Port Louis, Mauricio, 3/1/2012 – Mauricio planeja privatizar a água, enquanto as chuvas são escassas, os encanamentos centenários perdem quase a metade do recurso, as pessoas o gastam mal e não há quem o administre sabiamente. “As tarifas de água são baratas, comparadas com as de outros países da região, mesmo contando o aumento de 35% previsto para este mês”, disse o ministro de Serviços Públicos e Energia, Rashid Beebeejaun.
Uma família de quatro pessoas consome 20 metros cúbicos (20 mil litros) de água potável por mês, e “só gasta 150 rupias”, cerca de US$ 5, calculou Beebeejaun. “Compare este valor com o preço do cigarro”, acrescentou.
Atualmente, dez metros cúbicos para uso doméstico custam US$ 1,5, enquanto os clientes comerciais pagam US$ 0,43 para os primeiros cem metros cúbicos, os industriais US$ 0,34 e o setor hoteleiro US$ 0,62 pelo mesmo volume. O tratamento e a distribuição de um metro cúbico de água custam 12 rupias, cerca de US$ 0,41, segundo a Autoridade Central de Água (CWA).
O primeiro-ministro, Navin Ramgoolam, reconheceu um problema com o fornecimento de água neste país insular, localizado no Oceano Índico, a 2.400 quilômetros da costa sul da África. “Podemos ter um montão de água, mas não planejamos adequadamente. Este é o problema”, disse. Mais de 99% da população tem água encanada em suas casas ou no trabalho.
Técnicos da Companhia de Serviços Públicos de Cingapura revisam o funcionamento de todo o setor, tanto público quanto privado, para melhorar a distribuição. A escassez se deve principalmente pelos vazamentos na rede de distribuição, que tem cem anos e nunca recebeu manutenção por falta de recursos. Pelo menos metade da água se perde antes de chegar aos consumidores, disse Dev Aukle, gerente-geral da CWA.
O desafio é enorme, disse Beebeejaun, que divulgou um plano para substituir parte da rede de dois mil quilômetros e construir duas represas. Já o presidente da central sindical Congresso de Trabalhadores de Mauricio, Haniff Peerun, afirmou que a privatização sempre implica aumento da tarifa, enquanto os investidores obtêm grandes lucros.
“As tarifas continuarão aumentando com uma empresa privada. Atualmente, estas vendem um litro de água por 20 rupias (US$ 0,69). Uma pessoa pode conseguir quatro mil litros por esse valor no setor público. Como vamos aceitar as privatizações?”, questionou.
Em uma manifestação diante dos escritórios da CWA em dezembro, o secretário-geral da Associação de Consumidores de Mauricio, Jayen Chellum, disse que não se justificam o aumento das tarifas nem a privatização, pois “boa parte da população não tem água suficiente devido aos vazamentos nas tubulações”.
Riadh Hulmuth, morador de New Grove, ao sul de Maurício, apontou outro problema: o papel da política partidária na administração das entidades públicas. “Dirigentes políticos sem capacidade costumam estar à frente dos órgãos públicos. Recebem altos salários e outros benefícios, como automóvel e diárias em viagens. Se o serviço estivesse em mãos privadas, existiria menos perda, boa gestão e água abundante para todos”, ressaltou.
Kritanand Beeharry, da federação de cooperativas agrícolas, não tem objeção à privatização, “se as tarifas forem mantidas”. Entretanto, concorda com aumento dos preços para outros fins porque “o governo precisa de dinheiro para investir em infraestrutura e levar água para todas as famílias. Não é uma tarefa fácil porque os custos de produção aumentam”, afirmou.
No entanto, o fazendeiro Prakash Bhuckory, da aldeia Nouvelle Découverte, no centro do país, está descontente, pois o aumento das tarifas afetará a rentabilidade de seu estabelecimento leiteiro de 200 vacas. “A forragem e outros insumos para a criação de animais não são baratos e a produção de leite não é grande. Será difícil gerenciar a fazenda se os preços continuarem aumentando”, afirmou.
Mauricio recebe 2.100 milímetros de chuva por ano, recolhidos em 11 represas, cinco aquíferos, 25 rios e riachos e 364 poços. Contudo, a maior parte acaba no mar devido à topografia desta ilha de 1.862 quilômetros quadrados, enquanto o restante é dividido por usuários particulares, com consumo de 167 litros por habitante. O consumo nacional, incluindo a indústria e outros setores, é de 221 litros por habitante.
A demanda geral por água aumenta 2,5% ao ano, com 16% de aumento para usos domésticos, 62% para os comerciais, 44% para hotéis, e 32% para as instituições públicas. No entanto, cerca de 360 usuários, a maioria engenhos de açúcar, têm garantido quase sem custo o direito a água dos cursos de água que passam ou margeiam suas terras, segundo a Lei de Canais e Rios, de 1863.
No entanto, o ministro de Serviços Públicos e Energia disse à IPS que os recursos hídricos pertencem ao Estado e que o direito à água que se cede implica o uso, não a propriedade. “Os possuidores de direitos de água empregam quase a metade do recurso disponível na ilha. Estamos analisando o assunto seriamente”, disse Beebeejaun.
O diretor da Associação de Produtores de Açúcar de Mauricio, Jean Li Yuen Fong, disse à IPS que as propriedades rurais precisam de água para irrigação, pois cultivam cana-de-açúcar, verduras e frutas. “Sem água, seria impossível produzir alimentos”, acrescentou. Os produtores estão conscientes da escassez e por isso investem em tecnologias novas e eficientes, acrescentou. Caso o governo coloque preço na água de rio, que segundo a polêmica lei é gratuita, definitivamente aumentarão os custos de produção, insistiu Fong.
Os produtores morrerão se não puderem usar água dos rios, concordou Salil Roy, gerente da Associação de Reforma das Plantações. “Por um lado, nos pedem para produzirmos mais alimentos, e por outro a água vai para o mar. Que mal há em usá-la?”, perguntou. Envolverde/IPS