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Violações na Índia desatam debate sobre pena de morte

Mulheres indianas sentem-se inseguras e temem ser abusadas sexualmente. Foto: Reprodução/Internet

Nova Délhi, Índia, 22/1/2013 – Os maciços protestos e as promessas de líderes políticos não bastam para deter a violência sexual na Índia, onde o clamor popular por justiça se transforma, pouco a pouco, em um chamado em favor da pena de morte. Na fria noite do dia 16, exatamente um mês depois que uma jovem foi violentada em grupo e torturada em um ônibus em Nova Délhi, centenas de pessoas se reuniram com velas nas mãos na capital indiana para expressar sua indignação pelo ocorrido.

Uniram-se para recordar a vítima que, 13 dias após ser atacada, morreu em um hospital de Cingapura devido aos ferimentos internos causados pelos agressores. O caso provocou indignação neste país de 1,2 bilhão de habitantes que há tempos sofre uma epidemia de violência sexual. A raiva era visível nas pessoas reunidas na semana passada em um lugar que representa um ícone para os moradores de Nova Délhi, o histórico centro astronômico de Jantar Mantar. Ali homenagearam Jyoti Singh Pandey, estudante de medicina de 23 anos, que agora é lembrada como “Coração valente” ou “A filha da Índia”.

Mas os protestos e os insistentes chamados para que seja feita justiça não são suficientes para frear a violência. Uma série de violações em grupo, incluindo algumas também dentro de ônibus, foi denunciada em todo o país nas últimas semanas. A brutalidade desses ataques é quase diretamente proporcional à paixão dos protestos, afirmam ativistas e especialistas. Diante disto, as multidões deixaram de exigir justiça e agora exigem diretamente a morte dos responsáveis: o cartaz “Queremos justiça”, o mais usado nas manifestações, foi substituído pelo “Forca para os violadores”.

Após a explosão dos protestos de rua e as trocas de opiniões nas redes sociais na internet, o foco do debate agora é se a aplicação da pena de morte pode acabar com os horríveis ataques contra as mulheres, ou ao menos reduzi-los. A polêmica parece surgir de um forte sentimento de frustração. No mês passado, as autoridades indianas se esforçaram para tranquilizar os manifestantes com promessas de emendas legais e um fortalecimento da segurança para as mulheres. Contudo, mesmo com os duros discursos políticos e maior presença policial nas ruas, os ataques continuaram.

No começo deste mês, uma mulher sofreu violação em grupo dentro de um ônibus no Estado de Punjab, enquanto no Estado de Rajasthan uma jovem se suicidou depois que a polícia a ameaçou por ter apresentado uma denúncia de ataque sexual. No Estado de Goa uma garota de sete anos foi violada no banheiro de uma escola. Estes casos obrigaram os políticos e os cidadãos em geral a enfrentarem as limitações de seu sistema judicial.

A ministra de Desenvolvimento das Mulheres e da Infância, Krishna Tirath, afirmou que é preciso mudar as leis para contemplar a pena de morte como castigo para os casos mais brutais de violação. A líder da oposição no parlamento, Sushma Swaraj, do nacionalista e hindu Partido Bharatiya Janata, também defendeu a aplicação da pena capital. Estes chamados do setor político encontraram apoio entre muitos cidadãos indignados pelo crescente número de ataques.

Em uma pesquisa feita nas últimas semanas, 100% das mulheres entrevistadas disseram que o maior problema que o país enfrenta é resolver o problema da insegurança que muitas delas sofrem. “É uma completa bobagem dizer que os atacantes são humanos e merecem viver à custa dos contribuintes”, disse Sanchita Guha, da área de mídia, radicada em Nova Délhi, em conversa com a IPS. A pena capital “também dá à vítima a sensação de que seu caso foi encerrado”, acrescentou.

Porém, a maioria dos grupos de mulheres se opõe à pena de morte ou a punições severas, como a castração química dos violadores, que, em geral, saem impunes por meio de brechas legais ou graças à insensibilidade do sistema judicial.

Kavita Krishnan, um dos rostos mais destacados nos protestos de rua e secretária da Associação de Todas as Mulheres Progressistas da Índia, disse à IPS que “todo esse debate sobre a pena de morte é uma pista falsa para desviar a atenção dos crimes de gênero e se concentrar na severidade do castigo. A pena de morte não é uma solução para um país com leis misóginas. Não há evidência em nenhuma parte do mundo de que este castigo reduz as violações ou desestimule alguém a cometer um crime”.

Em todo caso, a pena de morte poderia dissuadir os juízes de darem sentenças severas contra os violadores, “pois os tribunais terão muita cautela antes de dar um veredito”, acrescentou Krishnan. Na Índia, um “grande número de ataques sexuais também ocorre dentro de casa, entre pessoas próximas entre si. Se houver pena de morte, a vítima estará sob intensa pressão para não fazer a denúncia”, alertou. “As taxas de condenação devem aumentar na Índia, e o debate deve ser sobre a certeza de que haverá castigo e sobre leis com sensibilidade de gênero”, ressaltou a ativista.

Atualmente, os violadores sofrem uma condenação mínima de sete anos de prisão, segundo o Artigo 376 do Código Penal, sentença que pode ser ampliada para dez anos dependendo da severidade do caso. Mas o Artigo 375 considera violação apenas a agressão sexual que incluir penetração com o pênis, o que exclui o sexo oral forçado ou a penetração com um objeto estranho, que pode causar ferimentos ainda mais graves. Estas últimas agressões só estão contempladas no Artigo 354, referente aos “ataques a mulheres com intenção de atentar contra sua modéstia” e no Artigo 377, que pune o “contato carnal contra a ordem natural”.

Para Ranjana Kumari, diretora do Centro para Pesquisa Social, com sede em Nova Délhi, incluir a pena de morte como castigo para a violação, paradoxalmente, pode fazer com que os responsáveis nunca sejam punidos. A especialista explicou que muitos condenados à morte poderão solicitar clemência ao Presidente, que tem o poder de comutar a sentença. “Se a pena capital for implantada, o processo judicial também será muito longo. Já há cerca de 95 mil casos pendentes em vários tribunais e é impossível aplicar a pena de morte em grande quantidade”, disse à IPS.

“Queremos um castigo severo, que inclua rigorosa prisão, porque de outra forma será somente uma opção entre pena de morte ou nenhum castigo”, opinou Kumari. A taxa de condenações a prisão por violações é de 26% na Índia, afirmou, lembrando que “também descobrimos que ninguém recebe pena superior a três ou quatro anos de prisão”. Depois dos protestos em Nova Délhi, o governo designou um comitê integrado por três juristas, que apresentarão recomendações sobre possíveis emendas à lei para incrementar os castigos e acelerar a justiça. Envolverde/IPS