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Espanha reduz a cooperação, mas menos para a América Latina

Madri, Espanha, 10/1/2012 – O governo da Espanha decidiu reduzir seu orçamento para a cooperação internacional para o desenvolvimento, mas evitará que afete em menor medida a América Latina e o Caribe e, em especial, que prejudique o menos possível os setores sociais menos favorecidos. O ministro de Assuntos Exteriores e de Cooperação, José Manuel García-Margallo, que integra o governo do primeiro-ministro conservador Mariano Rajoy desde 21 de dezembro, disse à IPS que o ajuste orçamentário é necessário devido à situação de crise global que se vive.

Porém, o novo chefe da diplomacia espanhola considerou que junto com as reduções também será preciso implantar medidas para promover o crescimento econômico e a melhoria das relações internacionais, dentro de um plano integral. Em um ato realizado ontem em Madri, no qual assumiram seus cargos oito funcionários de seu Ministério, García-Margalllo usou uma frase do primeiro chefe de governo da democracia espanhol após a ditadura de Francisco Franco (1939-1975).

Adolfo Suárez (1976-1981) disse pouco depois de iniciar a transição democrática que é preciso mudar o encanamento, mas continuar fornecendo água, e mudar os cabos, mas sem deixar de proporcionar eletricidade. Ou seja, fazer mudanças, mas olhando para a frente. O ajuste orçamentário da chancelaria espanhola é de aproximadamente US$ 1,3 bilhão, o que significa redução de 40% em relação ao de 2011. Ainda não foi determinado em quanto afetará a cooperação, mas é certo que afetará.

Sobre isso, o presidente da Coordenadoria de Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento (Congde), Eduardo Sánchez Jacob, disse ser verdade que a situação é muito complexa, mas também que há vários instrumentos para enfrentá-la. Primeiro, disse, “pode-se e deve-se fazer um esforço para que os projetos de cooperação sejam mantidos”. Para isso, devem ser usados critérios “que levem em consideração os setores mais vulneráveis dos países em desenvolvimento”, de modo que os cortes orçamentários não os afetem.

Fernando de Salas, atual reitor honorário da Sociedade de Estudos Internacionais e grande especialista no setor, afirmou à IPS que a cooperação deve ser mantida e que também é preciso encarar com decisão a luta contra os desastres naturais, “que não só afetam a natureza mas também a população e dentro desta os setores mais desfavorecidos”. Recordou que o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, pediu, em agosto, em seu último informe, “uma aplicação estratégica internacional para a resolução dos desastres”, destacando que eles produzem danos psicológicos, além dos físicos, “como ocorre às famílias que passam fome”.

Salas, que também integra o Clube de Roma, afirmou que os danos ecológicos são grandes, mas os 193 Estados-membros da ONU não contribuem para enfrentá-los. Para isso, acrescentou, “é preciso modificar a mentalidade dos governantes para que cumpram seus compromissos com as Nações Unidas e dar prioridade aos gastos que permitam enfrentar os aspectos devastadores”. O reitor concluiu com uma proposta original: “assim como foram criados os Capacetes Azuis para enfrentar situações militares ou terroristas de emergência, a ONU deveria criar os Capacetes Verdes para atuar diante de emergências e desastres naturais”.

A Congde divulgou um comunicado recordando ao governo de Rajoy que, “diante de uma crise de dimensões globais como a que nos afeta, as respostas devem também ser globais e proteger antes de tudo os serviços sociais básicos das pessoas e o bem-estar social, tanto na Espanha quanto nos países empobrecidos”. “Consideramos injusto que sejam precisamente as pessoas mais vulneráveis as que tenham de pagar por esta crise; os fundos destinados à cooperação são os que maiores cortes sofrerão (superados apenas pelos realizados em infraestrutura)”, declarou a entidade. Em especial, pediu considerar que “a cooperação ao desenvolvimento não é um luxo para tempos de bonança, mas uma responsabilidade ética, uma política pública que deve ser plenamente garantida”.

Ao assumir ontem seu cargo de secretário de Estado de Cooperação Internacional e para a Iberoamérica, o diplomata Jesús Gracia Aldaz, recordou ter passado 12 anos na América Latina, onde comprovou que “os espanhóis vivem ali como em sua casa”. De fato, nos últimos anos foi ministro conselheiro na embaixada da Espanha em Buenos Aires. Por isso, acrescentou que, ao assumir a secretaria, assume um compromisso firme com a América Latina, “que vive momentos difíceis” e “em tempo de crise é quando se deve buscar soluções”.

Por isso, Gracia adiantou que pensa incentivar a cooperação como uma política de Estado e fazer com que a ajuda seja eficaz, para assim contribuir para que os aportes do setor “sejam bem investidos e destinados para onde são mais férteis”. A Secretaria de Estado para a Iberoamérica foi suprimida pelo governo anterior, do socialista José Luis Rodríguez Zapatero. Seu restabelecimentlo por Rajoy reflete o cumprimento do compromisso assumido em diferentes declarações de ampliar a cooperação com a América Latina e o Caribe, incluída a não econômica. Envolverde/IPS