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Suíça aloja imigrantes em zonas montanhosas remotas

Suíça leva solicitantes de asilo a casamatas na montanha, longe de centros povoados. Foto: Ray Smith/IPS

 

Lucerna, Suíça, 3/5/2013 – Por não ter onde colocar as pessoas que solicitam refúgio, as autoridades suíças recorreram a casernas sem uso do exército. Algumas ficam em passagens de montanha e longe de áreas habitadas. No ano passado, 28.631 pessoas pediram asilo na Suíça, quase o dobro de 2010. A maioria procedente de Eritreia, Nigéria e Tunísia. O Escritório Federal de Migrações (OFM), responsável pelo processo, registrou 44.478 no final de março deste ano.

As autoridades suíças têm dificuldades para alojar todos os estrangeiros. Entretanto, este é um problema criado por elas mesmas, pois em 2006 o então ministro da justiça, Christoph Blocher, iniciou uma drástica redução da infraestrutura destinada a esse fim. Diante da falta de lugares de residência, em março de 2012, o governo ordenou ao Departamento Federal de Defesa, Proteção da População e Esporte (DDPS) que acomodasse cerca de quatro mil solicitantes de asilo.

O DDPS controla as Forças Armadas, que têm muitas dependências sem uso. Mas os esforços do DDPS são morosos por problemas políticos, restrições de construção e a não conformidade com os planos espaciais de comunidades, o que levou o parlamento a aprovar uma resolução que permitiu saltar os procedimentos de autorização de cantões e comunidades. Os locais do exército costumam ficar em zonas distantes, o que agrada muitos cidadãos suíços. Este sentimento é o resultado de mais de uma década de campanhas populistas de direita contra os estrangeiros e, em especial, os solicitantes de asilo.

Antes de serem distribuídos nos cantões, os solicitantes foram alojados pela OFM em abrigos de suas próprias dependências coletivas. Mas a urgência faz com que este órgão considere adequados os lugares afastados, mesmo que apresentem problemas logísticos. Um dos centros provisórios foi aberto em outubro passado, perto do povoado de Sufers, nos Alpes dos Grisones, a 1.400 metros de altitude. “Os solicitantes de asilo vivem em uma casamata velha e desolada em um estreito vale”, descreveu Denise Graf, da Anistia Internacional, com sede em Londres, que visitou o lugar. “Não há casas perto, apenas árvores e um montão de neve”, afirmou.

Como em todos os centros da OFM, os refugiados só podem permanecer fora entre nove horas da manhã e cinco da tarde. Um barracão do exército serve de lugar recreativo e é possível sair nos finais de semana. “Para compensar o isolamento espacial, recebem passagens gratuitas para transporte no final de semana. Mas o ponto de ônibus mais perto fica a vários quilômetros do local”, observou Graf.

“O contato entre os 130 residentes de Sufers e os 80 solicitantes de asilo é escasso”, informou o prefeito Thomas Lechner. “O lugar fica a dois quilômetros e meio do povoado”, destacou Graf. Consultado se uma casamata é um lugar apropriado para alojar pessoas, o prefeito disse que “as pessoas permanecem ali 35 dias. Para os militares foi bom, por isso penso que também é razoável para os solicitantes de asilo”.

Como o centro de Sufers foi fechado no final de abril, a IPS não pôde entrevistar nenhum de seus habitantes, embora outras pessoas que moraram em outros centros afastados mencionaram o enorme aborrecimento, o que às vezes pode ser motivo de conflitos. “É muito difícil viver em casamatas, especialmente com limitada liberdade de movimento”, contou Moreno Casasola, secretário-geral da Solidarité Sans Frontières, que defende os direitos de refugiados e solicitantes de asilo. “Como se pode ver pela experiência dos soldados, o lado psicológico é rapidamente prejudicado”, afirmou.

A OFM tem consciência disso e pediu que os residentes de Sufers oferecessem trabalho. “Foi uma situação boa para os solicitantes de asilo, bem como para nossa comunidade”, reconheceu Lechner. “Cortaram lenha, arrumaram as calçadas, e limparam pastos. Na verdade, muitos solicitantes de asilo aplaudiram a oportunidade de trabalhar. Melhorou sua aceitação e reputação local. Mas não é justo alojar essas pessoas em lugares montanhosos distantes”, afirmou Graf.

Devido ao fechamento do centro de Sufers, será aberto um temporário na Passagem de Lukmanier, que liga o cantão de Grisones com o de Tesino, onde serão acomodados cem solicitantes de asilo quando a neve derreter. “Decidimos ajudar a OFM”, disse Peter Binz, prefeito da municipalidade de Medel, à qual pertence a passagem montanhosa. O município tem 400 habitantes e seu principal povoado, Curaglia, fica a 15 quilômetros da Passagem de Lukmanier.

Dentro de pouco tempo, a OFM anunciará a abertura de outro centro de alojamento para solicitantes de asilo no Lago della Sella, a 2.256 metros de altitude. O lago artificial fica perto da Passagem de San Gotardo, que liga o norte da Suíça, de língua alemã, com o sul, de língua italiana. Este lago pertence à municipalidade de Airolo, cujo prefeito, Franco Pedrini, se mostrou preocupado: “Ninguém vive ali. É um lugar bonito para passar uma semana acampando de férias, mas o clima é duro. Não é adequado para solicitantes de asilo”.

Ainda que o centro de Lago della Sella só venha a ser usado no verão, não é raro que ali caia neve, mesmo em julho e agosto. “Um lugar afastado estaria bem e alegraria os cidadãos que temem a presença de solicitantes de asilo, mas isso fica muito longe de uma área civilizada”, enfatizou Pedrini.

A organização Solidarité Sans Frontières se opõe radicalmente aos centros afastados para alojar os imigrantes. “São seres humanos, não vacas que no verão se leva para a montanha”, disse seu secretário-geral. “A OFM só se apoia no DDPS para o alojamento. Deveria ampliar suas relações e incluir, por exemplo, instituições clericais, que possuem muitos imóveis adequados”, acrescentou Cassasola.

André Durrer, que trabalha para a organização Caritas, tampouco está de acordo quanto a colocar os imigrantes nas montanhas. “Durante 20 anos tivemos lugares em áreas povoadas sem barreiras nem guarda particular, e funcionou”, ressaltou. Envolverde/IPS