Havana, Cuba, 18/1/2012 – Ao aproximar-se a inédita Conferência Nacional, no dia 28, que dará continuação ao VI Congresso do Partido Comunista de Cuba (PCC), a reiteração oficial de que o encontro se concentrará em questões internas da organização parece excluir da agenda os temas sociais. Para analistas, modernizar o PCC, o partido único cubano e no poder desde a década de 60 do século passado, é estratégico, mas não é menos dar uma resposta orgânica às aspirações de setores da sociedade civil interna sobre problemas que ficaram inconclusos ou não foram mencionados no encontro realizado em abril do ano passado.
Entretanto, o presidente Raúl Castro diminuiu as expectativas para a próxima reunião. “Não se deve ter grandes ilusões com a Conferência. O Congresso é o definitivo, agora se trata de uma questão interna do partido”, disse no dia 12 à imprensa estrangeira em Cuba. O VI Congresso traçou o mapa para as mudanças econômicas e deixou para a Conferência assuntos como novas mudanças na nomenclatura política ou adotar uma decisão sobre o prazo não superior a dez anos de permanência em cargos partidários e de governo.
Segundo fontes oficiais, a reunião também deverá avaliar, “com realismo e espírito crítico”, o trabalho do PCC e precisar as transformações necessárias para que a organização possa exercer com eficiência seu papel de “força dirigente superior da sociedade e do Estado” que lhe confere a Constituição cubana. Também terá faculdade para atualizar os métodos e o estilo de trabalho, as estruturas políticas de quadros e continuar avançando no que Castro denomina “processo gradual de renovação e rejuvenescimento da cadeia de cargos políticos e estatais”.
A Conferência Nacional pode ser convocada entre um e outro Congresso para tratar de “assuntos importantes da política do partido”, e pela primeira vez este instrumento interno é utilizado pelo PCC. Sua agenda foi divulgada em um “documento base” que inclui temas sociais, além dos assuntos internos da organização governante. Ao contrário do documento das Diretrizes da Política Econômica e Social, submetido a debates populares com participação aberta antes de ser aprovado no Congresso de abril, o texto da Conferência foi analisado apenas pelos filiados do PCC e da União de Jovens, a organização política da juventude cubana.
Para o ensaísta Víctor Fowler, o encontro partidário pode ganhar em ressonância se todos os meios de comunicação (e, em geral, a própria vida do país) estivessem voltados para a discussão cidadã, pública e “nacional” do estilo de trabalho do PCC, bem como ao seu papel e lugar nos tempos atuais. Ao participar junto com outros intelectuais cubanos de um debate sobre a Conferência convocado pela publicação católica Espaço Laico, Fowler contrapôs essa “anemia” informativa com o processo equivalente a uma grande assembleia social que aconteceu a partir das discussões em bairros e locais de trabalho sobre as Diretrizes.
No mês passado, o segundo secretário do comitê central do PCC, José Ramón Machado Ventura, assegurou que, como resultado das consultas, 78 dos 96 objetivos propostos no documento base foram modificados, ao mesmo tempo em que outros cinco foram incorporados. O novo texto não foi divulgado. Em sua primeira e agora modificada versão, o projeto se refere a problemas de especial sensibilidade e silenciados por muito tempo, como o enfrentamento dos “preconceitos raciais, de gênero, crenças religiosas, orientação sexual e outros que podem originar qualquer forma de discriminação”.
Inclusive, comissões de trabalho prévio à Conferência colheram propostas concretas de solução para estes problemas. “Avançamos muito nos últimos cinco anos e caíram muitas barreiras que barravam determinados temas”, disse à IPS a psicóloga Sandra Álvarez, autora do blog Negra Cubana Tinha que Ser. Além disso, o texto propõe analisar e acordar ações para “enfrentar a violência de gênero e dentro da família e a que se manifesta nas comunidades”, bem como “fortalecer as ações dirigidas a prevenir e enfrentar as manifestações de indisciplina social, ilegalidades, corrupção e outros crimes”.
Entretanto, o traçado dos documentos de trabalho do sexto Congresso e da Conferência ficou abaixo das expectativas de alguns especialistas. “Ambos deveriam ter ingredientes sociais muito mais explícitos e fortes”, disse a socióloga Mayra Espina à IPS. Em sua opinião, nas Diretrizes faltou expressar como se cumprirá na prática uma plataforma de mudança social, algo que deveria ficar claro porque são os princípios da reforma. No entanto, o texto base da Conferência carece de um compromisso mais explícito com a igualdade social.
De maneira coincidente, o ano começou com a entrada em vigor, no dia 15, de uma disposição governamental concedendo subsídio estatal às pessoas de escassos recursos que necessitam reparar ou construir suas casas. A medida dá a largada do processo gradual de subsidiar pessoas e não produtos, como ocorria até agora. Envolverde/IPS