Rio de Janeiro, Brasil, 2/1/2012 – O movimento ambientalista ganhou a batalha ideológica com a ampliação do conhecimento sobre a mudança climática. Seus ativistas já não são os “louquinhos” ou “incomodados” do passado: o isolamento agora cabe aos céticos ou aos que negam o aquecimento global pela ação humana. Os eventos extremos, cada vez mais frequentes, e o aumento do nível das águas dos oceanos contribuíram para considerar seriamente as advertências, que no passado recente eram respondidas de modo irônico ou simplesmente subestimadas.
A sustentabilidade se incorporou inclusive ao vocabulário empresarial, e as campanhas e os consumidores induzem certos setores produtivos a assinarem acordos de boa conduta ambiental e social, como compromissos para rejeitar madeira ou carne produzidas à custa do desmatamento da Amazônia. Entretanto, essa legitimidade científica das propostas ambientalistas não se transforma em força política na hora das grandes decisões, por exemplo, nas conferências que tentam estabelecer um tratado mundial para conter o aquecimento da Terra.
O consenso, já praticamente alcançado, de que nosso planeta caminha para um catastrófico destino se não forem tomadas medidas urgentes, não conta com o correspondente poder político para impulsionar ações consideradas indispensáveis para reduzir as emissões dos gases que provocam o chamado efeito estufa. O empurrão obtido na década de 1990 com a Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, aprovada na Cúpula do Rio de 1992, e o Protocolo de Kyoto, assinado cinco anos depois nessa cidade japonesa, parece perdido, embora se tenha acumulado e difundido mais conhecimentos sobre a ameaça de hecatombe humana.
A crise ambiental é um dos desafios que colocam em xeque a sobrevivência da democracia neste século, segundo um grupo de intelectuais que o instituto Internacional de Pesquisa Política de Civilização (IIRPC) reúne periodicamente em Poitiers, na França, para discutir grandes temas da humanidade. Os regimes democráticos não parecem capazes de enfrentar a mudança climática, porque o caráter temporário da dinâmica política é de curto prazo, enquanto a ambiental se conta em décadas, resumiu Elimar Pinheiro do Nascimento, diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e participante dos seminários em Poitiers.
Uma cuida da liberdade e a outra da sobrevivência, por isso um “crescente número de intelectuais” acredita que a humanidade vai preferir subsistir em lugar de lutar pela democracia, quando tiver de escolher entre essas duas opções excludentes, acrescentou Nascimento. Também estão à prova os mecanismos para adoção de acordos internacionais no sistema multilateral da Organização das Nações Unidas (ONU). O Protocolo de Kyoto, que venceria inicialmente em 2012, deveria obrigar os 37 países industrializados a reduzirem suas emissões de gases-estufa em pelo menos 5,2% em relação aos volumes registrados em 1990. Porém, não conseguiu seu objetivo.
Este acordo esteve limitado desde o início de sua vigência, em 2005, por suas metas tímidas e pela recusa dos Estados Unidos, então os maiores emissores mundiais de carbono. Sua prorrogação até a vigência de um novo tratado global ocorre em condições de maior debilidade ainda, com a retirada de Canadá, Japão e Rússia. A aprovação de um convênio nas conferências da ONU é difícil porque exige consenso entre as partes e não assegura eficácia, já que, em geral, não são previstas sanções por descumprimentos e sua adoção depende da ratificação dos parlamentos nacionais.
É no jogo parlamentar que costuma se manifestar a debilidade do ambientalismo, especialmente diante dos interesses econômicos antagônicos que travam a negociação de tratados internacionais à altura do desafio climático ou que podem reduzir seus efeitos, com aconteceu com o Protocolo de Kyoto.
Os partidos verdes são extremamente minoritários e pouco influem nas políticas nacionais, salvo algumas exceções, como a da Alemanha. Além disso, muitos abandonaram seus princípios originais ao se envolverem no jogo eleitoral, como no Brasil. Outros instrumentos de luta, como mobilizações, protestos, campanhas de comunicação e outras variadas formas de pressão social tampouco parecem suficientes para promover as necessárias mudanças.
Uma revisão do Código Florestal brasileiro nega os esforços para reduzir os gases-estufa no país, reconhecido como campeão da mitigação climática pelo secretário-executivo do Programa das Nações Unidas para o Mudança Climática, Achim Steiner. A votação do projeto, que flexibiliza exigências ambientais e perdoa desmatamentos ilegais de latifundiários, demonstrou a impotência dos ambientalistas, bem como dos cientistas que pediam para serem ouvidos no debate.
Os defensores do Código Florestal que protege as florestas do Brasil desde 1965 sofreram uma derrota esmagadora em maio, de 410 a 63 votos na Câmara Federal, e no dia 6 de dezembro, de 59 a sete no Senado. A reforma espera aprovação definitiva nos próximos meses, em uma nova votação dos deputados, porque precisou voltar à Câmara em razão de modificações feitas no texto pelos senadores com meia sanção. Os ambientalistas agora temem uma versão final mais negativa ainda para o meio ambiente, já que os deputados se revelaram mais inclinados pelos interesses dos proprietários dos grandes estabelecimentos rurais.
A 17ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 17), realizada entre 28 de novembro e 11 de dezembro de 2011, na cidade sul-africana de Durban, foi “um retrocesso”, ao aprovar apenas “uma promessa” de ações a partir de 2020, escreveu Marina Silva em um artigo publicado no dia 16 de dezembro no jornal Folha de S.Paulo. Faltam estadistas, “líderes que se apresentem nas crises” para promover as mudanças necessárias, acrescentou a ex-ministra do Meio Ambiente do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
No entanto, é mais do que incerto o surgimento de suficientes dirigentes capazes de enfrentar interesses políticos e econômicos imediatos para sustentar a sobrevivência da humanidade. Será, provavelmente, necessário descobrir novos mecanismos para aprovar e assegurar políticas de muito longo prazo como exigem os problemas ambientais.
O desequilíbrio de poder a favor da economia é desmedido. Os bancos centrais, por exemplo, dispõem hoje em muitos países de autonomia para adotar medidas monetárias, às vezes impopulares, evitando pressões até mesmo dos próprios governos nacionais. As crises financeiras, como a que afeta atualmente o mundo industrializado, levam à chefia de governos economistas especializados no assunto. No entanto, ninguém imagina um poder semelhante nas mãos de ambientalistas ou especialistas em clima.
Marina Silva pretendia, ao assumir o Ministério em 2003, que as questões da área fossem “transversais”, consideradas nas ações de todos os ministérios do governo Lula. Entretanto, renunciou em maio de 2008, deslocada pelos poderes muito superiores atribuídos ao desenvolvimento econômico. Envolverde/IPS