Um dia após o intenso tiroteio entre soldados da 9ª Brigada de Infantaria do Exército e traficantes no Complexo do Alemão, ocorrido na noite da terça-feira 6, o general Adriano Pereira Júnior, do Comando Militar do Leste, acusou os criminosos de insuflar moradores da comunidade contra os militares (veja o vídeo da troca de tiros aqui).
Os tumultos começaram após o anúncio da permanência do Exército no complexo de 13 favelas, na zona norte do Rio, até junho de 2012. “Houve ordem para que soldados do tráfico tentassem se comportar de forma a causar tumulto e desconforto à tropa”, disse o general, em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira.
Era de se esperar que o crime organizado, com as finanças abaladas pela ocupação militar, tentaria retomar o controle territorial do Complexo do Alemão, como escreveu o jurista Wálter Fanganiello Maierovitch, colunista de CartaCapital, em artigo publicado no site Terra Magazine (clique aqui para ler). Mas as manifestações de moradores engrossaram em face dos abusos cometidos pelos policiais e militares envolvidos na ocupação, a impor revistas vexatórias aos transeuntes, fazer abordagens agressivas a suspeitos e regulamentar até que tipo de música pode-se ouvir ou o horário limite das festas.
“A maneira de abordagem está horrível. Nós somos moradores da comunidade e eles precisam nos abordar com respeito, com bom dia, boa tarde e boa noite. Não é chegar e ‘esculachar’ [destratar]”, disse Ivo Rosa, que trabalha com transportes e mora na região à Agência Brasil. O comerciante Nivaldo Bento, conhecido como Baiano, há 25 anos dono de um bar na Favela da Grota também reclamou da atitude dos militares. “Será que eles não gravam a nossa fisionomia. Ficam abordando a toda hora. Aí os moradores ficam revoltados com isso, pois todo mundo vira suspeito”.
Mesmo em favelas ocupadas por UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) há anos, são numerosas as queixas de moradores contra a rotina militarizada e os abusos cometidos pelos agentes públicos. “Vivemos numa ditadura branca. Tudo é proibido e depende do aval da polícia”, avalia o rapper Mc Fiell, do morro Dona Marta, a primeira favela “pacificada”, em 2008.
Apesar de as pesquisas demonstrarem ampla aprovação das UPPs, tanto nas favelas já ocupadas como nas demais, os conflitos têm se multiplicado na mesma proporção que o descontentamento dos moradores, sobretudo entre os mais jovens, alvos preferenciais das abordagens policiais. No fim de julho, CartaCapital publicou uma extensa reportagem sobre o tema, intitulada “Paz ou medo” (edição 655). A íntegra do texto pode ser lida aqui.
Com informações da Agência Brasil.
* Rodrigo Martins é repórter da revista CartaCapital há cinco anos. Trabalhou como editor assistente do portal UOL e já escreveu para as revistas Foco Economia e Negócios, Sustenta!, Ensino Superior e Revista da Cultura, entre outras publicações. Em 2008 foi um dos vencedores do Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos. Acompanhe também pelo www.twitter.com/rodrigomartins0.
** Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.