Rio de Janeiro, Brasil, 2/1/2012 – A queda mundial do consumo de tabaco, especialmente em nações industrializadas, indica a urgência de países produtores, como Brasil, China, Estados Unidos e Índia, de oferecer alternativas aos seus agricultores. No Brasil, cultivado há 120 anos, o tabaco é um item importante na balança comercial do país.
O balanço de 2001 da indústria do tabaco mostra que a China ocupa o primeiro lugar na produção mundial, com 2,4 milhões de toneladas, vindo o Brasil em segundo lugar, com 867.210 toneladas. Cerca de 200 mil estabelecimentos de pequena agricultura familiar fornecem 95% da produção brasileira de tabaco, localizados principalmente nas regiões sul e nordeste.
No dia 15 de dezembro, a presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei de controle do cigarro que eleva a carga tributária sobre o produto, estabelece preços mínimos, proíbe fumar em todos os espaços públicos e locais de trabalho fechados e proíbe a publicidade nos pontos de venda. Assim, com seus 192 milhões de habitantes, o Brasil pode se converter no país mais povoado do mundo a se declarar livre dos males do tabagismo, segundo a organização não governamental norte-americana Campaign for Tobacco-Free Kid (Campanha por uma Infância Livre de Tabaco).
“O Brasil é o maior país a adotar uma lei antitabaco”, disse à IPS a ativista Patricia Sosa, encarregada do programa latino-americano dessa organização. “Todos os anos, a fumaça de cigarro no ambiente causa mais de 600 mil mortes prematuras, e os fumantes passivos que estão expostos a ela em casa ou no trabalho aumentam em 30% o risco de desenvolver câncer de pulmão”, acrescentou.
A nova lei proíbe a publicidade nos maços de cigarros e só permite a exposição de produtos com mensagens sobre os danos à saúde que ocupem, pelo menos, 30% da parte frontal do maço. Esta disposição entrará em vigor no primeiro dia de janeiro de 2016. Também eleva em 300% o imposto sobre produtos industrializados para os cigarros, o que vai aumentar em 20% o preço para o consumidor já em 2012, e em 55% dentro de três anos.
Ainda assim, a Aliança de Controle do Tabagismo (ACT) acredita que a indústria do cigarro continua sendo muito lucrativa. Aproximadamente 90% do tabaco produzido no Brasil é exportado e sua produção é bastante elevada, apesar de a prevalência de fumantes vir diminuindo há duas décadas, disse à IPS a vice-presidente da ACT, Mônica Andreis.
“O argumento da indústria é que tais medidas levarão o país ao caos econômico. Contudo, muitos agricultores familiares, que dependem unicamente deste tipo de cultura para sobreviver, se expõem a difíceis condições de trabalho e ficam doentes devido ao contato direto com as substâncias químicas da folha de tabaco”, afirmou Andreis.
Trabalhar na plantação de tabaco causa problemas de saúde associados ao uso intensivo de agrotóxicos e à doença do tabaco verde (GTS), uma intoxicação aguda provocada pela absorção de nicotina pela pele, que ocorre durante a manipulação das folhas da planta. “Muitos agricultores já afirmaram que preferem diversificar ou mudar de cultivo”, contou a ativista.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário anunciou que investiu, no ano passado, US$ 6 milhões em assistência técnica e serviços de extensão rural para cerca de dez mil famílias produtoras de tabaco que diversificaram seus cultivos. Os recursos incluem especialmente famílias dos sete Estados produtores: Alagoas, Sergipe, Bahía, Paraíba, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
Ao fim de um ano, o governo pretende elevar para 50 mil o número de famílias assistidas pelo Programa Nacional de Diversificação em Áreas Cultivadas com Tabaco, criado em 2005. Segundo as autoridades, este programa integra uma das iniciativas interministeriais mais importantes do país para atender as diretrizes de aplicação do Convênio Marco da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o Controle do Tabaco, ratificado pelo Brasil naquele mesmo ano.
O programa facilita o acesso dos produtores a canais de financiamento e a tecnologia com fins de reconversão ou diversificação. Há em marcha 65 projetos de diversificação de cultivos de tabaco na agricultura familiar que incluem criação de frango e peixe, gado leiteiro, frutas e hortaliças. Nos últimos seis anos, foram destinados US$ 14 milhões para 80 mil famílias produtoras de tabaco.
Segundo estudo da Associação de Produtores de Tabaco do Sul do país, de quase 187 mil famílias dedicadas à produção, 47 mil não têm terra e trabalham em regime de parceria, enquanto 80% das 140 mil propriedades possuem área de até 20 hectares.
O Convênio Marco, primeiro tratado internacional de saúde pública, tem até agora 174 Estados-parte e orienta a implantação de políticas públicas para o combate do tabagismo, considerado pela OMS uma epidemia mundial não transmissível. Embora a quantidade de fumantes brasileiros venha caindo nos últimos 20 anos, ainda existem quase 25 milhões de pessoas, de 15 anos ou mais, que fumam, lembrou Andreis.
O perfil majoritário do fumante brasileiro mostra um homem entre 45 e 64 anos (quase 22% dos que fumam). Os que vivem em zonas rurais, os menos escolarizados e os de menor renda familiar por pessoa são maioria entre os fumantes, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e do Instituto Nacional do Câncer.
“Entre as pessoas sem instrução ou com menos de um ano de estudo, a proporção dos que começaram a fumar antes dos 15 anos de idade chega a 41%, e a proporção de estudantes que provaram o cigarro em 2009 foi de quase 25%”, afirmou Andreis.
A América Latina ocupa lugar destacado na aplicação do Convênio Marco. Dez países já adotaram fortes restrições à publicidade, à promoção e ao patrocínio de cigarros, cinco países possuem impostos de 70%, ou mais, sobre o preço de venda, e sete contam com rótulo obrigatório de advertência em pelo menos 30% de cada maço. O Uruguai foi o primeiro a adotar uma dura lei antitabagismo. As mensagens de advertência nesse país ocupam 80% do maço de cigarros. Envolverde/IPS