Buenos Aires, Argentina, 21/11/2011 – Um programa para a gestão sustentável da Bacia do Prata, que envolve cinco países sul-americanos, começou a andar com uma renovada vontade política de preservar seus recursos naturais e sua muito rica biodiversidade. As presidentes do Brasil, Dilma Rousseff, e Cristina Fernández, da Argentina, com seus colegas Evo Morales, da Bolívia, Fernando Lugo, do Paraguai, e José Mujica, do Uruguai, “estão levando adiante, o que possibilitou avanços”, disse à IPS a embaixadora argentina Mónica Troadello, representante política no Comitê Intergovernamental Coordenador dos Países da Bacia do Prata.
Troadello insistiu que, assim como em outras etapas, era habitual apelar para consultores externos para estudar o potencial dos recursos, agora são os próprios técnicos nacionais de cada chancelaria que trabalham com um olhar regional. Esse novo enfoque também inclui o conceito de desenvolvimento. “Durante décadas, ao falar de desenvolvimento se pensava no econômico e produtivo, e agora, para nós, primeiro vem o desenvolvimento humano”, ressaltou.
A partir desta perspectiva, a embaixadora disse que os governos se conscientizaram da importância dos recursos da Bacia que, além das águas doces superficiais, abriga sob a terra o imenso Aquífero Guarani. A Bacia do Prata, que se estende por cinco países e tem 3,1 milhões de quilômetros quadrados, é uma das cinco maiores do mundo e a segunda mais extensa da América do Sul, depois da amazônica, mas é muito mais povoada e produtiva do que esta última.
Considerada uma das reservas com maior volume de água doce do mundo, a região abriga cem milhões de pessoas e gera 70% do produto bruto dos cinco países que a contêm. Isto por incluir algumas das cidades mais importantes da América do Sul, como Brasília, São Paulo, Assunção, Buenos Aires e Montevidéu. Nasce no Pantanal brasileiro e desce até o Rio da Prata, que banha a costa de Argentina e Uruguai e desemboca no Atlântico. Também inclui os rios Paraná, Paraguai e Uruguai, com seus respectivos afluentes, em um sistema onde há 150 represas, três delas grandes complexos hidrelétricos binacionais.
Dentro da Bacia há ecossistemas de rica biodiversidade, como o Grande Chaco Americano. Na Argentina estão as pradarias e o pampa úmido, o delta do Paraná, e os charcos e banhados do nordeste. No Brasil se encontram o Pantanal, o Cerrado e a Mata Atlântica, floresta tropical úmida que inclui atualmente 17 Estados. Daí a necessidade de abordagem regional da bacia e a proteção conjunta de seus recursos diante de novos desafios como mudança climática, escassez de água, desmatamento, sobrepesca e contaminação por agroquímicos, entre outros.
“Celebramos as iniciativas focadas na Bacia como um grande sistema integrado, onde a sustentabilidade ambiental é a base econômica, social e política”, disse à IPS Jorge Cappato, da Fundação Proteger, que trabalha em temas de água, mangues e pesca. Cappato recordou que especialistas da organização ambientalista World Wildlife Fund (Fundo Mundial para a Natureza) colocaram a Bacia do Prata entre as três mais ameaçadas do planeta.
“Nesta Bacia se experimenta um dos maiores crescimentos produtivos do mundo. Porém, o aumento das monoculturas, o desmatamento e a construção de represas representam severas ameaças”, alertou Cappato. “Sem proteção do capital natural, este acaba sendo consumido, com a consequência de custos impagáveis e vulnerabilidade”, alertou. O programa-marco, lançado formalmente em outubro, prevê uma série de medidas conjuntas para o diagnóstico do estado da Bacia e as possíveis ações que devem ser realizadas em cada país para a preservação dos recursos compartilhados.
“No último ano e meio, a coincidência entre os países foi tamanha que o avanço do trabalho na Bacia foi extraordinário”, disse Troadello, representante do também chamado CIC Prata. Esta equipe multilateral nasceu em 1967 e, dois anos depois, foi assinado o Tratado da Bacia do Prata, que deu maior institucionalidade à construção comum.
Mediante o Tratado houve um avanço, sobretudo na integração física dos países que são parte do acordo e nas grandes obras de infraestrutura com aproveitamento dos recursos, mas, sem maior consciência sobre o impacto ambiental das obras. Depois, o CIC Prata entrou em uma fase de escassa incidência e poucos recursos, contou a embaixadora. Agora, no entanto, “houve consciência entre os países e se começou a trabalhar em um programa-marco”, acrescentou.
O objetivo é fazer o acompanhamento da Bacia do Prata, seu balanço hídrico, detectar os principais desafios que enfrenta a região e delinear estratégias concretas de trabalho para a gestão integral dos recursos a partir de 2015. “A tendência mundial é para uma observação multidisciplinar que detecte os problemas, por exemplo, aumento da temperatura média, e que a partir deste dado sejam propostas as ações prospectivas”, explicou Troadello. “Temos 6% da população mundial e 20% dos recursos hídricos, enquanto países como a China têm esses indicadores invertidos”, acrescentou.
Troadello, nascida na província de Mendoza, região seca que depende da água do degelo da Cordilheira dos Andes, destacou também a riqueza do sistema do Rio da Prata comparando o volume de água que contém. Enquanto em Mendoza a média do movimento de água é de 50 metros cúbicos por segundo, na Bacia a média é de 22 mil metros cúbicos por segundo. “É um volume imenso, com uma extraordinária capacidade de recuperação”, destacou. “Se conseguirmos casar as bacias do Prata e a Amazônica, o destino da América do Sul se tornará muito interessante”, afirmou. Envolverde/IPS