Estava me deslocando de carro com o rádio ligado em um programa de notícias locais. O entrevistado era o secretário municipal de Educação. A cada pergunta feita pelo experiente jornalista – que de poder entende tudo, vinha uma resposta redondinha.
A impressão que os ouvintes tinham, e também o próprio entrevistador, era de que a educação básica em Cuiabá estava entre as melhores do mundo. Não se faz educação de qualidade sem professores qualificados e motivados. Com alunos em espaços físicos inadequados, sem bibliotecas, laboratórios, áreas de lazer e alunos em tempo integral.
Para exercer a função de professor é necessário possuir curso superior e enfrentar um concurso público. Após ouvir maravilhas sobre esta educação pública desconhecida pela população de Cuiabá – não se esquecendo de que os filhos dos ricos e políticos frequentam escolas particulares –, veio a pergunta que todos os ouvintes gostariam de escutar: “quanto ganha um professor de ensino básico na rede pública municipal?”.
A resposta não foi tão rápida como aquelas em que o secretário afirmou que não tínhamos crianças fora da escola, que o número de creches estava sendo aumentado e que a educação infantil caminhava para a sua universalização. Após uns segundos, o secretário respondeu: “dentre as capitais brasileiras, Cuiabá é a segunda que melhor remunera os seus professores”.
Diante desta afirmação, o jornalista, e, claro, os ouvintes, quiseram saber o valor desses salários. “Em meio período (20 horas), o professor ganha cerca de R$ 1.360. Em dois turnos (40 horas), o dobro”, respondeu o secretário. Estava encerrada a entrevista.
Tenho uma faxineira que nem sei se tem instrução primária. Chegou à minha casa indicada por amigos por seus méritos pessoais. Trabalha seis horas por semana, com direito a auxílio transporte, café da manhã, lanche, almoço e banho no final do expediente.
Não lava ou passa roupas, não cozinha, apenas faz a manutenção semanal do meu apartamento. Pago com satisfação R$ 85,00 por visita. Em um rápido cálculo verifiquei que, trabalhando cinco dias por semana, seu salário líquido era superior ao de um professor da segunda capital do Brasil a melhor pagar seus educadores.
Os nossos administradores públicos têm a infeliz mania de tapar o Sol com a peneira. Se compararmos o salário que o mercado de trabalho oferece a outras categorias profissionais, veremos que o Brasil remunera muito mal seus professores. E o pior: parece que nossos dirigentes não têm consciência disto, ou têm?
No mínimo, eles deveriam reconhecer a nossa real situação educacional, qual seja: de baixíssima qualidade. Pesquisas recentes demonstram que é a estupidez de alguns países que os impede de investirem pesadamente na formação e profissionalização dos seus mestres e na educação das suas crianças.
Diante dessa visão caolha com relação à educação – e providencial para a sobrevivência de alguns grupos políticos – estaremos eternamente condenados a ser exportadores de alimentos e matéria-prima para os países que priorizaram a educação.
A boa educação passa, necessariamente, pelo bom professor.
Como somos um país rico, o projeto de lei mais importante que tramita no Congresso Nacional é aquele em que se dará o título de Heróis Nacionais aos jogadores titulares, e aos reservas, dos campeonatos mundiais de futebol de 1958, de 1962 e de 1970.
O texto prevê ainda um prêmio de R$ 100 mil para cada jogador titular e reserva, e um auxílio especial para a aposentadoria de heróis, como Pelé, Zagalo, Tostão, Rivelino, Leão e tantos outros atletas que tanto fizeram por eles, digo, pelo Brasil. Ser professor no Brasil é uma opção de vida quase sacerdotal. Heróis são os da mídia, como a Luiza, que voltou do Canadá.
* Gabriel Novis Neves é médico e ex-reitor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).
** Fonte: Diário de Cuiabá (MT).
*** Publicado originalmente no site Adital.