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Os diamantes não são eternos, a terra é

A serra-leonesa Mabinti mostra um papaia. Para ela, e para muitos produtores de seu país, custa fazer suas frutas chegarem ao mercado. Foto: Tommy Trenchard/IPS

 

Freetown, Serra Leoa, 6/2/2013 – Mabinti já não lembra a idade que tem. Cansada de tanto andar, se senta à sombra de uma palmeira em sua aldeia de Makonkonde, no oeste de Serra Leoa, e pega um mamão papaia com suas mãos curtidas por toda uma vida de trabalho. Contudo, não é fácil ganhar o sustento nas áreas rurais deste país. A única possibilidade real que Mabinti tem de vender sua fruta é esperar que os clientes viajem pelo arenoso caminho que leva à cidade, por onde passam apenas uma ou duas motocicletas por hora. A alternativa, que é transportar a fruta de bicicleta até próximo de Waterloo, custaria mais dinheiro do que Mabinti receberia pela venda.

Como muitas outras pessoas na subdesenvolvida indústria da fruta desta nação do ocidente da África, ela sofre a falta de um mercado acessível e rentável para seus papaias. O mercado interno para as frutas de Serra Leoa tem seus limites. Oferece lucro muito baixo por alguns produtos como a manga, e pode ser inacessível para os produtores que vivem longe dos grandes centros urbanos.

Nestas condições, boa parte da colheita de frutas do país tradicionalmente é desperdiçada, particularmente em áreas rurais, e o setor continua se caracterizando por uma produção de subsistência e não comercial: a maior parte das frutas é consumida localmente. “Nos últimos anos, muitas de nossas frutas se perderam. A maior parte simplesmente apodreceu na época de chuvas”, disse à IPS Samuel Serry, porta-voz do Ministério da Agricultura.

O Ministério, junto com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), faz esforços para comercializar os produtos agrícolas em Serra Leoa, melhorando o acesso aos mercados, promovendo o valor agregado das matérias-primas do país e dando apoio a investidores socialmente responsáveis. A FAO também incentiva a formação de coletivos agrícolas, cada um integrado por 35 agricultores, e cria em todo o país uma série de Centros de Agronegócios que serão usados por três ou quatro coletivos.

Segundo o representante de programas da FAO, Joseph Brima, espera-se que este sistema melhore a produção, permita acesso a equipamentos de processamento e instalações de armazenamento, e facilite a chegada ao mercado. Porém, a organização, com seus sócios no Ministério, também tenta atrair investidores capazes de progredir e agregar valor aos cultivos de Serra Leoa, e, ao fazê-lo, dar um mercado novo e lucrativo para os agricultores locais.

Uma dessas empresas é a Africa Felix Juice, fabricante de sucos tropicais e concentrados com selo Fairtrade (comércio justo), exportados para a Europa. A empresa representa um novo modelo empresarial que dá aos agricultores locais um mercado garantido e um preço justo por suas frutas. Segundo seu fundador e presidente, o italiano Claudio Scotto, o que distingue essa firma é que é a primeira de Serra Leoa que exporta um produto manufaturado para a Europa desde que terminou a guerra civil de uma década, em 2002.

Como muitas nações africanas, este país tradicionalmente exporta matérias-primas, entre elas rutilo (óxido de titânio), minério de ferro e, o mais famoso, diamantes brutos. Ao elaborar concentrados em uma pequena fábrica na aldeia de Newton, perto de Freetown, a Africa Felix Juice, com 45 empregados permanentes, agrega valor ao seu produto e pode oferecer melhores preços aos dois mil produtores de manga que vendem a fruta à empresa.

“Foi muito fácil convencer os agricultores a me venderem suas mangas, porque elas apodreciam”, contou Scotto, que diz que as origens de sua empresa remontam a quando conheceu sua mulher serra-leonesa. Foi fácil, inclusive em lugares onde já havia um mercado, porque, como a companhia tem o certificado Fairtrade, paga mais do que o preço normal, até o triplo, como ocorre com os produtores de manga. Estes, por sua vez, conseguem uma produção maior.

Na aldeia de Garahun, o chefe local, Momodou Kamara, pensa em plantar mais mangueiras, após ter começado a vender suas frutas para a Africa Felix Juice. Antes, os aldeões tinham que transportar suas mangas até Waterloo, onde vendiam a dúzia por US$ 0,10, mas agora ganham três vezes mais, contou Kamara. Scotto culpa o legado da guerra civil pelo lento crescimento do agronegócio na última década. “A ausência de paz simplesmente destruiu toda a plataforma de negócios”, afirmou, mencionando a falta de confiança como um obstáculo para o sucesso empresarial.

Porém, Serra Leoa percorreu um longo caminho desde 2002. Após eleições presidenciais pacíficas em novembro do ano passado, nas quais foi reeleito Ernest Bai Koroma, existe uma forte sensação de que agora o país está plenamente aberto aos negócios. Abdullah F. Koroma, que deixou de cultivar pinhas depois que os rebeldes destruíram seu sistema de irrigação durante a guerra, este ano reiniciou a produção em seu estabelecimento agrícola da aldeia de Mobangba. “No país ainda não há estabilidade”, disse à IPS.

A história da indústria da fruta em Serra Leoa é de um vasto potencial, embora ainda pouco concreto. No Ministério, Serry vê o setor agrícola como um componente fundamental do futuro desenvolvimento econômico de Serra Leoa. Embora se dê muita atenção às recentes operações de mineração em grande escala no país, a agricultura, segundo o porta-voz, contribui com 45% do produto interno bruto nacional e emprega 3,5 milhões de pessoas, em uma população de quase seis milhões. “O setor agrícola tem um potencial enorme. Porque os diamantes não são eternos, mas a terra sempre estará lá”, resumiu. Envolverde/IPS