Quase sem educação formal, a feirante Kuniko Kohakura Yonaha, de 59 anos, nascida em Osaka, no Japão, tornou-se uma celebridade paulistana, conhecida apenas como “dona Maria”.
Há uma possibilidade de que, no próximo ano, ela se converta numa celebridade do mundo empresarial, a ser estudada nas principais escolas de negócios brasileiras.
Neste ano, o seu pastel foi eleito, pela segunda vez, o melhor pastel de feira da cidade de São Paulo, o que, na cultura paulistana, é uma condecoração e tanto. Sua premiada receita combina sutis raspas de limão com o picadinho. Diante do sucesso, “dona Maria” planeja construir uma central de produção para alimentar, até o final de 2012, pelo menos 200 lojas franqueadas.
Até que ponto é possível disseminar experiências como a de “dona Maria”, com seu milagre da multiplicação dos pastéis?
Esta é uma das principais perguntas levantadas pela elite norte-americana, a começar do presidente Barack Obama, preocupada em enfrentar o desemprego.
Lançou-se aqui, neste ano, com estardalhaço um programa, batizado de “Start up America”, para estimular as pessoas a inovar e a abrir seu próprio negócio. É um programa que, entre várias propostas, como apressar as patentes e criar um sistema de tutoria para talentos, facilita a entrada no país de estrangeiros com espírito empreendedor, no estilo da “dona Maria”.
Devido a essa procura de soluções para o desemprego, ganhou os holofotes um personagem que parece saído diretamente de um roteiro cinematográfico: um empresário que, depois de ser assaltado por dois jovens em Nova York, decidiu dar aulas de matemática numa escola violenta, temida pelos professores.
Com um MBA em uma das melhores universidades do país, passagem por grandes corporações e ganhando dinheiro numa empresa de exportação, Steve Mariotti deparou-se logo com o desânimo dos estudantes. Boa parte deles parava de estudar porque não via sentido no que era ensinado em sala de aula. “Vi a esperteza dos garotos na rua, lidando com os mais diversos desafios. E se usassem a mesma esperteza para ganhar dinheiro honestamente, abrindo seus próprios negócios?”, pergunta Steve Mariotti.
Dessa pergunta, nascida num bairro violento de Nova York (South Bronx), surgiu uma ideia capaz de inovar o mundo –e que serve perfeitamente para o Brasil.
Sem conhecer quase nada de teorias pedagógicas, Steve criou uma espécie de MBA para ensinar os jovens a abrir o próprio negócio, aproximando-os de linhas de financiamento.
“Ficou mais fácil transmitir coisas que eles detestavam, como matemática.” Também ficou mais fácil estimular a prática da leitura e da escrita, tudo focado no empreendedorismo. O ex-empresário transformou-se em case estudado nas escolas de educação norte-americanas. Os alunos melhoraram o desempenho em sala de aula. Tendiam a cursar faculdades e a abrir negócios.
A experiência está sendo reproduzida até fora dos Estados Unidos, por meio de uma fundação criada para ensinar empreendedorismo em comunidades pobres, sobretudo nas escolas públicas. Montou-se uma rede de experientes executivos para serem tutores de cada projeto, agora com a facilidade das redes sociais.
O que eles estão conseguindo é fazer para os pobres o que já existe com abundância entre os mais ricos. Uma das imagens mais interessantes do mundo acadêmico norte-americano é a fila de olheiros nos seminários de estudantes para descobrir projetos onde possam colocar dinheiro. E essa combinação gera as mais diversas empresas inovadoras.
Estão conseguindo até inventar redes sociais para facilitar esse processo: jovens postam seus projetos e intermediários saem à procura de patrocinadores.
Empreendedor é, em síntese, quem transforma o problema numa solução e sabe multiplicar “pastéis”. O maior desperdício de uma nação é o desperdício de talentos –e essa pode ser uma medida para comemorar ou não a independência de uma nação.
PS – Está para ser anunciado um programa interessante na cidade de São Paulo. Em parceria com a prefeitura, estudantes das empresas juniores das melhores faculdades vão montar uma incubadora para ajudar gratuitamente pessoas de comunidades mais pobres a abrir seu negócio. Bom para os dois lados.
* Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo, comentarista da rádio CBN, e fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz.
** Publicado originalmente no Portal Aprendiz.