Crise, comida, ferro e petróleo

Uma baixa na atividade econômica mundial tende a conter ou a reduzir preços de comida, metais, minérios e petróleo. Desde o início do ano, o Banco Central (BC) acreditava que as projeções mais comuns para o crescimento do mundo rico eram então risonhas demais. A economia mundial enfim rateou, embora até mais que o previsto. Esse prognóstico foi um dos motivos que levaram o BC a não forçar muito a mão na alta da taxa “básica” de juros, a Selic.

Mas os preços das commodities vão cair quanto, se vão?

“Excetuada a situação de desaceleração mais intensa nos mercados, os impactos da presente oscilação do preço das commodities sobre a inflação e as contas externas tendem a ser limitados no curto prazo”, escrevem em relatório economistas do Itaú (Giovanna Siniscalchi, Laura Haralyi e Darwin Dib).

Os economistas começam por notar o descasamento entre a variação de um índice de preço de commodities (CMDI, da Bloomberg) e a de um importante índice de ações da Bolsa americana (o S&P 500).

Segundo os economistas, a variação do S&P 500 costuma ser um indicador relevante de expectativas de crescimento e de aversão a risco.

Na crise de 2008, o CMDI e o S&P 500 andavam quase colados. De 22 de julho a 15 de agosto, o CMDI caiu 3,2%. O S&P 500, muito mais, 13%.

Explicações possíveis: 1) a oferta de produtos como petróleo, cobre, soja, milho sofreu choques adversos (clima, política, greves), e a demanda está alta ainda; 2) ainda há dinheiro barato bastante no mundo para sustentar investimento em commodities (o pessoal do Itaú não empregou o termo “especular”).

No Brasil, os preços agropecuários subiram nos últimos 30 dias (boi, porco, aves, açúcar). Isso vai aparecer nos preços de varejo (IPCA) a partir de setembro, acredita o pessoal do Itaú. A queda forte do algodão vai demorar a aparecer no preço de tecidos e de roupas.

A partir do início do ano que vem, com o declínio da atividade econômica confirmado e com o fim dos choques de oferta, pode haver declínio moderado dos preços (ou estagnação, se a China e “emergentes” continuarem firmes).

A Economist Intelligence Unit (EIU) acredita em declínio algo mais acentuado de preços (a EIU é a unidade de pesquisa econômica do grupo que edita a The Economist).

Os preços serão menores no segundo semestre de 2011 e cairão mais em 2012, “devido ao consumo fraco, o que provavelmente deve ser acompanhado por uma redução do apetite do investidor por risco” (isto é, menos especulação – o relatório da EIU usa o termo “especular”).

No que nos interessa mais, a EIU estima baixas fortes para café, algodão, trigo e aço (em 2012). Modestas para petróleo, soja, milho, arroz e açúcar. O minério de ferro, estrela das exportações brasileiras, ficaria mais ou menos estável.

Na média, vai haver um “alívio. Porém, (os preços) permanecerão em níveis historicamente altos, em parte porque os estoques ainda estão baixos, em parte devido ao crescimento da população urbana no mundo em desenvolvimento (e menos terra agricultável) e ao impacto dos biocombustíveis”, diz a EIU.

A julgar pela perspectiva dos economistas do Itaú e da EIU, parece que seria preciso uma crise mais braba a fim de que os preços tombem a ponto de bater na inflação.

* Vinícius Torres Freire é jornalista.

** Publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo e retirado do site IHU On-Line.