No futuro, vamos falar em bits... Será?

Já faz muito tempo que venho esperando o momento em que o mundo falará um só idioma.

Durante anos, aqui no Brasil, profissionais dos mais variados segmentos vêm se esforçando para aprender inglês, espanhol ou mandarim, línguas predominantes no ambiente integrado dos negócios. Por outro lado, estudantes de todos os cantos caminham no mesmo sentido, a partir da oferta de escolas de idiomas ou do próprio currículo da educação regular.

No solo tupiniquim, como de resto em várias outras partes do planeta, empresários do segmento educacional e seus executivos-gestores têm investido na crescente oferta de produtos que vão do simples curso de línguas até pomposos programas de intercâmbio cultural. As razões são, no mínimo, justificáveis, uma vez que a necessidade de comunicação num mundo sem fronteiras é uma realidade.

Mas, o que parecia ser uma tendência irrefutável do processo de integração internacional, a chamada globalização da língua, entretanto, parece ter tomado um outro rumo, recentemente. Entrando pela contramão desta lógica, empresas de tecnologia preconizam justamente o inverso: a tendência futura é de que os povos valorizem, cada vez mais, suas raízes, seus costumes e sua língua pátria, reforçando suas tradições e transmitindo-as às gerações futuras na sua forma original.

Como assim? Onde fica a integração planetária e a necessidade dos povos de se comunicar uns com os outros?

A resposta: ela fica por conta da tecnologia. Cientistas do mundo todo trabalham no aprimoramento de sistemas inteligentes que permitirão, ao mais comum dos cidadãos de qualquer país, comunicar-se com outro em qualquer lugar do planeta, sem ao menos conhecer um mínimo que seja o idioma utilizado do outro lado da fronteira.

Tradutores simultâneos, dotados de sistemas inteligentes, farão todo o trabalho em tempo real. E isso não se restringe apenas à linguagem escrita, mas também por meio de comando de voz. Google, Yahoo, Microsoft e tantas outras empresas de tecnologia vêm fazendo uma corrida silenciosa para tornar esse sonho possível.

Na linguagem escrita, ainda que esta realidade não esteja madura e acabada, ela já está presente na internet. Mas a ideia dos pesquisadores é ir além, com softwares inteligentes adaptados para uso em computadores e celulares.

Pensando agora como um gestor educacional, você consegue enxergar o alcance dessa inovação e o que isto tem a ver com as nossas escolas atuais?

Pense no produto oferecido hoje e o que será dele quando esta tecnologia estiver disponível. O que será das aulas de idiomas? Dos programas de intercâmbio cultural? Dos cursos de línguas?

É evidente que haverá mudanças profundas, muito embora não possamos afirmar que esses “produtos” estejam fadados ao extermínio. O aprendizado da língua estrangeira será um fator importante na compreensão de fatos históricos, na leitura de obras-primas da literatura universal e no entendimento dos costumes de outros povos.

No caso dos programas de intercâmbio cultural, a conotação que ganhará força se voltará para a possibilidade de interação com outros povos, vivendo e convivendo com costumes, folclore e valores diversos, sem a barreira da língua, facilitando, nesse caso, o convívio e a aproximação entre as pessoas.

No campo dos negócios, caberá aos gestores e empreendedores educacionais reposicionar seus produtos, criando novas perspectivas de trocas de experiência internacional para os estudantes, formando parcerias com instituições educacionais além de suas fronteiras e, com isso, aumentando a oferta de valor agregado.

Já as grandes redes educacionais terão a oportunidade de aproveitar conteúdos mais avançados, disponíveis em outros países, assim como a possibilidade de ampliação das pesquisas interativas e das alianças estratégicas com centros de educação mundo afora. Bibliotecas de todas as partes do planeta passarão a fazer parte do universo de pesquisa das escolas locais.

Na esfera de materiais em multimídia, audiobooks, vídeos e outros complementos poderão ser utilizados na sua versão original.

O ganho mais importante, entretanto, acontecerá no viés social, pela possibilidade de inclusão gerada a partir dessa tecnologia. Imagine milhões de pessoas sem acesso à educação formal, podendo conversar livremente com cidadãos de qualquer parte do planeta. Um universo de possibilidades se abrirá nesse momento, favorecendo as classes menos abastadas e incluindo na economia formal agentes até agora marginalizados.

Será sem dúvida uma grande confraternização global. Para os empreendedores educacionais, a oportunidade ímpar de ruptura de velhos paradigmas. Para executivos e gestores do segmento, uma oportunidade de trocar informações com profissionais do mundo inteiro, sem o obstáculo da língua.

Aos professores, além da perspectiva positiva de formação continuada e participação em grupos de estudos espalhados pelo mundo inteiro, resta um alerta: a concorrência não mais se restringirá aos docentes da escola da esquina, mas aos profissionais dos quatro cantos do planeta. A consequência é a queda no poder de barganha do principal fornecedor das escolas, e um impulso à melhoria da qualidade dos professores…

É evidente que estas são apenas algumas pontas visíveis do iceberg… Já pensou no que está por debaixo da superfície?

* Marcelo Freitas é consultor nos segmentos de educação e do terceiro setor, com ênfase em programas de revitalização institucional, gestão estratégica, recursos humanos e marketing social. Diretor da Corporate Gestão Empresarial e coordenador do Movimento Escola Responsável, é palestrante, articulista e autor de livros de empreendedorismo para o ensino médio.

** Publicado originalmente na revista Gestão Educacional e retirado do site da revista Profissão Mestre.