Construção colaborativa de cidades melhores – Entrevista com Rodrigo Bandeira

Sociedade civil, governo e terceiro setor, conversando para construir propostas que melhorem as cidades. Este é o ambiente da plataforma digital do projeto Cidade Democrática.

“Queremos que a sociedade ajude a construir o seu próprio futuro de forma colaborativa.” Assim definiu Rodrigo Bandeira, ao falar dos objetivos do projeto Cidade Democrática. Bandeira é diretor da Enzima, organização responsável pela iniciativa, que busca a interação da sociedade civil, governo e terceiro setor, em prol da construção de propostas por cidades melhores.

Criado em 2009, o projeto tem como principal eixo um portal na internet, onde os usuários criam perfis e divulgam ideias sobre o que esperam das cidades onde vivem. Os internautas podem apontar problemas, sugerir soluções ou manifestar suas opiniões. Os demais usuários conseguem comentar e dessa interação surgem as propostas. Destas conversas já surgiram projetos e leis que hoje vigoram.

Saiba mais sobre o projeto nesta entrevista concedida por Bandeira à jornalista da Envolverde, Alice Marcondes. Confira a íntegra da conversa.

Como funciona e quais os objetivos do Cidade Democrática?

O Cidade Democrática é um conjunto de iniciativas que tem como principal ponto uma plataforma virtual, onde as pessoas podem divulgar suas propostas para melhorar a sociedade. Com a divulgação, elas podem obter apoios, conhecer outras pessoas que estão pensando nas mesmas coisas e dessa forma construir maneiras de tirar as ideias do papel.

A ideia é ser um ambiente onde tanto a sociedade civil, quanto o governo e o terceiro setor buscam informação e se conectam?

Exatamente. O objetivo é que as pessoas se apropriem do espaço. Que a população saiba que lá é um lugar onde elas podem dizer o que esperam e expor suas ideias, e que o governo saiba que pode ir lá e buscar sugestões e saber o que a sociedade quer. Não importa se o político está fazendo ou não, o que importa é que a população diga aquilo que espera que seja feito. Para isso, o site tem uma divisão geográfica. A pessoa entra e seleciona uma cidade, ai ela vê tudo que está sendo dito sobre aquela cidade.

No período que o site está no ar, vocês já têm experiências de ideias que saíram do papel e se tornaram projetos efetivos?

Temos alguns casos, principalmente nas cidades de Jundiaí e Várzea Paulista, ambas no interior de São Paulo. Em Várzea Paulista uma série de organizações e pessoas, principalmente ligadas às questões da juventude, se encontraram e elaboraram uma agenda para influenciar os planos da prefeitura a longo prazo, dizendo o que a cidade poderá ser em 2022, que é o bicentenário da nossa República. Eles conseguiram colocar várias questões que estão sendo incorporadas pela prefeitura, que topou o desafio desde o começo.

Você acredita que é mais fácil esses projetos se desenvolverem em cidades em que o governo já tem uma afinidade com os assuntos sociais?

Isso é muito valioso, mas não essencial. Jundiaí, por exemplo, é uma cidade considerada modelo em práticas de sustentabilidade, mas os projetos que se desenvolveram lá não partiram do governo e sim por iniciativa de ongs. A prefeitura tinha a percepção de que tudo estava indo bem, mas a sociedade disse que podia ser melhor. A partir dos debates na plataforma do Cidade Democrática, foram criadas sete propostas, que foram levadas para a Câmara dos Vereadores. Hoje essas propostas se tornaram leis já foram implementadas. Isso modificou a forma pela qual as coisas acontecem em Jundiaí.

Você sabe citar alguma dessas leis?

Por exemplo, a mudança de horário das sessões abertas para participação da população. Algumas sessões na Câmara são livres para as pessoas ouvirem e saberem o que os vereadores estão fazendo, e outras não. As sessões abertas aconteciam no meio da tarde e os trabalhadores dificilmente conseguiam comparecer. A população pediu que o horário fosse mudado para a noite e isso aconteceu. Outra coisa foi o voto do veto do prefeito. Quando um prefeito veta uma lei, esse veto volta para ser votado na Câmara. Essa votação dos vereadores era a única em Jundiaí que acontecia de maneira secreta. Isso mudou e agora o voto é aberto. A partir dessas sete propostas foi também construída uma ciclovia e destinados outros R$ 200 mil para a construção de ciclovias e criação de ciclofaixas. Foi aprovado um plano municipal cicloviário em Jundiaí.

É possível traçar um perfil das pessoas que participam do Cidade Democrática?

São pessoas, no geral, mais jovens, que usam bem a internet, conseguem interagir e entendem que a ação na internet constrói realidades. Normalmente, as pessoas mais velhas usam a internet mais para ler e se informar. O cidadão que está dentro da plataforma não é necessariamente ligado a ongs, temos mais pessoas relacionadas ao setor público, mas o cidadão comum também está lá, desde donas de casa até adolescentes. São cidadãos mais conscientes de que a construção de uma sociedade se dá a partir da sua atuação. Não são pessoas passivas.

Quais são os próximos passos do Cidade Democrática?

Vamos conectar a plataforma nas redes sociais e assim pretendemos atrair mais pessoas. E queremos desenvolver aplicativos para celular. Temos também a ideia de ter mais interação com as câmaras de vereadores dos municípios e permitir que a população possa avaliar os políticos. Que a sociedade possa dizer: “eu votei em você, e como eu sou um cidadão que concedi a você poder, como eu sou o pagador de impostos, então eu espero que você faça isso. Este é o meu interesse”. Queremos que a sociedade ajude a construir o seu próprio futuro de forma colaborativa. (Envolverde)