Os movimentos e partidos populistas, ou ultradireitistas, ganharam força na Europa Ocidental na última década por meio de discursos personificados contra, entre outros temas, a imigração e o multiculturalismo. Hoje, esses grupos avançam e conquistam adeptos divulgando sua ideologia nas redes sociais. É essa ligação quase desconhecida que o estudo The New Face of Digital Populism (O Novo Rosto do Populismo Digital, em tradução livre), realizado pela organização independente britânica Demos, analisa.
O levantamento pediu a simpatizantes de grupos populistas, que geralmente se organizam à margem da sociedade e visam a representar lemas conservadores das classes menos favorecidas, de 11 países europeus para preencherem um questionário.
As mais de dez mil respostas indicaram, segundo o instituto, o descontentamento desta parcela da população com governos, sistemas de Justiça e as elites política e financeira do continente. Aspectos semelhantes à onda de manifestações internacionais contra o neoliberalismo, liderada por jovens lembrados como “os indignados”.
“Os movimentos ‘Ocupe’ [Ocupe Wall Street, por exemplo] têm semelhanças com esses grupos no sentido em que ambos são populistas, desafeiçoados das elites e advogam contra os sistemas político e financeiro”, diz Jonathan Birdwell, pesquisador sênior do Demos e um dos autores do estudo, em entrevista a CartaCapital.
No entanto, as similaridades entre os grupos resumem-se apenas aos aspectos econômicos citados acima, aponta Birdwell. Segundo ele, os 14 grupos analisados, entre eles o Bloc Identitaire (França), CasaPound (Itália) e English Defence League (Reino Unido), vão além da insatisfação com o sistema capitalista moderno e acrescentam ao seu discurso ideias xenófobas, típicas da direita conservadora. Algo que pôde ser captado na pesquisa, pois os entrevistados mostraram-se contra imigração, o Islã e o multiculturalismo, por avaliarem que sua identidade nacional estaria ameaçada. “Mesmo assim é significante o fato de assistirmos ao surgimento de movimentos populistas em ambos os lados.”
De acordo com a pesquisa, os grupos populistas mapeados são compostos majoritariamente por homens (75%) e jovens (63% têm menos de 30 anos), que utilizam mídias sociais online de forma maciça, somando mais de 430 mil seguidores no Facebook. Uma ferramenta de publicidade ideológica que auxilia esses movimentos a levarem 26% de seus “participantes virtuais” às ruas em protestos e demonstrações. “É muito fácil clicar no botão ‘Curtir’ na página da English Defense League, mas esse resultado é bem mais elevado que a média de cidadãos europeus de 10%”, diz. “Essas pessoas estão usando a internet e ferramentas online como uma ponte para estimular de fato outros a se envolverem no ativismo do mundo real.”
Na migração do universo digital para a realidade, a maioria dos entrevistados se disse contrária ao uso da violência a fim de alcançar seus objetivos. Por outro lado, 26% concordaram com atitudes “mais firmes” para atingir as metas almejadas. “Os apoiadores destes grupos tendem a ser muito impacientes, impulsivos, energéticos e querem partir para a ação, mas não creio que vão se voltar exclusivamente para o uso da violência.”
O pesquisador reconhece, porém, o potencial negativo da retórica dos movimentos populistas, aos quais atribui a capacidade de criar “lobos solitários” como Anders Breivik, responsável por um duplo atentado na Noruega, em protesto à invasão islâmica na Europa, que deixou 77 mortos. “Alguns grupos combinam um sentido de urgência ao colocar em jogo a cultura nacional e a identidade dos indivíduos. Usam dados demográficos para dizer que, em 50 anos, os imigrantes muçulmanos no continente serão maioria e os europeus étnicos minoria em seu próprio país.”
No cenário atual de avanço do populismo, Birdwell afirma ainda não ser possível prever o impacto desta ideologia nas novas gerações de cidadãos europeus, mas mostra-se preocupado com o perfil jovem dos integrantes destes grupos. A pesquisa, no entanto, já reflete um aspecto contraditório na população mais jovem, na faixa de 16 a 20 anos. Cerca de 20% deles citaram a imigração como motivo para apoiar movimentos direitistas, contra apenas 10% dos indivíduos acima de 50 anos.
Apesar de os jovens serem vistos como mais liberais que as gerações anteriores, o pesquisador destaca a preocupação do setor com os rumos da economia da Europa e da zona do euro. “Caso a situação siga por um caminho ruim, devemos nos preocupar, pois o apoio a movimentos anti-imigração e xenófobos vai continuar a aumentar, como é historicamente comum nestes períodos.”
Desiludidos sobre o futuro de seus países e críticos à União Europeia, apontada como a responsável pela perda de controle nas fronteiras, 70% deles não confiam mais no sistema de Justiça. Contudo, mesmo sem crer também na política, consideram o voto importante. Por outro lado, 67% votaram na última eleição em partidos populistas, que alcançaram relativo espaço na Europa. “É importante medir o impacto destes grupos na política não pelo tamanho que ocupam e sim pela capacidade de influenciar a elite política com seus discursos”, diz.
Segundo Birdwell, Nicolas Sarkozy, Ângela Merkel e David Cameron já adotaram o antimulticulturalismo, uma ação que reflete a retórica populista. “Conforme os políticos de destaque começam a adotar essas retóricas, vê-se o impacto que esses grupos podem ter.”
* Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.