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Homens e mulheres cultivam juntos para erradicar a fome

Beatrice Mueni Mutisya inspeciona seu milho, cultivado no semiárido oriente do Quênia. Foto: Isaiah Esipisu/IPS

 

Nairóbi, Quênia, 6/9/2012 – Há três anos os habitantes do semiárido distrito de Yatta, na Província Oriental do Quênia, viviam da assistência alimentar, porque as escassas chuvas impediam que suas plantações de milho prosperassem. Até que homens e mulheres uniram esforços. Atualmente, em uma noite de sábado na aldeia de Makutano, nesse distrito, Stephen Mwangangi, sua mulher Margaret e seus dois filhos recolhem pimentões com o objetivo de exportá-los para a Europa.

“Em média, minha família ganha US$ 250 a cada duas semanas. Isto é muito melhor do que ganham muitas pessoas empregadas em Nairóbi”, contou Mwangangi à IPS. Sua família é uma das cerca de duas mil que integram um projeto chamado Operação Fora Mwolio. Esta palavra significa “assistência alimentar” no idioma local kamba. O projeto começou depois que o bispo Titus Masika, dos ministérios locais Christian Mission Impact, viu na televisão como mulheres da região obrigavam suas filhas a vender sexo em troca de comida ou dinheiro.

“Essa reportagem me perturbou. Isto me levou a convocar uma reunião de todos os especialistas em agricultura e mercado nascidos em Yatta aos quais tive acesso. A maioria deles estava trabalhando em outras partes do país. Nos sentamos com os moradores de Yatta para identificar a principal causa do problema e encontrar a solução”, detalhou Masika à IPS. O que precisavam era de um emprego sustentável que os tirasse da pobreza. “Ao levar para o campo os conselhos dos especialistas e usar o conhecimento tradicional dos moradores, erradicamos com sucesso a Mwolio. Mas isto não seria possível sem a participação de todos os membros da família em todas as etapas”, explicou.

Os produtores locais foram instruídos sobre diferentes técnicas para realizar sua atividade, entre elas o uso de “hoyos zai” (buracos que são enchidos com adubo e em cima do qual se cultiva), irrigação com água de chuva armazenada em pequenas represas feitas de terra (bateias de água) e plantar produtos tolerantes à seca. Por meio de seminários, painéis de capacitação e dias passados nas plantações de aldeias locais, Masika e outros especialistas agrícolas de Yatta se propuseram a convencer os homens a se unir ao projeto. Estes entraram com o trabalho duro para cavar as bateias de água, mas também ajudaram as mulheres a terem acesso a equipamento que, geralmente, é propriedade deles.

Atualmente, os camponeses de Yatta cultivam seus produtos de alto valor, incluídos os pimentões, e em conjunto os embalam e exportam para a Europa. Seu pagamento depende da quantidade de vegetais que entregam. Masika disse que o sucesso do projeto se deve à participação de todas as famílias, e não apenas ao fato de as mulheres terem buscado maneiras de manter suas famílias. “Quando começamos, há três anos, tínhamos apenas 60 mulheres participantes”, contou. Agora, quem quer entrar para o projeto só pode fazê-lo se todos os membros de sua família também entrarem. Masika disse que “trabalhar juntos como grupos de famílias fez milagres nos últimos dois anos”, e explicou que, “como famílias, habitualmente pensamos juntos, identificamos os desafios dominantes e elaboramos estratégias sobre como abordá-los como equipe”.

Segundo cientistas da Iniciativa Sueca sobre uma Rede Agrícola Internacional, na África subsaariana, quando homens e mulheres trabalham juntos por um objetivo comum, aumenta a produtividade. Um livro que será publicado em breve por essa entidade, intitulado Transformando as Relações de Gênero na Agricultura da África Subsaariana: Enfoques Promissores, destaca metodologias inovadoras na produção em pequena escala que melhoraram as relações de gênero.

A obra destaca que, quando mulheres e homens cooperam, ajudam para uma produção de alimentos maior, segurança alimentar e nutrição, cadeias de valor mais fortes e melhor uso dos recursos naturais. “Isto significa que temos de melhorar as posições das mulheres nas comunidades, para que tenham acesso igualitário à terra, às ferramentas e aos insumos (como fertilizantes), às oportunidades de capacitação e ao mercado”, afirmou à IPS uma das autoras do livro, Marion S. Davis, do Instituto de Meio Ambiente de Estocolmo.

Para Cathy Farnworth, outra autora, a transformação “também depende em boa parte de homens e mulheres trabalharem juntos em todos os níveis, particularmente na hora de adotar tecnologias e integrá-las às cadeias de valor do mercado”.

Melinda Fones Sundell, também coautora e pesquisadora do Instituto de Meio Ambiente de Estocolmo, disse à IPS que, apesar de as mulheres terem um papel fundamental na produção agrícola, em muitos casos não desempenham papéis correlativos na tomada de decisões referentes à produção e ao mercado. “São produtoras eficientes com o que têm, mas, em geral, produzem menos do que os homens por causa de seu limitado acesso a terra, crédito e a outros insumos”, acrescentou.

É ilustrativo o caso de Janice Wanyama, uma dona de casa do condado de Bungoma. “Tenho apenas um terreno dentro de nosso complexo, onde planto verduras que alimentam toda a família o ano inteiro. Mas a parte comercial da terra, o trator usado e outros importantes equipamentos agrícolas são controlados por meu marido. De todo modo, também tenho que encontrar tempo para trabalhar na terra com fins comerciais”, explicou à IPS. Envolverde/IPS