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Refugiados marfinenses lotam a Libéria

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Cada vez mais marfinenses se mudam para comunidades liberianas fronteiriças.
Butuo, Libéria, 6/4/2011 – O quintal da casa de Peter Saye na Libéria está cheio de crianças, panelas e todo tipo de objetos pessoais. As mulheres carregam lenha e carvão, e tentam pentear as crianças que perambulam no pó. Na área há cerca de cem refugiados devido à violência na vizinha Costa do Marfim. As forças que apoiam Alassane Ouattara, internacionalmente reconhecido vencedor das eleições presidenciais de novembro de 2010, rapidamente avançaram para o Norte do país e ontem deram por ganha a batalha.

Seu recente avanço para cercar a capital, Abdijan, último reduto do presidente Laurent Gbagbo, que resiste em entregar o cargo, fez dispara o número de pessoas que buscam refúgio na Libéria. Os povoados liberianos na fronteira estão lotados e a ajuda chega lentamente. A atenção internacional se voltou para outras crises no mundo, e uma série de contratempos, atrasos e obstáculos logísticos criaram um círculo vicioso que agrava a crise humanitária. No Condado de Nimba, a grande parte dos mais de cem mil refugiados marfinenses está espalhada em quase cem comunidades.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) explicou que distribuirá alimentos somente para os que se transferirem para os centros de abrigo criados especialmente ou para um acampamento principal a 60 quilômetros do Condado. Porém, muitos preferem ficar perto da fronteira onde podem buscar familiares perdidos e obter alguns alimentos tradicionais, como arroz e mandioca, em lugar de viajar longas horas em um caminhão de carga para chegar a um acampamento onde receberão uma dieta de trigo bulgur.

“Gostaria de ir para ao acampamento de Bahn, exceto pela distribuição de trigo bulgur”, disse Sayeh Gayegbaye, porta-voz dos refugiados em Butuo. Os refugiados continuarão na fronteira enquanto encontrarem comida nos arredores, afirmou. O trigo bulgur é desprezado na cultura local, mas é comumente distribuído pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA) na região. A queixa é quase universal: causa diarreia.

Funcionários do PMA asseguram estar conscientes da preocupação dos refugiados e tentam fornecer outros alimentos. Mas vai demorar, disse o vice-diretor dessa agência da Organização das Nações Unidas na Libéria, Jerry Bailey. “Temos problemas de tempo e transporte. Estamos tentando obter arroz de países vizinhos. Se não conseguirmos, continuaremos com o trigo bulgur”.

A agência luta com uma situação imprecisa, particularmente em Nimba, onde os refugiados estão espalhados em uma vasta área, em sua maior parte acessível apenas por estrada, e se movimentam de um lado para outro da fronteira. Manter as rotas e as pontes livres será extremamente difícil quando começar a temporada de chuvas este mês. Algumas das comunidades onde os refugiados se abrigam ficarão praticamente isoladas durante meses.

A fronteira é extremamente porosa, e há informes de movimentos mercenários ao longo dela. Os combates, muitas vezes, são ouvidos da Libéria. O porta-voz do Acnur, Sulaiman Momodu, afirmou que os refugiados são obrigados a se movimentar para sua segurança e para conseguir comida. “Estamos em uma emergência. Tentamos estabilizar as coisas e chegar à situação na qual seja possível montar os acampamentos. Mas as pessoas precisam se movimentar”, acrescentou.

Enquanto os combates na Costa do Marfim mudam para o Sul, também o faz a crise na Libéria. Mais de 24 mil refugiados entraram no Condado de Grand Gedeh, ao Sul de Nimba, mas não há infraestrutura para recebê-los. O Acnur solicitou US$ 55 milhões para atender 50 mil marfinenses em janeiro. No entanto, na Libéria há hoje mais que o dobro de refugiados. A agência necessitaria de mais de US$ 132 milhões, mas até agora só recebeu US$ 17,5 milhões. “Precisamos de dinheiro, e até agora não conseguimos o suficiente. Ainda há um déficit”, disse Momodu.

Peter Saye é um dos milhares de liberianos cujas provisões de comida, que esperava administrar até a próxima colheita, dentro de seis meses, diminuíram pela presença dos refugiados, aos quais tem ajudado. A marfinense Mezouw Pellagie está bem perto de Saye, e não quer ir para um acampamento. “Ele realmente cuida da gente”, afirmou. Envolverde/IPS