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OMC consagra um latino-americano em prol de mudar o rumo

Roberto Carvalho de Azevêdo assumirá em 1º de setembro a direção da OMC. Foto: OMC - CC BY-SA 2.0

 

Genebra, Suíça, 15/5/2013 – O brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo, formalmente nomeado ontem novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), chegou a essa posição com o amplo apoio do mundo em desenvolvimento, superando na fase final o mexicano Herminio Blanco, preferido pelos países industrializados. O resultado do processo de seleção deixa claro que boa parte dos membros da OMC, em sua maioria países em desenvolvimento, está descontente com o statu quo que Blanco representava, disse à IPS a coordenadora da rede Nosso Mundo Não Está à Venda (OWINFS), Deborah James.

A ativista e especialista em comércio da OWINFS, rede de dezenas de organizações e institutos de estudo em todo o mundo, afirmou que “a insatisfação dos governos do Sul se relaciona com a prorrogação do atual modelo fracassado de globalização corporativa, baseado na liberalização e desregulamentação”. E acrescentou que “a OMC consolida globalmente esse modelo sem considerar os efeitos negativos dessas políticas nos operários, camponeses e meio ambiente”.

A designação de Azevêdo é considerada um sopro de ar fresco para o rarefeito clima em que adormece, há pelo menos uma década, a OMC, conduzida nos últimos oito anos pelo francês Pascal Lamy. Em sua declaração perante o Conselho Geral da organização, que consagrou Azevêdo para um período de quatro anos a partir de 1º de setembro, a delegação da África do Sul afirmou que sua nomeação é comemorada como uma tríplice vitória, pela diversidade, pelo consenso e pelo multilateralismo.

Os sul-africanos também pediram que a direção da OMC reflita a diversidade de seus 159 membros e represente todas as regiões. “Hoje conseguimos que a América Latina esteja representada pela primeira vez na direção da OMC”, afirmaram. “Em breve será a vez da África contribuir com a riqueza de seus dirigentes para esta instituição”, acrescentaram os representantes de Pretória.

A OMC e seu antecessor, o Acordo Geral de Tarifas Alfandegárias e Comércio (GATT), sempre foram dirigidos por representantes de nações industrializadas, exceto no período 2002-2005, quando a organização esteve a cargo do tailandês Supachai Panitchpakdi.

James disse que agora caberá a Azevêdo responder às necessidades evidentes que a sociedade civil, por meio da OWINFS, está mostrando. Assim se referiu à transformação do sistema existente para garantir que possa dar aos países o suficiente espaço político para perseguir um programa positivo rumo ao desenvolvimento e à geração de emprego. Dessa forma, prosseguiu, “as regras comerciais poderão facilitar, em lugar de entorpecer, os esforços mundiais para garantir uma verdadeira segurança alimentar, o desenvolvimento econômico sustentável, o acesso global à saúde e aos medicamentos e a estabilidade financeira”.

A organizações não governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) pediu que Azevêdo dê prioridade ao acesso a medicamentos. Rohit Malpani, diretor de política e análise dessa instituição, afirmou que a designação do brasileiro “coincide com a reclamação do grupo dos Países Menos Avançados (PMA) de continuarem livres da aplicação dos Acordos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio” (Adpic).

Os PMA querem que essa exceção seja aplicada enquanto persistir sua condição de menor desenvolvimento. Malpani estimou que a prorrogação desse benefício permitirá aos PMA evitar os efeitos de práticas monopolistas sobre medicamentos, diagnósticos e aparelhos médicos. Esta e outras reclamações do grupo figuram junto a questões de agricultura e facilitação de comércio, entre os prováveis temas da conferência ministerial da OMC marcada para Bali, na Indonésia, entre 3 e 6 de dezembro.

Azevêdo evita comentários precisos sobre a marcha da OMC devido à sua condição de mero diretor-geral designado, que irá até 1º de setembro. Mas, em um reconhecimento das dificuldades que enfrentam as negociações de um acordo ministerial em Bali, o diplomata brasileiro disse que, se não houver êxito, a marcha será muito mais árdua. Também afirmou que é preciso mover a OMC “de sua atual paralisia para uma organização que novamente seja valiosa e obtenha resultados negociados que o mundo deseja e espera”.

No entanto, as diferenças entre os negociadores não são a única ameaça à conferência ministerial de dezembro. A Coalizão de Camponeses Asiática (APC) anunciou que pretende demonstrar sua enérgica resistência à OMC durante a reunião em Bali. A organização realizará ações contra a OMC em Bangladesh, Filipinas, Indonésia, Paquistão, Sri Lanka, Nepal e Índia, disse o subsecretário-geral da APC, Rahmat Ajiguna. Os acordos de agricultura da OMC causam deslocamentos maciços, destruição da indústria local e a crescente apropriação de terras e recursos, segundo a ACP. Envolverde/IPS