Genebra, Suíça, 4/11/2011 – Ontem, quando se reuniram na cidade francesa de Cannes, os governantes do Grupo dos 20, formado pelos países mais ricos e por economias emergentes, tinham pela frente o agravamento do comércio e da economia global. Entre os desafios destaca-se o fortalecimento do sistema internacional de comércio e a forma de superar os problemas de desenvolvimento que cria um ambiente desigual para os países pobres.
O G-20 reúne governos de Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Rússia, África do Sul e Turquia, além das autoridades da União Europeia (UE).
Precisamente a UE e seus aliados seguem em conflito com os grandes países em desenvolvimento, como China, Quênia e as nações que formam o grupo Ibas (Índia, Brasil, África do Sul), por um programa sobre o qual os ministros terão que chegar a um acordo durante a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que acontecerá em dezembro nesta cidade.
Até agora não há consenso sobre como deve ser o programa que atenda aos males endêmicos que enfermam a OMC, especialmente para cumprir as promessas da Agenda de Desenvolvimento de Doha, afirmam vários diplomatas. A Agenda de Doha foi lançada há dez anos com o objetivo de corrigir desequilíbrios e assimetrias históricas do sistema mundial de comércio. Foi pensada para permitir que os países mais pobres pudessem se integrar.
A UE e seus aliados, incluída a Suíça, pretendem que os líderes do G-20 instruam seus ministros de comércio para que aprovem a agenda “ambiciosa” que permitirá à OMC ser um órgão ativo. “A posição da UE conta com apoio de fato do diretor-geral da OMC, o francês Pascal Lamy, que deseja uma agenda ampliada”, afirmou um diplomata próximo às negociações.
“Várias delegações querem que os novos enfoques sejam consistentes com o mandato de Doha, dando a entender que a OMC pode cumprir seu papel de dar uma resposta aos desafios globais, como o de manter sob controle as tentativas de protecionismo”, disse Lamy aos membros do Conselho Geral da organização na semana passada. Lamy não mencionou a quantidade exata de delegações nem sua integração, mas se referia principalmente ao pequeno grupo de países encabeçados pela UE, disse o diplomata do Ibas.
O diretor-geral da OMC participa da cúpula do G-20 e, certamente, ali defende sua agenda como forma de revitalizar a organização. No entanto, a China e o Ibas não têm interesse em uma agenda ampliada. Sem o cumprimento dos objetivos em matéria de desenvolvimento da Agenda de Doha, esses países se perguntam por que deveriam abandonar a única promessa das negociações para embarcar em um novo programa.
O princípio acordado é o de não aprovar nada até que todo o pacote seja aceito. Há diferentes perspectivas a respeito, especialmente entre UE, Ibas e China. “Não dizemos ao público a verdade sobre em que ponto estamos e como os membros devem fazer um esforço coletivo para recuperar a credibilidade da organização”, disse o embaixador Roberto Azevedo, representante do Brasil junto à OMC.
Azevedo não concorda com certas demandas específicas da UE, como a concretização de assuntos específicos, como a facilitação comercial e as melhorias do Acordo de Solução de Diferenças. “Caracterizar assuntos extremamente difíceis com áreas nas quais se poderia obter um resultado para um acordo não reflete a situação real e nos levará para mais fracassos ao tentar cumprir uma promessa realista”, declarou à IPS.
O Ibas e a China adotaram posições comuns a respeito da Agenda de Doha, entre outros assuntos. Pequim apoiou a última declaração do Ibas divulgada em 19 de outubro, na qual o grupo reitera o compromisso com o objetivo da Agenda de Doha de atender as desigualdades centrais e o ambiente desigual gerado por problemas para os países mais pobres. A China, por sua vez, quer garantir que haja consequências sólidas sobre o pacote de desenvolvimento.
O surgimento do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) gerou um movimento tectônico na OMC. Moscou não se incorporou à organização, mas o restante apresenta estratégias comuns em matéria de desenvolvimento ao mandato de Doha. “As demandas atuais da Rodada de Negociações de Desenvolvimento de Doha refletem um desequilíbrio no sentido de que há muito espaço para as sensibilidades dos países ricos em matéria de agricultura, além de cobranças injustas aos países em desenvolvimento, como abrir seu mercado no setor industrial e no de serviços”, diz a declaração.
Os países industrializados mudaram os termos das negociações de Doha nos últimos três anos, sem atender as questões centrais. Parecem decididos a tirar o maior proveito com reduções drásticas a produtos industriais e a ampliação do acesso ao mercado de produtos agrícolas. Na outra ponta, a UE divulgou um “documento oficioso” para a cúpula do G-20 em Cannes, no mesmo dia em que o Ibas publicou sua declaração. O texto obtido pela IPS não menciona “os altos níveis de protecionismo, nem os subsídios à agricultura nos países ricos”, como querem os líderes das potências emergentes.
Ainda prevalecem um alto grau de protecionismo e um apoio econômico de dezenas de milhões de dólares à agricultura nos países da UE e em muitos mais que estão na defensiva, como Japão, Suíça e Noruega, entre outros, que deveriam fazer mais a respeito. A UE se defendeu dizendo que é “nossa iniciativa” e que outros podem discutir suas próprias propostas. “Estamos abertos a ideias de outros membros”, disse à IPS o embaixador Angelos Pangratis, representante da UE. “Certamente que esperamos que haja outras iniciativas”, acrescentou, sugerindo que a Comissão Europeia gostaria que fossem discutidos os elementos que propôs. Envolverde/IPS