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Índia e Paquistão em aproximação gastronômica

Puppy Agha, cozinheira paquistanesa do reality show Foodistão (o país da comida). Foto: NDTV

Carachi, Paquistão, 7/2/2012 – Se o coração de um homem pode ser conquistado pelo estômago, então, talvez, seja possível que a paz entre Índia e Paquistão se forje sobre os fogões, testemunhas de suas milenárias semelhanças culinárias. Quando a Poppy Agha, conhecida chefe de cozinha paquistanesa, foram servidos kebabs de okra (uma hortaliça rica em fibras) e biryani (arroz), seguidos de sobremesa, seu receio em relação à Índia se diluiu.

“Fui criada em uma família muito patriótica com os típicos estereótipos paquistaneses sobre a Índia. Estes sentimentos mudaram totalmente agora”, contou Agha à IPS, de Nova Délhi, onde participa de um reality show sobre cozinha ao qual o canal de televisão indiano NDTV Good Times deu o nome de “Foodistão” (algo como “o país da comida”). “Não é preciso pensar mal dos indianos para ser patriótico”, disse Agha, que tem um instituto de cozinha no Paquistão, onde cria deliciosos pratos aromáticos.

No Foodistão, chefes das duas nações arqui-inimigas da Ásia meridional se enfrentam em uma acirrada competição de “cozinha transfronteiriça”. A série de 26 capítulos conta com 16 chefes profissionais, oito de cada lado da fronteira, que mostram do que são capazes nas cozinhas “dos dois países culturalmente mais ricos e fascinantes da Ásia”.

“A cozinha pode ser uma enorme forjadora de amizades”, disse Pervez Hoodbhoy, médico e pacifista paquistanês. “Pode transcender as fronteiras impostas pelo ser humano”, acrescentou. É exatamente isto o que os produtores do programa esperam conseguir.

“Índia e Paquistão têm muitas paixões comuns como música, críquete, e uma comida fabulosa”, disse à IPS por email Smetta Chakrabarti, chefe da NDTV Lifestyle. “As fronteiras são apenas políticas, e a verdade é que, em grande parte, as pessoas dos dois países vivem e pensam de forma muito semelhante”, afirmou.

“Desejaria que as verdadeiras guerras terminassem”, afirmou Vir Sanghvi, um dos jurados indianos do programa. “Porém, até que possamos garantir isso, a melhor forma de promover a paz é nossa gente se relacionar em ambientes como o do Foodistão”, disse à IPS.

Foram três guerras entre Paquistão e Índia desde a independência de ambos do império britânico, em 1947, e a traumática divisão do território em dois países tendo por base suas religiões. Desde então, o vínculo foi como uma montanha russa, com momentos de entendimento salpicados por hostilidades provocadas pela soberania da região de Caxemira.

Diante de uma sala repleta de paquistaneses, o diplomata e político indiano Mani Shankar Aiyar, disse que os dois países têm a opção de continuar vivendo uma “hostilidade sem fim” ou de se comprometerem de forma proativa e prosperar. Da população dos dois países, 90% não cultiva rancores do passado, esclareceu. “A história pode ter nos dividido, mas a geografia nos une”, afirmou Aiyar, convidado pelo Instituto Jinnahm, com sede em Islamabad, para falar sobre “Índia e Paquistão: Retrospectiva e Perspectiva”.

A chefe Agha aprendeu na Índia a criar diferentes formas de pratos, mas ganhou muito mais em nível pessoal. “Conheci gente maravilhosa que considero amigas”, disse à IPS.

Para a defensora dos direitos humanos Zohra Yusuf, “todo tipo de contato, mesmo a alta competição”, contribui para melhor entendimento no longo prazo. “A paixão pode estar à flor da pele durante uma partida de críquete, por exemplo, mas os intercâmbios cara a cara ajudam muito a eliminar preconceitos sobre o outro”, declarou à IPS.

O contato pessoal parece abrir caminho, apesar dos obstáculos impostos pelas autoridades dos dois países, como negar visto, exigir que os visitantes se reportem à polícia e as restrições de viagens. A tenista indiana Sania Mirza poderia se casar com o jogador de críquete paquistanês Shoaib Malik e a dupla de tenistas Rohan Bopana, da Índia, e Aisam ul Haq Qureshi, do Paquistão, lançou o movimento “Stop War, Start Tennis” (Pare a Guerra, Comece o Tênis).

O Jang Group, uma empresa de comunicação do Paquistão, uniu-se ao jornal Times of India em uma campanha chamada “Aman ki Asha” (Esperança de Paz) que nos últimos dois anos promoveu sem trégua iniciativas com essa finalidade. O sucesso da campanha depende de um plano para começar do zero com a nova geração de indianos e paquistaneses para que seja assumida a responsabilidade de “apagar o peso da história”.

Seus jovens participantes estão perplexos por fatos como os US$ 250 milhões diários gastos para manter uma fronteira fechada com cerca elétrica, cheia de refletores e equipamentos de segurança. A Aman ki Asha não foi afetada pela amargura pública que se seguiu ao atentado de Mumbai, cometido em novembro de 2008 por um grupo de paquistaneses armados.

Se algo se conseguiu foi que as expressões de paz ganharam raízes. O reality show musical Chote Ustad (Pequeno Maestro) de 2010, do qual participaram jovens cantores e bailarinos dos dois países, foi um sucesso nos dois lados da fronteira. Rouhan Abbas, um dos ganhadores paquistaneses, ganhou uma medalha, um troféu, o dinheiro do prêmio e um monte de recordações. Ainda estranha a cordialidade gerada com os participantes indianos.

“A ideia de que a Índia era nossa inimiga se fixou em minha mente desde criança. Isso foi totalmente apagado pelo calor e carinho dos apresentadores indianos”, disse Abbas à IPS. Ultimamente, há um degelo nas relações na frente cultural, que bastou para, nas pesquisas, a Índia passar para terceiro lugar na lista de inimigos do Paquistão, atrás de Estados Unidos e Israel.

Programas como o Foodistão podem passar uma mensagem de irmandade, disse Chakrabarti. “Vemos os participantes dos dois países e não sabemos quem é de onde, a menos que digam. Pelas restrições de viagens e vistos, não sabemos muito da cultura e da cozinha do outro”, lamentou. Programas como o Foodistão contribuem para reduzir a distância. Envolverde/IPS