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A internacionalização da Praça Tahrir

Cairo, Egito, 9/4/2012 – Na última semana de julho de 2011 a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou uma reunião de alto nível como parte do encerramento do Ano Internacional da Juventude. Esse foi, sem dúvida, um ano histórico que presenciou a mobilização maciça e a liderança dos jovens no mundo árabe.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, citou Mohammad Bouazizi – o vendedor ambulante cuja imolação deu lugar à revolução na Tunísia – como exemplo de um jovem que, no começo de 2011, desatou a queda de dois ditadores de longa data: o de seu país e o do Egito.

Eu me preparava para intervir na Reunião de Alto Nível sobre a Juventude, na Assembleia Geral, quando muitas ideias me vieram à mente. De fato, muitas palavras e frases: 2011, juventude internacional, Primavera Árabe, Praça Tahrir, entre outras. Também ouvi muitas intervenções de delegações oficiais perante a ONU, de jovens e da sociedade civil, entre outras.

Me perguntava por que estávamos ali, naquela enorme sala da Assembleia Geral da ONU. O que significava estar ali com todos esses rostos, representações e experiências, como podíamos sair dali com algo concreto. Recordei os dias e as noites que passamos na Praça Tharir, no centro do Cairo. Os valores que os egípcios puseram em comum em um lugar – compartilhando espaço, pensamentos, ideias, alimentos, entre muitas outras coisas – foram únicos.

Jovens egípcios de todos os grupos sociais, contextos, educação, formas e tamanhos, se reuniram na Praça Tharir pela primeira vez, unidos como se fossem um só. Foi como uma utopia onde os seres humanos se uniram com base em seus valores humanos, esquecendo suas diferenças e trabalhando juntos pelo bem comum. Foi a especificidade do tempo e o lugar que fez esses homens e mulheres se conectarem com os valores humanos da coexistência.

Essa fortaleza tão idealista deu forma a uma revolta contra a ditadura e fez entrar em colapso Hosni Mubarak (1981-2011), titular do regime egípcio, em 18 dias. Também gerou uma referência para as demandas da revolução egípcia, que até agora moldam a pressão social sobre o governo de transição. Também proporcionou um novo rosto para o Egito que o mundo inteiro estava admirando.

Os jovens do resto das nações árabes receberam um forte impulso para liderar suas próprias revoltas e reclamar liberdade e democracia à sua própria maneira. Embora não sendo tão pacíficos como na Praça Tahrir, estes jovens ainda são poderosos, consistentes e comprometidos em conseguir uma mudança em suas sociedades.

A Praça Tharir não foi apenas um lugar de revolução e mudança, foi também um lugar de consenso, solidariedade e coexistência, onde os egípcios de todos os níveis socioeconômicos, culturais e religiosos compartilharam tudo lado a lado, desde o riso e a pena até o pão e os medicamentos. Viveram juntos e se protegeram entre si, a tal ponto que surgiram novos nomes, como “República da Praça Tahrir” e “Sistema Moral de Tahrir”.

Na Assembleia da ONU tive o mesmo sentimento de unidade como o que dominou a Praça Tahrir. Éramos um grupo muito diverso de pessoas e organizações sob um mesmo teto, debatendo questões juvenis em uma Reunião de Alto Nível. Aquela variedade foi única, representativa e poderosa. Foi como a variedade de pessoas que havia na Praça Tahrir, e me perguntei: poderemos ter um diálogo semelhante e conseguir avanços reais na realidade da juventude?

Sempre dissemos que necessitamos da sabedoria dos idosos e da energia e do entusiasmo dos jovens. O mesmo se aplica hoje às organizações internacionais, aos governos e à sociedade civil. A juventude necessita dessa sabedoria, desse poder, desse conhecimento e dessa experiência. Assim poderemos nos completar um ao outro. Este é o valor da Praça Tahrir, que vejo como uma necessidade que se internacionalize.

A Reunião de Alto Nível sobre Juventude que aconteceu na Assembleia Geral da ONU foi apenas um exemplo simbólico disto. Tahrir foi apenas um espaço físico no coração de uma das maiores cidades da África, do Oriente Médio e do mundo em desenvolvimento, que mudou até a maneira como os jovens manifestavam suas necessidades, de modo diferente e pacífico.

É isto que o mundo deveria tirar como lição de Tahrir. De fato, os jovens de Tahrir tiveram um papel importante no mundo pelo bem da humanidade. Envolverde/IPS

* Karim Kasim é assessor e pesquisador de temas juvenis no Egito. Foi um participante ativo nas revoltas juvenis durante a Primavera Árabe nesse país.

©2012 Global Experts, um projeto da Aliança de Civilizações das Nações Unidas.