Arquivo

Intervir ou não intervir...

Washington, Estados Unidos, 24/2/2012 – Na véspera da reunião “amigos da Síria”, a ser realizada na Tunísia, cresce a polêmica quanto aos Estados Unidos fornecerem armas às forças da oposição nesse país do Oriente Médio. No final de semana, dois influentes senadores norte-americanos do opositor Partido Republicano pediram ao seu governo que dê mais apoio material, incluindo armas, aos rebeldes sírios em combate, em um esforço para derrubar o presidente Bashar Al Assad.

“Sou favorável ao fornecimento de armas à oposição”, afirmou durante uma visita ao Afeganistão o senador John McCain, que, por sua vez, acusou Rússia e Irã de armarem Assad. “As pessoas que estão sendo massacradas merecem o direito de se defender”, declarou McCain, lembrando que Washington poderia fornecer armas indiretamente por intermédio de “países do Terceiro Mundo” e da Liga Árabe.

Seu chamado foi apoiado pela senadora Lindsay Graham, que viajou com ele, bem como por uma carta aberta ao presidente Barack Obama redigida por dois grupos de direita pró-israelenses, a Iniciativa de Política Externa e a Fundação pela Defesa das Democracias, assinada por mais de 40 analistas e escritores, a maioria destacados neoconservadores.

“Devido aos interesses norte-americanos no Oriente Médio, bem como às consequências para os que buscam a liberdade em outras sociedades repressivas, é imperativo que os Estados Unidos e seus aliados não descartem nenhuma opção, incluindo a intervenção militar”, diz a carta. Muitos dos signatários defenderam em 2003 a invasão do Iraque e agora instigam Washington a se preparar para uma guerra com o Irã. Porém, destacas personalidades tanto dentro quanto fora do governo Obama tentam frear a crescente pressão para a intervenção, pois temem que a Síria se converta em um barril de pólvora regional.

Martin Dempsey, chefe do Estado Maior Conjunto, se colocou contra qualquer apoio manifesto ao movimento opositor a Bashar. “Creio ser prematuro tomar a decisão de armar o movimento de oposição na Síria, pois desafio qualquer um a identificar claramente o movimento opositor neste momento”, afirmou em entrevista à rede de notícias CNN. “Há vários atores, todos tentando reforçar sua posição particular neste tema. E até se ter tudo mais claro, se saiba quem são e o que são, penso que seria cedo para falar em armá-los”, opinou.

Em um informe publicado no dia 21 pelo independente Centro para uma Nova Segurança Norte-Americana, o pesquisador Marc Lynch reconheceu que a “intervenção militar permitiria aos norte-americanos sentir que estão fazendo algo”. Contudo, alertou que “lançar ainda mais violência sem uma perspectiva realista de mudar o comportamento do regime ou melhorar a segurança não é nem sábio nem justo”.

Lynch, especialista em Oriente Médio para a Universidade George Washington e consultado frequentemente pela Casa Branca, disse que os Estados Unidos deveriam “se concentrar em uma campanha de pressão sustentada e dirigida contra o regime de Assad, para levar à mesa de negociações componentes importantes do governo para delinear uma saída política”.

Seu informe de 13 páginas chama, em particular, Washington a denunciar Assad no Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, caso se negue a renunciar, e endurecer as sanções econômicas contra indivíduos específicos do regime, bem como ajudar a oposição a desenvolver uma “voz política unificada”. Apesar das numerosas tentativas de unir a oposição em um só movimento, permanecem significativas brechas entre vários setores.

Mesmo o Conselho Nacional Sírio, geralmente considerado pelo Ocidente e pela Liga Árabe representante oficial da oposição, sofreu rachas sobre a questão de uma eventual intervenção estrangeira. Algumas figuras opositoras, como Radwan Ziadeh, radicado em Washington, pedem uma intervenção militar direta, e outros, como o presidente do Conselho, Burhan Ghalyoun, preferem que as forças estrangeiras tenham um papel secundário e de apoio. Os que se opõem a todo tipo de intervenção se aglutinaram no Comitê de Coordenação Nacional, liderado por Haytham Al-Manna, que mantém independência formal do Conselho.

Talvez em resposta à natureza fraturada da oposição, e por medo de que se repita o ocorrido na Líbia, onde ainda há fatos de violência por parte de grupos armados pelos Estados Unidos, funcionários em Washington se mostram reticentes a uma intervenção. Enquanto isso, informes sobre crescente presença da rede extremista islâmica Al Qaeda na Mesopotâmia despertam novas e complexas dúvidas quanto a uma intervenção na Síria servir para dissuadir essa expansão ou, pelo contrário, fomentá-la. Os atentados em Damasco e na cidade síria de Alepo no começo deste ano podem ter sido obra da Al Qaeda, segundo o diretor de Inteligência Nacional dos Estados Unidos, James Clapper.

Em um declaração, a porta-voz do Departamento de Estado, Victoria Nuland, destacou que “nossa posição não mudou fundamentalmente. Acreditamos que uma solução política é a melhor saída, e é o que a Síria precisa”. Acrescentou que, “se Assad considerar a postura da comunidade internacional ou responder à pressão que estamos tentando exercer, ainda temos possibilidades de conseguir o tipo de cenário de transição que a Liga Árabe desenhou e que muitos grupos sírios apoiam”.

A reunião “Amigos da Síria” acontece hoje, embora China e Rússia não tenham aceitado o convite após terem vetado uma resolução do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) condenando o regime de Assad.  Seguramente, o encontro estabelecerá os parâmetros para a participação internacional na Síria. Com ou sem o expresso apoio de Washington, parece provável que os movimentos opositores sírios receberão importante assistência militar e logística de uma variedade de atores governamentais e não governamentais. Embora, quando o número de mortos na Síria já supera os seis mil, pareça difícil que a situação seja resolvida no curto prazo. Envolverde/IPS.

* O blog de Jim Lobe sobre política externa está em www.lobelog.com.