Os países do BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China) adotaram posição de consenso para as negociações na COP17, em Durban. Essa posição deve contribuir para a continuidade dos impasses que paralisaram as reuniões preparatórias da Convenção do Clima ao longo do ano.
Ministros do Brasil, África do Sul, Índia e China se encontraram na última terça-feira, 1 de novembro, em Pequim e chegaram ao consenso para a posição do grupo nas negociações sobre mudança climática. Elas terão início no final deste mês, em Durban, na África do Sul.
Em comunicado conjunto, os ministros dos quatro países emergentes disseram que as negociações deveriam “lograr um resultado abrangente, justo e equilibrado” e “firmar definitivamente o segundo período de compromissos para o Protocolo de Quioto”. Disseram ainda que o Protocolo de Quioto é a “viga mestra do regime para o clima” e definiram o segundo período de compromissos como a “prioridade essencial” para o sucesso da cúpula do clima. O primeiro período de compromissos do Protocolo de Quioto se esgota no final do ano que vem.
Este foi o último encontro do BASIC antes de Durban e os países nada fizeram além de reiterar posições que já haviam defendido nas reuniões preparatórias oficiais e que terminaram levando as conversas para um beco sem saída.
A insistência em um segundo período de compromissos para o Protocolo de Quioto significa, de fato, que só os países desenvolvidos deveriam ter responsabilidades internacionais legais por políticas para mudança climáticas e metas compulsórias de redução de emissões de gases estufa. Como a ministra Jayanthi Natarajan, da Índia, deixou claro: “a Índia se opõe a qualquer cortes legalmente vinculantes [compulsórios e legais] para países em desenvolvimento”. Autoridades chinesas e brasileiras já disseram a mesma coisa em diversas ocasiões.
Houve algum atrito em relação à posição da África do Sul nessa questão. A África do Sul na percepção de seus parceiros do BASIC, por ser a anfitriã e presidente em exercício da COP17, o encontro das partes da Convenção do Clima, estaria sob pressão para estabelecer um meio termo entre os países desenvolvidos e o BASIC a respeito da necessidade de um acordo mais abrangente e vinculante que alcance todos os grandes emissores de gases estufa.
O negociador chefe para o clima da Africa do Sul, Alf Wills, fez o possível para esclarecer a posição de seu país sobre compromissos obrigatórios de redução de emissões para países em desenvolvimento. Explicou que não procedia a visão de que a “África do Sul estivesse defendendo que os países em desenvolvimento assumissem objetivos quantificados de redução de emissões”.
“Nós sempre defendemos a posição de que nós cumpriremos nossas obrigações legais de adotar ações de mitigação consistentes com nossas respectivas obrigações comuns porém diferenciadas e nossas respectivas capacidades”, disse.
Ele também afirmou que a África do Sul compartilhava a posição de que “o atual sistema do Protocolo de Quioto, que estabelece essas obrigações legais específicas que os países desenvolvidos, em um sistema regido por regras multilaterais… provê o padrão de referência e é a viga mestra de qualquer futuro regime ou sistema para mudança climática.”
Essa deliberada indiferenciação entre os países mais pobres ainda em desenvolvimento e os países emergentes com economias avançadas serve como um escudo conveniente para proteger esses grandes emissores de obrigações legais vinculantes no regime jurídico multilateral.
Os países em desenvolvimento insistem no Protocolo de Quioto por razões puramente ideológicas e econômicas. Nada tem a ver de fato com a busca de um regime eficiente de redução de emissões. O Protocolo conseguiu muito pouco, se é que conseguiu alguma coisa, em redução de emissões durante seu primeiro período de compromissos. Os países em desenvolvimento temem que, se o Protocolo de Quioto for abandonado, os mais ricos usarão a ausência de um quadro legal para se eximirem de suas obrigações. Também temem que sem o Protocolo, os mecanismos que promovem investimentos e financiamentos dos desenvolvidos para os em desenvolvimento, como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, sejam abandonados.
Só a Europa, entre os desenvolvidos, parece disposta a aderir a um segundo período de compromissos. Outros países desenvolvidos como Japão, Austrália, Nova Zelândia e Canadá têm anunciado que não adeririam. Preferem um novo tratado, mais abrangente. O EUA sempre esteve fora do alcance das obrigações vinculantes do Protocolo de Quioto. China, Índia e Brasil se esforçam para ficar fora de qualquer tratado internacional vinculante para redução de emissões, pelo prazo mais longo possível.
O corolário de sua posição sobre o Protocolo ser a viga mestra de qualquer futuro regime global para o clima é que um novo acordo global sobre o clima “abrangente, justo e equilibrado” não deve impor obrigações vinculantes a países em desenvolvimento. Em outras palavras, um novo acordo serviria apenas para estender ao EUA as obrigações do Anexo I do Protocolo de Quioto, vinculantes para os países desenvolvidos que ratificaram o Protocolo e aderiram a seu primeiro período de compromissos. Mas China, Índia e Brasil, embora potências econômicas emergentes e grandes emissores de gases estufa, não seriam alcançados pela parte vinculante do novo regime legal.
Os negociadores oficiais do EUA dizem sempre que um novo acordo global para o clima teve estender o alcance de suas provisões vinculantes para que atinjam, no mínimo, China, Índia e Brasil, entre os emergentes, além de todos os desenvolvidos, inclusive o EUA. Só um acordo com esse alcance seria ratificado pelo Congresso do EUA. Eles admitem uma regra de proporcionalidade baseada nas “responsabilidades comuns porém diferenciadas”, mas não a isenção de metas compulsórias. A isenção só valeria para os países em desenvolvimento mais pobres.
Essa polarização muito provavelmente impedirá os diplomatas de romperem, em Durban, os impasses que paralisaram as negociações por todo o ano, para recolocar nos trilhos as deliberações sobre mudança climática.
* Publicado originalmente no site Ecopolítica.