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Zimbábue, país de desempregados

O setor informal é a única saída de muitos zimbabuenses que perderam seus empregos. Foto: Jeffrey Moyo/IPS

Harare, Zimbábue, 2/4/2013 – Os setores público e privado do Zimbábue continuam demitindo trabalhadores sem poder lhes dar a devida compensação. Diante disso, ex-empregados do Banco de Reservas foram à justiça na semana passada para exigir os pagamentos. Economistas neste país da África austral explicaram que muitas empresas tiveram que reduzir o número de seus empregados para enfrentar a perda de ganhos, mas também têm enormes dificuldades para pagar os pacotes de demissão.

“A economia do país está tendo um mau rendimento e, se não for desenvolvida a indústria local, as companhias terão pouco ou nenhum dinheiro para pagar aos demitidos”, disse à IPS o economista independente Kingston Nyakurukwa. Com ele concorda Hapson Munjanja, outro economista independente local, para quem não se pode culpar as empresas por não conseguirem pagar os ex-empregados. “Não é culpa delas se os trabalhadores não recebem suas compensações. As políticas do governo nunca foram boas para os empregadores fazerem negócios rentáveis, e espantam os investidores”, explicou à IPS.

Entretanto, a dura situação econômica não impediu os trabalhadores de reclamarem seus direitos. O Tribunal do Trabalho de Harare recebeu há alguns dias 27 denúncias de 1.456 ex-funcionários do Banco de Reservas do Zimbábue que não receberam o pagamento de suas demissões desde a reestruturação de 2011. As audiências estão marcadas para hoje.

Webster Ngundu, presidente do grupo de ex-funcionários do banco, disse à IPS que sua situação pode derivar em uma crise humanitária. “Sem os postos de trabalho e sem os pacotes de demissão, vários ex-empregados e suas famílias carecem de atenção médica. E muitos de nossos filhos estão em casa porque já não podemos pagar a escola”, afirmou. “Temos muitos casos de ex-empregados do banco que se suicidaram depois que a instituição não conseguiu cumprir suas promessas”, destacou.

Mildred Chikukwa é uma mãe solteira, de 37 anos, com quatro filhos, que foi demitida do banco em 2011. “Devido à minha desesperadora situação, poderia optar pelo trabalho sexual para poder alimentar meus filhos”, confessou à IPS. Enquanto isso, o governador do banco, Gideon Gono, insiste que a instituição não tem dinheiro para pagar os ex-funcionários devido aos problemas de liquidez. Uma das razões é que o Banco Central deixou de emitir dólares zimbabuenses em 2009, optando por um regime de conversibilidade para enfrentar a hiperinflação.

O caso do Banco de Reservas não é único. Outras firmas públicas e privadas, como a mineradora Rio Zim, a aerolinha Air Zimabwe e a algodoeira Cotton Company of Zimbabwe, também demitiram centenas de trabalhadores entre 2011 e 2012.

Embora não haja números mais recentes, um informe de 2009 elaborado pelo Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários mostra que a taxa de desemprego deste país atingia 94% da população economicamente ativa. A grande maioria dos zimbabuenses sobrevive no setor informal. O economista Eric Bloch afirmou que no pior momento da crise, de 2000 a 2010, entre 15 mil e 20 mil empregados foram demitidos.

Estatísticas da Confederação de Empregados do Zimbábue mostram que, embora o mais grave pareça ter passado, as demissões continuam. Em 2011, um total de 4.432 trabalhadores perderam seus empregos tanto no setor privado como no público, contra 6.972 em 2010. No ano passado, o Ministério de Trabalho e Serviços Sociais aprovou a demissão de 1.681 trabalhadores em todo o país.

“Várias indústrias se converteram em comércios, e o país deixou de ser uma economia produtiva para se converter em um grande mercado”, disse à IPS o diretor da Confederação, John Mufukari. O sindicalista afirmou também que as demissões aumentaram quando o país adotou o novo regime monetário e os níveis de produção se tornaram insuficientes para pagar os salários. Um alto funcionário do Ministério do Trabalho, que pediu para não ser identificado, disse à IPS que “a menor demanda por produtos, máquinas antiquadas, falta de matérias-primas, falta de capital circulante e baixa capacidade de produção são fatores que levaram às demissões e ao consequente fechamento de indústrias”.

Percy Mcijo, chefe regional do Congresso de Sindicatos do Zimbábue, disse à IPS que várias companhias já vinham descumprindo seus pagamentos antes de demitirem seus trabalhadores. “Devido às dificuldades que experimentam as cidades, muitos ex-empregados decidem regressar à área rural e jamais recebem suas compensações”, enfatizou Mcijo.

Muitos trabalhadores, como Donson Mbizi, de 44 anos, do subúrbio pobre de Highfields, em Harare, não conseguiu encontrar novo emprego estável. “Perdi meu emprego na mina de ouro de Patchway, no distrito de Kadoma, onde trabalhei por 16 anos. Até agora não recebi o que me devem e me dedico a vender verduras”, contou à IPS. Mbizi afirmou que entrou na justiça, mas nunca obteve resposta.

O presidente do Conselho de Trabalhadores Sociais do Zimbábue, Philip Bohwasi, disse que a falta de compensações para os demitidos significa também uma carga para suas famílias. “O sofrimento daqueles que são demitidos é transferido para seus familiares, filhos e esposas. A tensão e o estresse aumentam, causando disputas familiares e eventuais casos de violência e abusos”, ressaltou à IPS. Envolverde/IPS