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Hortas senegalesas expostas ao vírus da especulação

Pessoas participam de uma oficina de agrofloresta no Senegal. Foto: Flickr Creative Commons

Dacar, Senegal, 12/9/2012 – A especulação comercial ameaça o bom desempenho produtivo de milhares de camponeses senegaleses que cultivam frutas e verduras nos Niayes, uma faixa de terra fértil que se estende ao longo da costa ocidental do país. “Este ano vendemos cem toneladas de manga, tanto para o mercado interno quanto para o externo”, disse Ibrahima Mbengue, presidente da Federação de Cultivadores de Vegetais dos Niayes (FPMN), vigiando os jovens trabalhadores que pesavam centenas de cestas carregadas com essa fruta.

A FPM, criada em 1994, tem agora 2,25 mil membros, que no ano passado cultivaram seis mil hectares na zona, uma faixa de lagos e pântanos, os “niayes” que dão nome à região. “Os agricultores dos Niayes estão fazendo muito dinheiro, milhares de milhões” de francos CFA, disse Abdoulaye Barry, jornalista radicado em Dacar e especializado em agricultura. “Há muitos estrangeiros, especialmente da Guiné, que trabalham nas plantações daqui. A população construiu moradias permanentes com a renda obtida com as verduras”, destacou.

A produção da região passou de 78 mil toneladas em 2009 para 261 mil toneladas no ano passado, segundo dados do Instituto Nacional de Estatísticas Demográficas, publicados em agosto no jornal estatal Le Soleil. Este aumento é consequência da expansão da área de cultivo, que passou de cinco mil hectares em 2009 para 8,7 mil em 2011, segundo o Instituto. Estimativas dessa entidade indicam que a renda total dos produtores é de US$ 430 milhões. As 750 mil toneladas de frutas e verduras produzidas aqui em 2011 representaram mais de 40% do total do país. Cebola, tomate e couve foram os cultivos mais importantes, e em conjunto representaram dois terços do volume produzido.

Apesar deste forte aumento, Mbengue se queixa da falta de apoio governamental na área técnica. Ano após ano, a produção cresce, mas os agricultores não conseguem competir no mercado internacional, afirmou. “A produção excede em muito a demanda interna, e o produto é perecível. Às vezes, alguns produtores vendem a perda, já que não têm acesso ao mercado internacional”, disse à IPS. Barry concorda, dizendo que estes produtores “não estão em posição de competir no mercado internacional. As cadeias de valor não estão bem organizadas. É escassa a organização de transporte, embalagem e comercialização do produto”.

Segundo Sidy Guèye, coordenador da FPMN no distrito rural de Sangalkam, “frequentemente há uma excessiva oferta no mercado interno, o que prejudica os preços”. As cebolas, por exemplo, às vezes são vendidas a preços irrisórios, a 20 ou 35 centavos o quilo, enquanto em outros tempos o preço podia chegar até aos 80 centavos no mercado local, apontou Madiagne Dièye, comerciante de Dacar. Os produtores colhem três ou quatro cultivos a cada ano, principalmente trabalhando em terras familiares de até cinco hectares, enquanto algumas associações de agricultores têm operações que cobrem várias centenas de hectares, segundo Guèye.

“Do ponto de vista financeiro, as pessoas daqui estão bem. Em outras partes do país vive-se em condições precárias”, explicou Guèye à IPS, referindo-se ao valor de cultivar verduras em Sangalkam. “Nos Niayes, entre 90% e 95% dos agricultores herdaram sua terra. Outros adquiriram a sua graças à boa vontade das autoridades agrárias competentes”, destalhou. A horticultura é tão importante para a economia senegalesa que o governo a integrou à sua estratégia de crescimento acelerado da agricultura e das agroindústrias, um plano multianual que implanta junto com o setor privado.

No entanto, por estar tão perto da capital, a região dos Niayes é alvo de intensa especulação agrária. Os poderosos “compram terras dos produtores, e não as usam”, disse Woré Gana Seck, da organização não governamental Green Senegal. É preciso manter o ativismo contra esta forma de apropriação de terras, afirmou à IPS. Barry acredita que o governo deveria preservar os Niayes exclusivamente para os horticultores, e designar para o desenvolvimento residencial outro espaço em áreas menos adequadas para plantar. Envolverde/IPS