Montreal, Canadá, 13/9/2011 – “Os astros não estão alinhados para conseguir um tratado legalmente vinculante” na conferência climática que acontecerá no final do ano na África do Sul, por isso “temos de nos aproximar o máximo possível dele”, disse à IPS Kumi Naidoo. A 17ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 17) acontecerá entre 28 de novembro e 9 de dezembro em Durban, sua cidade natal. A IPS conversou com Naidoo durante a Assembleia Mundial da Civicus 2011, que terminou ontem em Montreal, no Canadá.
IPS: Quais possibilidades existem de surgir um tratado legalmente vinculante na COP 17?
KUMI NIADOO: Os antecedentes em matéria de cumprimento com relação a cúpulas da Organização das Nações Unidas (ONU) são tão ruins que resultam patéticos. Precisamos ter um tratado justo, ambicioso e vinculante. Justo significa que deve expressar uma responsabilidade comum e diferenciada, que leve em conta o fato de as nações industrializadas terem a culpa da crise em que nos encontramos. Isso deveria levar as nações ricas a se mostrarem dispostas a pagar sua dívida climática para ajudar os países pobres a se adaptar e mitigar os impactos da catastrófica mudança climática. Necessitamos de um grau de ambição equivalente ao que indica a ciência. Esta nos diz que as nações industrializadas têm de fixar objetivos de redução de emissões entre 25% e 40% (até 2020, em relação a índices de 1990), e pouquíssimos países estão perto disso. Devido à posição dos Estados Unidos, e ao fato de países como Rússia, Canadá e Japão tentarem matar o Protocolo de Kyoto (assinado em 1997 e em vigor desde 2005), penso que os astros não estão alinhados para conseguir um tratado legalmente vinculante. Então, o que precisamos fazer é nos aproximar o máximo possível do tratado legalmente vinculante. Se os Estados Unidos são a única nação a bloqueá-lo, precisamos encontrar uma maneira de avançar, pressionando os Estados Unidos para que elaborem uma legislação nacional equivalente aos compromissos assumidos por outros países, a fim de aceitar a séria tarefa de atuar, não apenas negociar. A África está muito disposta a garantir que o Protocolo de Kyoto sobreviva; queremos que seja acordado o segundo período de compromisso. Durban não deve ser o cemitério de Kyoto. Se este instrumento falhar, falhará toda a Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática.
IPS: COPs anteriores levaram à criação do Fundo Verde para o Clima a fim de apoiar os esforços de mitigação e adaptação, a tecnologia e a criação de infraestrutura para responder à mudança climática. A decisão de o Banco Mundial administrar esse Fundo durante os primeiros três anos foi controvertida. Quais outras formas de administrá-lo?
KN: Há tensão desde a COP 16, em Cancún, sobre o papel do Banco Mundial no Fundo. O compromisso é que o Banco inicie o Fundo e este evolua fora daquela instituição. Penso que muitos países africanos, com base em sua experiência com os mecanismos de financiamento do Banco Mundial, têm muitas reservas em relação a isso, o que é totalmente compreensível e compartilhado amplamente pela sociedade civil. Tem sentido o Fundo ser administrado de um modo que não seja visto como desproporcionalmente dominado pelo Banco Mundial, porque dizer que está seria outra maneira de dizer que está desproporcionalmente influenciado pelos países ricos que dominam sua direção institucional. Agora, há uma série de outros possíveis mecanismos e um conjunto de experiências como o financiamento do combate ao HIV (vírus causador da aids), como o Fundo Mundial de Luta contra a Aids, a Tuberculose e a Malária, e outros fundos verticais. Não se trata de física quântica.
IPS: Para onde gostaria que fosse o dinheiro do Fundo?
KN: Sabemos que as mulheres africanas são a esmagadora maioria dos que praticam a agricultura no continente, e que elas não têm apoio como sementes, fertilizantes ou tecnologia. É ali que desejo que sejam usados os recursos do Fundo Verde para o Clima. Também temos de pensar em investir em coisas como coleta de água, apoiando o acesso das mulheres a ela. Os vulneráveis e marginalizados devem ser os beneficiários das negociações climáticas, e não apenas das migalhas. Precisam de um substancial apoio político, estrutural e técnico.
IPS: Há algo mais em sua lista de desejos para a COP 17?
KN: Necessitamos de movimento em matéria de proteção florestal. Isto afeta os países da Bacia do Congo, particularmente a República Democrática do Congo. As florestas dessa bacia estão entre as mais importantes do mundo. Alguns podem argumentar que são tão importantes quanto a selva amazônica. Temos de fazer tudo o que está ao nosso alcance para impedir uma destruição maior dessa floresta, e ter um enfoque florestal sustentável para abordar as necessidades dos milhões de pessoas que vivem na floresta. É uma parte fundamental dos pulmões do planeta. Envolverde/IPS