A educação dos milionários

Quem quiser saber como se vão produzir o conhecimento e os melhores empregos no futuro terá de conhecer um japonês chamado Joi Ito, de 45 anos, que, segundo os padrões tradicionais, seria rotulado na faculdade de “vagal”. Apesar de vir de uma família de acadêmicos (e acadêmicos japoneses, vale ressaltar), não conseguiu o diploma de ensino superior. Até tentou, mas abandonou, com certo orgulho, os cursos de ciência da computação e de física. Você imaginaria um brilhante futuro acadêmico para esse rapaz?

Desde o início de setembro, Joi Ito dirige uma das principais referências planetárias em pesquisa acadêmica, especialmente em tecnologia da informação, onde se moldou o mundo digital: o MediaLab, do MIT. Foi escolhido por ser um reconhecido empreendedor, que está sempre investindo em empresas ou projetos inovadores. É um dos criadores, por exemplo, do Creative Commons, um marco no debate de direitos autorais na internet. Foi também um dos primeiros a ajudar a tirar do papel o Twitter e o Ficar. Milionário, ele tem casas em vários países e passa a maior parte do ano viajando para se sentir o que ele chama de “cidadão do mundo”.

Diante da pergunta sobre como convenceria estudantes a ficar na escola se ele próprio não ficara, Ito deu a seguinte resposta: “Se eu estudasse num ambiente tão criativo e profundo como o MediaLab, nunca teria ido embora”.

Joi Ito simboliza o incrível poder dos “vagais”, agora ganhando status acadêmico, e sinaliza o perfil de gente que inventa empregos.

Foram jovens que abandonaram a escola que criaram a Microsoft, o Twitter, o Facebook e a Apple. Pense quantas vezes por dia você usa alguma de suas criações.

O fato é que os grandes nomes de sucesso de hoje, em vez de perder tempo trancados numa sala de aula, preferiram ficar metidos em alguma garagem reinventando o futuro e, assim, gerando empregos.

O debate é especialmente intenso agora, com os sinais de revolta no mundo -e o Ocupe Wall Street é o símbolo- diante da dificuldade de criar empregos nas nações ricas.

Nada disso significa que a universidade seja uma instituição falida. Imagine ir a um médico sem diploma ou mesmo entregar a construção de um prédio a um engenheiro que não conhece resistência de materiais. Ninguém quer ter os dentes tratados por um barbeiro.

A questão, portanto, é saber como nutrir empreendedores, envolvendo as universidades, onde, em tese, deve concentrar-se o conhecimento mais avançado.

Por isso, está fazendo sucesso um livro recém-lançado, intitulado “A Educação dos Milionários”, escrito por Michael Ellsberg, que entrevistou durante dois anos empreendedores de sucesso que não pisaram na faculdade ou a abandonaram. Pergunto qual era o traço comum deles. “Uma tremenda habilidade para lidar com o fracasso, transformando-o em aprendizagem”, respondeu.

Nesse ponto, estaria, segundo ele, o grande problema que a escola tem em formar empreendedores: “Na escola, somos treinados para dar a resposta correta, mas a criatividade depende do estimulo à experiência, que, em essência, vem de lidar todo o tempo com o fracasso”.

Pode parecer provocação, mas o argumento tem sido aceito e absorvido pelas melhores universidades.

No próximo mês, Harvard quer transformar num evento mundial o lançamento de sua incubadora de start-ups, onde alunos, pesquisadores, professores e executivos renomados trabalham em conjunto. A ideia é que aquele tipo de gente que criou empresas como o Facebook fique lá dentro por alguns meses, numa espécie de residência, para orientar os mais novos.

Gordon Jones, o responsável pelo projeto, batizado de HI (Harvard Innovation), é um misto de acadêmico de formações as mais variadas com empreendedor de sucesso. Quando pedi que me falasse de seus projetos como empreendedor, Gordon preferiu mostrar um jeito diferente de fazer um currículo. “Olhe aí”, disse, apontando para a parede de seu escritório, em que estão pregados os produtos que ajudou a desenvolver ou vender.

É uma simples questão de sobrevivência. A mil metros da incubadora de Harvard, prospera o bairro com mais start-ups por metro quadrado (Kendall Square), vitaminado pela proximidade com o MIT, onde está Joi Ito.

Vamos encontrar em várias partes do mundo (no Brasil, o melhor exemplo é o ITA) universidades que estipularam como meta servir de incubadoras, sendo uma ponte para a inovação. Disso depende a riqueza de uma nação – aliás, é o que move o governo Dilma a criar uma agência (Embrapii) para aproximar as universidades das empresas.

Ao assumir aquele cargo do MediaLab, Joi Ito apenas está sinalizando essa ponte entre o saber e o fazer.

PS- A incubadora de Harvard será comandada pela Escola de Negócios, obrigada a provar que forma empreendedores. No início do próximo ano, ela vai fazer uma experiência de proporções gigantescas. Todos os 900 alunos do primeiro ano terão de passar um mês desenvolvendo um projeto em algum país, inclusive o Brasil, dentro de um empresa.

* Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo, comentarista da rádio CBN, e fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz.

** Publicado originalmente no Portal Aprendiz.