Por Dal Marcondes, parceria com a Synergia Socioambiental* –
O Brasil deve se preparar para um dos momentos mais importantes de sua tradição em conferências ambientais. A COP30 deve rivalizar com a Rio92, quando foi criada a Carta da Terra, e a Rio+20, que deu origem aos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Para falar sobre isso e outros temas, convidamos Ricardo Young, uma das poucas lideranças brasileiras que caminha com desenvoltura em uma multiplicidade de ambientes. Empresário bem-sucedido, tem formação em gestão pública pela FGV, participou da fundação de organizações empresariais importantes, como o Instituto Ethos, foi candidato ao Senado e vereador na cidade de São Paulo, atuou de forma decisiva para a criação do Fórum Amazônia Sustentável e, atualmente, é presidente do IDS – Instituto Democracia e Sustentabilidade. Também é um estudioso, com atuação no Instituto de Estudos Avançados da USP. Sua presença marcante é comum, tanto em reuniões de organizações da sociedade civil, como em fóruns empresariais, e sua fala pausada carrega a experiência de uma vida dedicada à sustentabilidade.
A COP 28 foi uma das poucas vezes em que Ricardo não viajou para participar de uma conferência climática. No entanto, acompanhou à distância, atento ao desenrolar dos compromissos e acordos, na expectativa de antecipar os desafios que as sociedades brasileira e global terão de enfrentar na COP de Belém, em 2025, quando os países deverão fazer um balanço das metas assumidas em Paris, em 2015, e apresentar as novas metas que passarão a vigorar a partir de 2025.
Essa conversa com o jornalista Dal Marcondes é uma análise do atual momento na COP e o lançamento do olhar para o amanhã.
Ricardo, o que você acha da COP28 ter acontecido em um país petroleiro, em uma conjuntura em que os combustíveis fósseis estão na berlinda climática?
RY: A COP em Dubai evidenciou um processo de soft power dos países produtores de petróleo, em um momento em que a questão da redução, e até da proibição dos combustíveis fósseis, passou a ser central. E essa agenda de restrições vai se acelerar bastante. A atuação desses países é uma tentativa de colocar na mesa que o petróleo não é o único vilão do clima, e de ganhar tempo.
A tese é que o petróleo e seus derivados ainda serão necessários em uma transição muito mais prolongada do que o desejado pelo mundo. Então, agora estamos começando a enfrentar, de verdade, o que vem a ser o lobby do petróleo e seu trabalho para retardar a transição energética.
Mas não dá para criminalizar o petróleo, que praticamente nos trouxe da Idade Média para o mundo digital.
RY: Isso é verdade, temos que mudar a forma de produzir energia, mas o petróleo não é apenas combustível. A petroquímica oferece uma enorme variedade de produtos básicos para as sociedades modernas, do plástico aos pigmentos, óleos, tintas, medicamentos, computadores e muito mais. São muito poucas as coisas e objetos da vida moderna que não carregam algum derivado de petróleo em sua composição.
Então, os produtores de petróleo precisam encaminhar seus modelos de negócios em outra direção?
RY: Sim, caminhar para outras atividades também essenciais, muito menos poluentes, mas igualmente necessárias para a sociedade. A questão é abandonar o uso do petróleo como combustível e ajudar a transformar, nesse novo mundo, os enormes ativos empatados em refino e produção de combustível em outro tipo de negócio, também lucrativo e sustentável.
Quais caminhos podem ser tomados pelo Brasil, que nos últimos 50 anos tornou-se um grande produtor de petróleo?
RY: Não dá para assumir uma liderança climática se a gente não tiver muita clareza em relação a esse tema do petróleo. Claro que você não vai parar de explorar da noite para o dia, mas pode, em um primeiro momento, congelar sua produção e produzir de forma decrescente, na medida em que for acelerando as energias alternativas e limpas. No entanto, é preciso que se estabeleça, de forma simultânea, uma política industrial que contemple as novas demandas do mundo, e que possa substituir o petróleo na balança financeira nacional e global.
E o que significa o Brasil como participante da OPEP?
RY: O petróleo se tornou um dos produtos importantes da pauta de exportações do Brasil. Abrir mão disso significa fazer uma transição produtiva e industrial que aos poucos possa compensar a importância que o petróleo assumiu na balança de pagamentos. Se a transição ecológica proposta pelo ministro Haddad tiver essa lucidez e começar a identificar áreas em que o país pode ser competitivo com alto valor agregado, como o hidrogênio verde, componentes industriais de usinas eólicas, painéis solares e carros elétricos, a gente consegue gradativamente mudar a pauta de exportações.
Em 2025 o Brasil vai sediar uma COP na Amazônia. Quais serão os desafios que devem ser enfrentados?
RY: Acredito que a COP30 tem um objetivo político importante. Não avançamos mais rapidamente na agenda climática porque temos um Congresso muito reacionário em diversas frentes, em especial na questão ambiental. O Brasil vai ter que se posicionar internacionalmente, e expor a força relativa que a bancada ruralista tem no Congresso. Será preciso ter coragem para assumir compromissos que podem evidenciar os conflitos internos entre uma agenda progressista e uma oposição conservadora. O país precisa se posicionar estrategicamente.
Na Rio92, o ex-presidente Fernando Collor estava sendo deposto. No entanto, houve uma união e conseguimos construir consensos importantes. O Brasil tem essa capacidade, de se unir em momentos cruciais e construir soluções corajosas. Fizemos isso muitas vezes em nossa história. Há muitos e bons desafios até chegarmos à COP de Belém, e um ainda maior é de sairmos dela como um país mais comprometido com o futuro e preparado para assumir um papel de maior protagonismo na luta global contra a emergência climática.