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Reformistas iranianos duvidam de sua participação nas eleições

Historicamente, as eleições presidenciais no Irã servem para os reformistas reclamarem um clima político mais aberto e demonstrarem sua capacidade de mobilização. Foto: Garry Knight/cc by 2.0

 

Teerã, Irã, 1/2/2013 – Na medida em que se aproximam as eleições presidenciais no Irã, previstas para junho, os reformistas debatem sobre qual é a melhor estratégia devido às severas restrições que sofrem seus dirigentes e partidos após os distúrbios que se seguiram às eleições de 2009. Naquela ocasião, o candidato reformista Mir Hossein Mussavi, principal opositor do presidente Mahmoud Ahmadinejad, não aceitou a derrota e seus seguidores realizaram escaramuças com as forças de segurança.

Historicamente, as eleições presidenciais no Irã servem para os reformistas reclamarem um clima político mais aberto e demonstrar sua capacidade de mobilizar as massas, especialmente a classe média urbana. Contudo, este ano parece haver mais discordâncias, especialmente devido à contínua detenção domiciliar de candidatos presidenciais de 2009, como Mussavi, mas também Mehdi Karrubi, e a prisão de outras figuras como Mostafa Tajzadeh, ex-ministro do interior, e Mohsen Mirdamadi, ex-presidente do Comitê de Relações Exteriores e de Segurança Nacional do parlamento.

Alguns reformistas priorizam sua libertação, bem como a de outros líderes políticos, inclusive como condição para participarem das eleições de junho. Mas nem todos concordam. Abdullah Nuri, também ex-ministro do Interior, pensa que atender a deteriorada situação econômica, e a contínua ameaça estrangeira que representam para o Irã as sanções promovidas pelos Estados Unidos, é mais urgente do que a libertação de seus companheiros detidos. Nuri também teme que insistir nesse tema antes de os reformistas aceitem participar das eleições os obrigará a jogar pelas regras de seus inimigos. “Temos que dar o primeiro passo e mostrar aos nossos oponentes que estamos decididos e somos sérios”, afirmou em outubro.

Gholamhossein Karbaschi, ex-prefeito de Teerã, concorda: “É lógico pedir aos nossos rivais que atendem nossas demandas para que possamos vencer a disputa?”. “Se os presos políticos forem libertados e a situação econômica, cultural e política interna e externa melhorarem (antes das eleições), então para que os reformistas precisam chegar ao poder?”, perguntou Karbaschi, que apoiou Karrubi nas eleições de 2009. “Esse é o programa dos reformistas e devem fazer um esforço para realizá-lo quando chegarem ao poder, e não colocá-lo como condição para participarem das eleições”, acrescentou.

Esses tipos de declarações e rumores sobre a possível candidatura do ex-primeiro vice-presidente Mohammad Reza Aref e do ex-ministro da Educação Mohammad Ali Najafi, dão a impressão de que pelo menos alguns reformistas consideram seriamente participar das eleições. Alguns, inclusive, chegaram a declarar que o ex-presidente Mohammad Khatami (1997-2005) seria seu candidato, embora este tenha declarado no último verão que não se candidataria.

Só a menção de Khatami como candidato preocupou as figuras da linha dura.  A televisão estatal chegou a mostrá-lo, algo que não faz há anos, e chamá-lo de “companheiro da sedição”, como define os protestos que se seguiram às eleições de 2009. Os “companheiros da sedição” podem participar das eleições, segundo um programa de televisão, se renunciarem ou se retratarem de suas ações no passado.

O porta-voz do Conselho Guardião, órgão que decide quem pode ser candidato, parece coincidir com essa apreciação, pois em dezembro insistiu que o repúdio à sedição melhoraria as chances das figuras políticas obterem um visto favorável. Mas o repúdio proposto por instituições próximas ao líder supremo, aiatolá Alí Khamenei, foi imediatamente rechaçada pelas mais importantes figuras reformistas.

“Agora devemos renunciar ao nosso apoio para participar das eleições para que se repita a mesma história?”, perguntou o clérigo Mussavi Khoeiniha, editor do jornal Salaam, agora proscrito, para quem os reformistas elegeram o ex-primeiro-ministro Mussavi como candidato em 2009. “Que lógica política nos permitiria fazer isso?”, insistiu, ressaltando que se opõe a que os reformistas participem das eleições a qualquer custo.

Um conhecido reformista que pediu o anonimato disse à IPS que o líder Khamenei e seus assessores não creem que o país atravesse uma crise que exija a participação dos reformistas nas eleições como forma de melhorar a legitimidade do regime e promover a unidade nacional diante das pressões externas.

O próprio Khatami ignorou os pedidos para retirar seu apoio às manifestações de 2009, e, em troca, pediu eleições livres e justas junto ao ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani (1989-1997). Contudo, Khatami permanece ativo e aproveita o clima pré-eleitoral para reiterar a mensagem de que os reformistas não desapareceram e que continuam sendo uma voz importante para articular as necessidades insatisfeitas e as reclamações por reformas políticas e sociais no país.

Segundo o conhecido jornalista Abba Abdi, os reformistas deveriam fazer como fizeram nas eleições presidenciais de 1997, quando a vitória inesperada de Khatami surpreendeu o dominante setor conservador. “Nossa postura deve ser a de que haja eleições e que participemos. É muito provável que não tenhamos muitos votos, mas, talvez, sim”, declarou Abdi ao jornal Etemaad.

Um professor universitário que não quis se identificar foi mais contundente. “Mesmo não tendo esperanças na benevolência do líder, é preciso haver esperança em suas limitações”, disse à IPS. Apontando a aversão de Khamenei em parecer que interfere em política, o professor acredita que “entre sua pretensão de imparcialidade e suas intervenções solapadas, há um espaço para as atividades de grupos políticos, incluindo os reformistas”.

Mas a detenção de dezenas de jornalistas jovens que trabalham em jornais e semanários reformistas pode ser um presságio de que o tradicional clima pré-eleitoral de maior abertura não se repetirá desta vez. Não se conhece as acusações, mas há indícios de que sua detenção não se deve aos seus escritos e sim aos seus supostos contatos com meios de comunicação persas “contrarrevolucionários” fora do Irã.

A medida faz pensar que os setores governantes continuam muito sensíveis e não tratam os reformistas como competidores com diferentes programas em matéria de política interna e externa, mas como uma ameaça à sobrevivência do regime islâmico. Envolverde/IPS