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Líbia não empreende o caminho islâmico

Muçulmanos rezam em Trípoli. Foto: Karlos Zurutuza/IPS

 

Trípoli, Líbia, 11/7/2012 – Os líbios parecem acreditar que a secular Aliança de Forças Nacionais (AFN), de Mahmoud Jibril, conseguirá formar uma coalizão e construir pontos entre as diferentes milícias. A opção islâmica teria ficado de lado. Muitos acreditam que esta aliança também poderia aproximar outros partidos políticos ideologicamente opostos, e reduzir as diferenças entre ex-partidários e opositores ao antigo regime de Muammar Gadafi (1969-2011).

Segundo os resultados preliminares, a AFN, coalizão de 40 grupos, ficou com a vitória nas eleições parlamentares dos dias 7 e 8, as primeiras eleições democráticas realizadas neste país em 50 anos. No total, 130 partidos políticos e 2.500 candidatos individuais participaram da histórica votação. Das 200 cadeiras do Congresso, 80 estão reservadas a representantes dos diferentes partidos, e as 120 restantes a cidadãos que se candidataram de forma independente.

A vitória da força política de Jibril, ex-primeiro-ministro do Conselho Nacional de Transição, marcou uma distinção da Líbia em relação a outros países do Norte da África, onde a Primavera Árabe habilitou o caminho para forças políticas islâmicas. A AFN teria superado nas urnas o Partido da Justiça e da Reconciliação, da Irmandade Muçulmana, na qual muitos analistas haviam depositado suas fichas, bem como o também muçulmano partido Al Watan. Entretanto, apesar do resultado positivo para a AFN, as forças islâmicas ainda podem ganhar terreno quando forem contadas nos próximos dias as 120 cadeiras destinadas aos independentes.

Jibril aproximou-se de seus oponentes e chamou por uma coalizão nacional. Apesar de o grande mufti (jurisconsulto muçulmano) Sadkik Al Ghariani ter emitido uma “fatwa” (decreto religioso) contra a AFN, bem como outra alertando os líbios sobre votar em seculares, o Partido da Justiça e da Reconciliação estaria considerando a oferta de Jibril, que parece contar com o respeito tanto de antigos partidários de Gadafi como daqueles que lutaram contra o governante. “Jibril é bem educado e tem experiência internacional. É o melhor homem para liderar a Líbia neste momento”, afirmou à IPS o professor Majdi Shatawi, de 29 anos, ex-simpatizante de Gadafi e que acredita que a revolução foi um erro.

Na outra ponta do espectro político, Khaled Hamsha, um policial de 21 anos que usa muletas após ter recebido um tiro em uma perna ao lutar contra Gadafi, também acredita que a AFN é a melhor opção. “Jibril é um homem de negócios inteligente. É honesto e tem experiência política. Deu grande parte de seu próprio dinheiro aos revolucionários para ajudar a derrubar Gadafi, ainda que tenha sido parte de seu governo”, argumentou Hamsha. Jibril formou-se em economia e ciências políticas na Universidade do Cairo em 1975, obteve o mestrado em 1980 e doutorado em 1985 na norte-americana Universidade de Pittsburgh, onde ensinou planejamento estratégico durante vários anos.

Desde 2007 e até começo de 2011, integrou o governo de Gadafi como presidente do Conselho de Planejamento Nacional e da Junta Nacional de Desenvolvimento Econômico, mas passou para o lado rebelde durante a guerra civil e foi designado primeiro-ministro do Conselho Nacional de Transição. Para alguns, seu passado o converte no candidato ideal para unir pontes entre os grupos da sangrenta revolução, mas outros o consideram um oportunista.

Alguns informes da imprensa local dizem que ex-membros do grupo rebelde planejam realizar reuniões por toda a Líbia em protesto contra Jibril, a quem acusam de “roubar sua revolução”. O ex-combatente rebelde Suheil al Lagi contou à IPS que muitos dos antigos militantes da revolução não estavam satisfeitos com Jibril nem com o Conselho Nacional de Transição. “Demos nossas vidas e nosso sangue para sermos governados pelos líderes corruptos e ambiciosos que temos agora. Se as coisas continuarem assim, seremos obrigados a pegar em armas outra vez”, alertou Lagi.

Os ex-combatentes acusam o governo de nepotismo e de reservar postos diplomáticos e públicos para colaboradores. Jibril também tem a oposição de federalistas que desejam maior autonomia do Leste do país. Os federalistas estão por trás de uma onda de violentos ataques contra escritórios e propriedades do governo ocorrida nas últimas semanas. Um helicóptero foi derrubado, escritórios eleitorais incendiados e vários poços de petróleo incendiados. As forças de segurança líbias têm pouco poder diante das milícias, que ainda controlam várias partes do país, possuem mais armas e se movem mais rapidamente. Envolverde/IPS