Levando em conta a situação que os bancos norte-americanos e europeus têm passado, destacam-se os nomes de quatro bancos que poderão estar à beira da falência ou de ser salvos novamente pelos governos nacionais, já que são “demasiado grandes para falir”. Os seus nomes são: Bank of America, Crédit Agricole, Commerszbank e Societé Générale. Trecho do artigo “Estamos perante a segunda crise bancária?”.
A má situação do Bank of America
O Bank of America – o banco mais importante dos Estados Unidos em ativos e empréstimos – está passando por graves problemas financeiros, em tal grau que pode ser comprado pelo JP Morgan, conforme anunciou em 23 de agosto de 2011 o Wall Street Journal (WSJ) no seu blog 24/7 Wall St.(1), com base em rumores que estão ganhando força dentro da praça financeira norte-americana. A transação de compra seria feita com a ajuda do governo norte-americano o qual desembolsaria cerca de US$ 100 bilhões.
O blog do WSJ refere que o Business Insider calcula que o Bank of America necessitará entre US$ 100 bilhões e US$ 200 bilhões para reforçar as suas contas(2). Isto significa uma falência técnica do Bank of America, mas como se viu na primeira crise bancária de 2008-2009, os grandes bancos não vão à falência, fundem-se porque são demasiado importantes para falir.
Notemos que o Bank of America no seu informe do segundo trimestre publicou as maiores perdas da sua história num montante de US$ 9,127 bilhões. Estas perdas estão associadas, em grande medida, com hipotecas de segunda geração(3). Trata-se de hipotecas que foram boas, mas que se deterioraram pelo elevado desemprego e pelas más remunerações norte-americanas, em especial a partir de 2008.
No início do ano, o preço das ações do Bank of America era de US$ 14,19 e em 22 de setembro (no fechamento da bolsa) – um dia depois da declaração de Bernanke sobre a gestão da política monetária dos Estados Unidos(4) –, o preço das ações foi de US$ 6,06, o que significa uma queda de 57,3% em cerca de nove meses, sem deixar de mencionar que, no dia 8 de agosto, houve uma forte queda, de 20,32%, causada pela baixa do rating da dívida dos Estados Unidos.
O preço de US$ 6,06 por ação significa que os investidores não acreditam no preço das ações dos livros de contabilidade do Bank of America (US$ 21,45), dado publicado no segundo informe do balancete financeiro deste banco. Isto é, os investidores creem que o verdadeiro preço das ações do Bank of America vale menos de um terço do que os livros de contabilidade deste banco dizem.
Jonathan Weil, colunista da Bloomberg, disse que o mercado percebe que “mais da metade do valor da empresa que está nos livros é falso, por que os ativos estão sobrevalorizados ou os passivos subestimados, ou por uma combinação dos dois”(5).
A má situação financeira do Bank of America levou-o a tomar a decisão de começar a vender ativos que, segundo o banco, lhe são complementares. Entre estas decisões, está a venda de uma carteira de investimentos imobiliários por um valor de US$ bilhão, assim como outra de hipotecas vendida por US$ 500 milhões à empresa estatal de hipotecas Fannie Mae. Também vendeu o TD Bank Group, um negócio de cartões de crédito avaliado em US$ 8,6 bilhões(6). Os dois últimos anúncios foram em 30 de agosto, quando vendeu as ações que possuía do Banco de Construção da China, por um valor de US$ 8,3 bilhões(7), e o segundo é a muito possível venda da sua participação na Pizza Hut, por um montante de US$ 800 milhões(8).
Warren Buffet no resgate
No dia 25 de agosto, e tendo como ambiente uma maior desconfiança dos investidores na solidez financeira deste banco, Buffet, um dos mais poderosos investidores do mundo, participou no resgate do Bank of America comprando ações preferenciais (que não se vendem a qualquer um) num valor de US$ 5 bilhões(9), o que representa aproximadamente 6,5% do capital social do banco(10). Isto levou a que as ações aumentassem 20% de 25 a 29 de agosto, mas este momento de subida mudou em 30 de agosto, registando-se uma queda de 13,6% em relação ao preço de fechamento de 2 de setembro. O saldo geral do impacto da injeção de capital por parte de Buffet em 2 de setembro foi um aumento de 3,8% do preço das ações.
Este fato mostra-nos que o maior banco dos Estados Unidos está passando por grandes problemas financeiros, muito ligados à sua carteira de investimentos imobiliários. Recordemos que há dois processos relacionados com este tema, um da parte da AIG e o montante pedido é de US$ 10 bilhões(11) e o outro por parte da Agência Federal de Financiamento à Habitação (FHFA, segundo as suas siglas em inglês) num montante de US$ 24,8 bilhões(12).
O peso do Bank of America
O valor dos ativos do Bank of America no primeiro trimestre de 2011 foi de US$ 2,3 trilhões enquanto em derivados foi de US$ 72,7 trilhões. Uma gestão de valores em derivados equivalente a 32 vezes o montante dos seus ativos(13). Este banco representa aproximadamente 22,6% do mercado de derivados e 17% do total dos ativos bancários dos Estados Unidos.
Se compararmos o valor dos ativos do banco em 2010 com o Produto Interno Bruto da zona do euro, teríamos que os ativos do Bank of America, em 2010, representam 88% do PIB da França e 68% do PIB da Alemanha. O valor destes ativos é de 7,4 vezes o PIB da Grécia, 9,9 o PIB de Portugal, 1,1 o da Itália e 1,6 vezes em relação ao da Espanha.
Os problemas do Goldman Sachs e da UBS
Em 15 de setembro de 2008, foi dada a notícia da falência do Lehman Brother’s; novamente em 15 de setembro, mas deste ano, surgiam duas notícias muito importantes no âmbito financeiro. A primeira do encerramento do que foi o mais importante hedge fund do Goldman Sachs e a segunda das perdas declaradas pelo banco suíco UBS, as quais ascendem ao montante de US$ 2 bilhões.
O Goldman Sachs anunciou o encerramento, entenda-se como uma falência, do seu hedge fund Alpha Global(14), que fora catalogado como a joia da coroa daquele banco(15). Este fundo tinha perdido, durante este ano, 12% do seu valor(16), o que representava uma segunda queda em quatro, uma vez que em setembro de 2008 teve uma queda de 22%(17), sendo um dos acontecimentos que iniciou o caminho para a Grande Recessão(18).
A esta notícia somou-se a de que um operador estabelecido em Londres e pertencente ao banco UBS tinha incorrido numa fraude que provocara perdas ao banco no montante de US$ 2 bilhões(19), algo que relembra a fraude no banco francês Societé Générale em janeiro de 2008, num montante de US$ 5 bilhões(20).
A fraude de US$ 2 bilhões, segundo a versão do banco UBS, levanta dúvidas sobre como o operador pôde ultrapassar os controles internos num montante de tal tamanho. Se este montante, em vez de ser perdas fossem lucros, então, como menciona o editor principal da CNBC, John Carney, o operador não estaria sendo chamado de desonesto e teria ascendido a vice-presidente ou diretor-geral de algum departamento do banco suíço(21). Tudo isto levanta a interrogação: quantas destas fraudes haverá no sistema bancário mundial? Recordemos Barinas, falecido em 1994 numa operação análoga, em que os controles internos não funcionaram(22).
Os problemas do Commerzbank
A situação de deterioração do Bank of America não é estranha para o banco alemão Commerzbank – o segundo mais importante da Alemanha –, que está passando por graves problemas financeiros, mas, diferentemente do banco norte-americano, o Commerzbank tem problemas pela sua elevada exposição em valores emitidos pelos países europeus altamente endividados.
No início do ano, o preço das ações do Commerzbank era de 5,636 euros e em 22 de setembro (no fechamento) o preço das ações foi de US$ 1,56, o que significa uma queda de 72,3% durante este ano. É importante mencionar que em 10 de agosto este banco anunciou que os seus lucros do segundo trimestre, comparados com os do primeiro, tinham caído 93% devido aos problemas que tem a sua carteira de investimentos relacionados com a dívida soberana da Grécia(23).
A alquimia dos bancos alemães
Um dos problemas, que a desregulação financeira e a contabilidade criativa trouxeram, foi o de esconder os problemas financeiros de qualquer empresa. Temos exemplos clássicos disso no Long-Term Capital Management e no Enron, que faliram em 1998 e 2001, respectivamente.
Yalman Onaran escreveu um importante artigo na Bloomberg intitulado “Global bank capital regime at risk as regulator spar over rules”(24), onde fala sobre os problemas existentes nos bancos europeus e norte-americanos, para que eles cumpram as normas escritas em Basileia III. Destaca-se o caso dos bancos alemães onde existe um elevado uso dos valores híbridos (também conhecidos como silent participations), os quais se contabilizam como dívida e capital ao mesmo tempo, mas que estruturalmente são passivos. Estes valores híbridos em certas ocasiões chegam a representar 50% do capital das entidades financeiras dentro da Alemanha; temos um caso concreto no banco Landesbank Hessen-Thuering, que foi retirado em 2010 dos testes de estresse por ter um elevado montante de capitais híbridos.
No caso do Commeszbank, estes valores estão contabilizados como ativos(25). É importante mencionar que, durante a crise bancária de 2008, este banco vendeu ao governo alemão 2,75 bilhões de euros em valores híbridos que foram convertidos em ações(26). Isto é, os alquimistas do governo alemão, a partir da contabilidade criativa e da engenharia financeira (parecidos neste caso com a pedra filosofal), fizeram uma transmutação de um valor, que pela sua estrutura representa um passivo, numa ação financeira, convertendo empréstimos em entradas de capital.
A França e a seus bancos com problemas
Depois da baixa de qualificação dos Estados Unidos por parte da Standard and Poor’s, a pergunta é: qual país é o próximo? Os rumores começaram a surgir e indicam que o seguinte seria a França. No dia 10 de agosto de 2011, as ações francesas foram afetadas pelo rumor de uma possível baixa do triplo AAA(27) na notação financeira da dívida do governo francês por parte da Moody’s, mas isto não aconteceu e, nesse mesmo dia, tanto a Moody’s como a Standard and Poor’s ratificaram o nível de qualificação(28).
Estes rumores levaram a que, no dia 24 de agosto, o governo francês tenha anunciado um plano para reduzir o seu déficit fiscal. O plano consiste num aumento das receitas em 10 bilhões de euros por meio de aumentos de impostos, assim como cortes nas isenções e incentivos fiscais que estavam sendo utilizados para estimular o crescimento econômico(29). A França finalizou o ano de 2010 com um déficit fiscal no valor de 7% do PIB(30), enquanto a sua dívida atual é de 86,7% e a privada externa de 208%(31).
Ao problema da notação da dívida pública francesa há que se somar a má situação de seus bancos privados. Em 14 de setembro, a Moody’s anunciou a baixa da notação dos bancos Societé Générale e Crédit Agricole e pôs em revisão a notação do BNP Paribas; estes são os três mais importantes bancos do país. A causa do rebaixamento da notação financeira deve-se à deterioração financeira provocada pelas dívidas soberanas que mantêm nos seus balancetes, principalmente à dívida grega(32). Entre 3 de janeiro e 22 de setembro deste ano, o preço das ações do BNP Paribas caiu 53,2%, do Société Générale 63,4%, e do Crédit Agricole 57%.
As demissões no setor bancário
Em 12 de setembro, Brian Moynihan, diretor-geral do Bank of America anunciou o corte de 30 mil postos de trabalho em nível internacional(33), com base no seu plano de reestruturação chamado “New BAC”, apresentado em abril deste ano, para tentar aumentar a rentabilidade e o capital deste banco(34). Enquanto os bancos europeus anunciaram 67 mil demissões entre janeiro e agosto deste ano, dos quais 50 mil foram em bancos do Reino Unido(35). Então temos que, durante este ano (janeiro a setembro), os bancos europeus e norte-americanos cortaram 97 mil empregos.
Estes números fazem-nos recordar duas situações já vividas. A primeira foi a demissão de 116 mil trabalhadores do setor bancário durante a crise financeira de 2001. A segunda tem a ver com a demissão de 130 mil pessoas entre janeiro e outubro de 2008. Recordemos que naquele ano, mas no dia 15 de setembro, o banco de investimentos Lehman Brother’s declarou-se em falência, fato que detonou uma crise bancária e a sua consequente recessão econômica.
Considerações finais: os bancos candidatos à falência, à fusão ou a serem novamente salvos
Tendo em conta a situação que os bancos norte-americanos e europeus têm passado, destacam-se os nomes de quatro bancos que poderão estar à beira da falência ou de ser salvos novamente pelos governos nacionais, já que são “demasiado grandes para falir”. Os seus nomes são: Bank of America, Crédit Agricole, Commerszbank e Societé Générale. Os últimos dois bancos apresentaram uma importante queda do preço das suas ações, nos nove meses deste ano, 72,3% e 63,4%, respectivamente.
Quando os preços das ações têm quedas de dois dígitos, começam a soar os alarmes nos investidores e ainda mais quando se apresenta a situação de uma tendência de forte baixa.
Recordemos que a agência de rating Moody’s anunciou, em 21 de setembro, o corte da notação da dívida de curto prazo de três dos mais importantes bancos dos Estados Unidos: Bank of America, Citigroup e Wells Fargo(36).
A forte queda dos preços das ações do setor bancário nos Estados Unidos e na Europa é muito parecida com a crise bancária desencadeada pela falência do Lehman Brother’s em setembro de 2008.
Três anos depois desta data, encontramo-nos novamente em vésperas de uma nova crise bancária e, portanto, financeira em nível internacional, assim o assinala a empresa Pimco, que é a maior em nível internacional na comercialização de títulos(37).
NOTAS
(1) Disponível em http://247wallst.com/2011/08/23/jp-morganmay-take-over-bank-of-america/.
(2) Disponível em http://www.businessinsider.com/bank-ofamericas-stock-collapse-2011-8?op=1.
(3) Bank of America, Supplement Information, Second Quarter 2011, disponível em http://phx.corporateir.net/External.File?item=UGFyZW50SUQ9MTAwNDAzfENoaWxkSUQ9LTF8VHlwZT0z&t=1.
(4) Ver http://www.federalreserve.gov/newsevents/press/monetary/.
(5) Disponível em http://www.bloomberg.com/news/2011-07-21/curse-the-geniuses-who-built-bank-of-america-jonathanweil-1-.html.
(6) Disponível em http://www.businessinsider.com/bank-ofamericas-fire-sale-2011-8.
(70 Ver http://www.reuters.com/article/2011/08/30/usbankofamerica-ccb-idUSTRE77S2MO20110830.
(9) Ver http://www.marketwatch.com/story/buffetts-bofainvestment-is-the-new-tarp-2011-08-25?dist=countdown.
(13) “Office of the comptroller of the currency, OCC´s Quarterly report on bank trading and derivatives activities first quarter 2011”. Disponível em http://www.occ.treas.gov/topics/capitalmarkets/financial-markets/trading/derivatives/dq111.pdf.
(14) Esse hedge fund atuava no comércio quantitativo, utilizando modelos computacionais altamente sofisticados para aproveitar rapidamente as oportunidades nos mercados.
(15) Ver http://www.cnbc.com/id/44549144.
(17) Ver http://www.reuters.com/article/2011/09/16/usgoldmansachs-hedgefund-idUSTRE78F28Y20110916.
(21) Ver http://www.cnbc.com/id/44533146.
(23) Ver http://www.marketwatch.com/story/commerzbankprofit-falls-93-on-greek-impairment-2011-08-10.
(25) Ibidem.
(26) Ver: http://www.ft.com/intl/cms/s/0/b44410e0-6010-11e0-abba-00144feab49a.html#axzz1X3q1aSC2.
(27) Disponível em http://www.marketwatch.com/story/fornext-rating-downgrade-sp-may-look-at-france-2011-08-10?dist=afterbell.
(28) Disponível em http://www.bloomberg.com/news/2011-08-10/french-aaa-credit-affirmed-by-standard-poor-s-moody-samid-market-rout.html.
(29) Disponível em http://www.reuters.com/article/2011/08/24/france-budgetidUSLDE77N04F20110824.
(30) Disponível em http://epp.eurostat.ec.europa.eu/cache/ITY_PUBLIC/2-26042011-AP/EN/2-26042011-AP-EN.PDF.
(31) Ver http://www.usdebtclock.org/world-debt-clock.html.
(34) Ver http://www.charlotteobserver.com/2011/09/02/2574344/bank-of-america-layoffs-could.html.
(38) Oscar Ugarteche – economista peruano e pesquisador do Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade Nacional do México (Unam).
[39] Leonel Carranco – colaborador do Observatório Econômico da América Latina da Unam.
Tradução: Carlos Santos para esquerda.net.
* Trecho do artigo “Estamos perante a segunda crise bancária? – Notícias da crise 2011” de Oscar Ugarteche (38) e Leonel Carranco (39), que foi publicado no site do Observatório Económico da América Latina (obela.org).
** Publicado originalmente no site Agência Carta Maior.