas naquele intervalo.

Diante do salto do desmatamento, o Ibama e outros órgãos de fiscalização foram obrigados a ampliar as operações no campo, sobretudo no Mato Grosso. Entre janeiro e julho de 2011, os agentes do órgão embargaram no Estado 29.646 hectares por danos ilegais à vegetação nativa. As multas aplicadas somam R$ 192 milhões, com 453 autos de infração lavrados. Ao todo, foram presas 26 pessoas, apreendidos 28 tratores, 63 caminhões, 23 motosserras, 7.810 metros cúbicos de madeira em toras e 977 m² de madeira serrada, 1.640 toneladas de arroz e 752 toneladas de soja.

Em audiência pública no Senado, realizada no final de junho, a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) declarou que dos 824 km² de desmatamento identificados pelo sistema Deter, no período de 1º de agosto de 2010 a 31 de maio de 2011, apenas 112 km² eram autorizados.

De acordo com o diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Luciano Evaristo, 12 das 13 frentes de desmatamento fiscalizadas pelo órgão no Mato Grosso, no 1º semestre de 2011, seriam destinadas à produção de grãos, e apenas uma à pecuária. Municípios tradicionalmente sojeiros, como Nova Ubiratã (MT), Cláudia (MT), Feliz Natal (MT) e Peixoto Azevedo (MT) entraram nas listas de campeões de desmatamento, surpreendendo a fiscalização. Antes, o problema estava concentrado mais ao norte do Estado, onde a atividade madeireira abria espaço para a formação de pastagens para fazendas de gado.

Evaristo confirmou que as novas frentes de desmatamento foram incentivadas pela expectativa de anistia aos desmatadores criada pela aprovação do novo Código Florestal na Câmara dos Deputados, ainda que a matéria tenha que ser discutida e aprovada no Senado antes de ir para sanção. “Assistimos a um movimento em massa para burlar a legislação. Muitos produtores acreditaram na inoperância do órgão federal e na anistia que seria supostamente promovida pelas alterações no Código Florestal”, disse ele. A Repórter Brasil apurou que associações de produtores rurais mato-grossenses chegaram a incentivar associados a praticarem o desmatamento, sob alegação de que as mudanças legislativas livrariam os desmatadores de punições.

Neste novo relatório sobre a soja e seus impactos socioambientais, a Repórter Brasil analisa o novo Código Florestal, as conexões entre os novos desmatamentos e os produtores de soja, e o risco que as alterações nas “regras do jogo” trarão para uma série de pactos de sustentabilidade já firmados entre organizações da sociedade civil e a indústria do setor.

Para ler o relatório na íntegra clique aqui.

Este é o 15º relatório lançado pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) da ONG Repórter Brasil. Para ler os outros relatórios, acesse www.agrocombustiveis.org.br.

* Publicado originalmente pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) e retirado do site Repórter Brasil.