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Que paguem os trabalhadores

Atenas, Grécia, 23/1/2012 – Enquanto se agrava a crise de dívida soberana na zona do euro, o setor trabalhista na Grécia é cada vez mais sufocado por um plano de austeridade que não conseguiu nenhuma mudança positiva até agora. Enquanto o governo continua apertando o laço em torno do gasto público, sem ouvir os economistas que consideram ser esse um caminho equivocado para conter a crise, os trabalhadores gregos perdem pouco a pouco as poucas proteções que lhes restavam.

Agora, o governo planeja reduzir seus salários e suspender os aumentos prometidos no Convênio Coletivo Nacional para o próximo verão boreal, em um esforço para pagar a dívida pública de US$ 14,4 bilhões com os doadores internacionais até 20 de março. Sindicalistas e destacados economistas como Giannis Milios, professor da Escola Politécnica em Atenas, concordam que as medidas são uma “evidência do desejo das grandes empresas de desregular brutalmente o mercado de trabalho”.

Enquanto isso, espera-se que a Grécia complete uma negociação pelo perdão de parte de sua dívida e pela troca de bônus com investidores privados, enquanto implanta medidas acordadas em 2011 com a chamada troika – Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Comissão Europeia – para receber um novo pacote de ajuda financeira este ano. Sem este resgate, a Grécia não poderá pagar em março e, possivelmente, caia em um círculo vicioso de suspensão de pagamentos.

Maior defensor das reformas exigidas pela troika é o próprio primeiro-ministro, Loukas Papadimos, tecnocrata e ex-funcionário do Banco Central Europeu que assumiu o controle da coalizão de governo em novembro de 2011 e agora promove as reduções salariais. Contudo, numerosos analistas, incluindo especialistas da Organização Internacional do Trabalho, não creem que as reformas no mercado de trabalho garantam o sucesso do plano de ajustes estruturais.

A analista trabalhista Christina Kopsini disse à IPS que enquanto governo e setor privado forçam pelo caminho do perdão da dívida, os trabalhadores são os que sofrem a maior carga, obrigados a ceder mais de seus direitos e de sua magra renda. “Vale a pena notar que as únicas medidas de austeridade implantadas sem demora nos últimos dois anos se referem à desregulamentação do mercado de trabalho e à abolição de leis básicas que protegem os trabalhadores”, ressaltou.

Apesar dos maciços protestos contra essas medidas, o gabinete de Papadimos admitiu estar disposto a esquivar-se do parlamento para reduzir os salários. Também chantageou abertamente os sindicatos e as associações de empresários, ameaçando responsabilizá-los pela bancarrota do país se não cumprirem as reduções salariais, que definiu com “única forma de salvar a Grécia”.

A decisão de Papadimos de permanecer leal aos interesses corporativos em lugar de se colocar ao lado dos trabalhadores, já afetados pela crise, foi duramente criticada por partidos de esquerda no parlamento e pelos sindicatos. Estes consideram que o capital organizado aproveita a crise econômica para inclinar a balança do poder ainda mais a seu favor.

“Após dois anos de austeridade, que gerou desemprego acima dos 19%, fica mais óbvio que o objetivo estratégico do plano de ajuste estrutural não é a consolidação fiscal, mas a total desregulamentação do mercado de trabalho e uma severa desvalorização da força trabalhista”, disse à IPS o economista Savvas Robolis. “Os cortes são apenas outro passo para ganhar impulso para a completa abolição do salário mínimo no país, desejo secreto dos capitalistas”, destacou este professor da Universidade de Panteion de Atenas e diretor do Instituto do Trabalho.

“Devemos recordar que 2013 será um ano de reformas constitucionais, prevejo que durante este ano o artigo 22 (com disposições protegendo os convênios coletivos nacionais) será severamente atacado”, alertou Robolis. A ofensiva contra a última linha de defesa dos trabalhadores gregos começou em 2010, quando a ministra do Trabalho, Louka Katseli, introduziu mudanças legais nas negociações trabalhistas com as companhias privadas sob pressão da troika.

Segundo a Inspeção de Trabalho, 52 companhias na Grécia aproveitaram essas reformas legais para reduzir seus gastos em salários de 42% para 10%, afetando o salário de 17.531 funcionários. Giorgos Xatzinikolaou, empregado de uma importante empresa de seguros, contou à IPS que o medo do desemprego mantém grande parte dos trabalhadores em silêncio. “As pessoas se sentem sós. Os sindicatos não são confiáveis e são fracos, e a pessoa que trabalha se cala”, disse Giorgos, acrescentando que acabava de aceitar uma redução salarial de 20% em seu novo “contrato”. Lamentou que “quem sabe o que acontece aqui fora, simplesmente fecha a boca e assina”. Envolverde/IPS