Doha, Catar, 12/1/2012 – Um ex-observador da Liga Árabe na Síria qualificou de “farsa” essa missão em curso, enquanto a Organização das Nações Unidas (ONU) informou que as forças do presidente sírio, Bashar Al Assad, mataram mais manifestantes de oposição. O argelino Anwar Malek disse à rede de televisão árabe Al Jazeera que renunciou após ver que a missão na Síria estava se afastando de seu propósito inicial, que era constatar se realmente Assad havia acabado com a repressão contra o movimento opositor.
“O que vi foi um desastre humanitário. O regime não só comete um crime de guerra como também uma série de crimes contra a população”, afirmou Malek. “Os franco-atiradores estão por todo lado disparando contra civis. Pessoas são sequestradas. Os prisioneiros (políticos) são torturados e nenhum é libertado”, acrescentou. Além disso, afirmou que as forças de segurança sírias não retiraram seus tanques das ruas, apenas os escondiam e voltavam a utilizá-los depois que os observadores árabes abandonavam cada lugar visitado.
Por outro lado, o presidente Assad falou perante uma multidão de seguidores em Damasco, no dia 10, e voltou a responsabilizar forças externas de conspiração contra a Síria. “Triunfaremos sobre esta conspiração. Está morrendo, é o fim de seu complô”, afirmou. Nesse seu primeiro discurso desde junho de 2011, o mandatário fez algumas promessas de reformas, mas nenhuma concessão que acalmasse a oposição, que está decidida a acabar com mais de quatro décadas de domínio da família Assad.
A ONU informou que mais de cinco mil civis foram assassinados desde que começaram os protestos contra o regime, em março passado. Por seu lado, Assad afirmou que “terroristas assassinaram dois mil integrantes das forças de segurança. O secretário-geral adjunto das Nações Unidas para Assuntos Políticos, Lynn Pascoe, disse no dia 10, no Conselho de Segurança, que a Síria acelerou o assassinato de manifestantes pró-democráticos desde a chegada dos observadores árabes.
Pascoe “explicou que, desde que a missão observadora da Liga Árabe está no local, cerca de mais 400 pessoas foram assassinadas, uma média de 40 por dia, taxa muito maior do que a anterior à chegada da missão”, disse a embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Susan Rice. Pascoe fez uma resenha da situação na Síria para o Conselho de Segurança, em reunião a portas fechadas. “É um claro indício de que o governo da Síria, em lugar de aproveitar a oportunidade para acabar com a violência e cumprir todos seus compromissos (com a Liga Árabe), pelo contrário, incrementou a repressão”, acrescentou Rice.
Em seu discurso Assad fez mordazes comentários sobre a Liga Árabe, que em novembro suspendeu a qualidade de membro da Síria. O presidente afirmou que o grupo “falhou durante seis décadas na defesa dos interesses árabes”. Por seu lado, a Liga Árabe condenou, no dia 9, o fato de 11 observadores serem feridos por manifestantes na cidade portuária de Latakia, e acusou Damasco de não cumprir sua responsabilidade de protegê-los. O governo sírio respondeu garantindo que resguardaria os observadores e condenou qualquer ato que prejudique seu trabalho.
“O regime não atendeu nossos pedidos, de fato, tentou nos enganar e nos afastou do que realmente acontece para nos mostrar coisas insignificantes”, denunciou Malek, acrescentando que as imagens de supostas libertações de prisioneiros políticos, mostradas pela televisão síria, eram, na realidade, pessoas escolhidas ao acaso na rua. “Foram detidas por quatro a cinco dias em duras condições e depois libertadas como se fossem prisioneiras”, assegurou.
“Alguns dos membros de nossa equipe preferiram manter boas relações com o regime e negar que havia franco-atiradores” por todos os lados, garantiu Malek, que também afirmou que o regime de Assad “ganhou muito tempo para implantar seu plano. Portanto, decidi me retirar dessa missão”. A Liga Árabe não respondeu aos pedidos de resposta feitos pela Al Jazeera sobre os comentários de Malek. Envolverde/IPS
* Publicado sob acordo com a Al Jazeera.