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“Ouvir o povo, não as corporações”

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Daniel Mittler.

Nações Unidas, 10/8/2011 – “Se os governos ouvirem o povo em lugar das corporações que contaminam, o próximo compromisso mundial poderá ser uma economia baseada nas energias renováveis e na eficiência”, disse em entrevista à IPS o diretor de política do Greenpeace Internacional, Daniel Mittler. A histórica Cúpula da Terra realizada em 1992 no Rio de Janeiro foi uma das conferências ambientais fundamentais no plano internacional, criando ou reforçando uma série de tratados e protocolos da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudança climática, biodiversidade, desertificação e florestas.

Quase 20 anos depois, enquanto a ONU se prepara para a Conferência Rio+20, que acontecerá entre 4 e 6 de junho do ano que vem no Brasil, os êxitos e fracassos daquela instância original são submetidos a um escrutínio cada vez maior. A IPS conversou com Mittler, para quem, desde a cúpula de 1992, os governos não conseguiram progressos em matéria de desenvolvimento sustentável.

IPS: Dez anos depois da Cúpula da Terra houve outra conferência em Johannesburgo. Por que é importante uma nova reunião sobre desenvolvimento sustentável?

DANIEL MITTLER: As conferências em si mesmas nunca são importantes. Os resultados são. Nos últimos anos as grandes conferências fracassaram. Rio+10, em Johannesburgo, por exemplo, adotou o que chamamos de “Plano de Inércia”. As conferências mundiais são fundamentais para gerar debates mundiais e permitem destacar os fracassos atuais e as oportunidades atuais e futuras. Desde a Rio 92, o desenvolvimento foi qualquer coisa, menos sustentável. Se tem algum sentido voltar ao Rio de Janeiro, os governos terão de levar a sério a implantação das muitas promessas que assumiram nessa cidade e depois não cumpriram. As empresas terão que dimensionar as oportunidades oferecidas pelo desenvolvimento limpo e os que exercem pressão a favor do “sujo” terão que ficar expostos por nos atrasarem. Para o Greenpeace, a Rio+20 somente será importante se gerar avanços reais para as pessoas e o planeta.

IPS: Além do Greenpeace Internacional, o senhor trabalhou para a Amigos da Terra. Em que as organizações não governamentais contribuem para as reuniões ambientais?

DM: As organizações não governamentais têm de fazer com que governos e empresas se responsabilizem por suas ações, têm de apresentar ideias de soluções e organizar o apoio público para que sejam dados passos concretos que beneficiem a população e o meio ambiente. Em muitos sentidos, os debates sobre a Rio+20 estão apenas começando. As organizações não governamentais devem se comprometer com eles com honestidade e serem firmes contra os que tentam criar uma “fachada verde” para negócios que funcionam como de costume. As organizações não governamentais também devem resistir, simplesmente fazendo o tipo de campanha que realizavam há dez ou 20 anos. Devemos analisar a situação atual e escolher insumos voltados para as áreas onde é mais provável que ocorra uma mudança real.

IPS: Quais as sugestões do Greenpeace Internacional para a Rio+20?

DM: Temos muitas. A Conferência deve apoiar uma revolução energética baseada nas energias renováveis e na eficiência energética, e fazer com que todos tenham acesso a energia. Governos e empresas devem se comprometer com um desmatamento zero até 2020. Os países industrializados e as corporações devem acabar com as políticas e o tipo de financiamento que promovem o desmatamento. A Rio+20 deve fazer a transição para uma economia verde que seja justa e equitativa, e se comprometer com uma agenda de trabalho decente. Deve fortalecer o sistema de governança que promova um “ambiente para o desenvolvimento”, conferindo ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) o status de agência especializada. O Greenpeace exige um novo acordo de implantação no contexto da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, para a conservação da biodiversidade marinha e o manejo sustentável das atividades humanas em áreas que estão além da jurisdição nacional.

IPS: O Greenpeace participará da reunião “Sociedades sustentáveis, cidadãos responsáveis”, que acontecerá de 3 a 5 de setembro em Bonn?

DM: Sim, e estou ansioso para falar em um dos painéis. Nosso plano de ação é o que acabo de apresentar. Estes pontos são as provas-chave para saber se a Rio+20 nos fará avançar para sociedades sustentáveis e se governos e empresas estão prontos para responder às necessidades dos pobres e do planeta, em lugar das indústrias sujas e dos que fazem campanha a favor delas.

IPS: O que virá depois da Rio+20?

DM: O próximo grande teste para a comunidade mundial será em 2015, quando, provavelmente, os governos de muitos países não terão cumprido os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Se os governos ouvirem o povo em lugar das corporações que contaminam, o próximo poderá ser um compromisso mundial com zero desmatamento e adoção de um instrumento legal para proteger as águas de alto mar. As indústrias limpas devem nos ajudar a garantir que os governos deixem de se interporem em seu caminho e levarem a sério a transição para uma economia mundial justa e limpa. O que virá também dependerá de todos nós. Convido todos a entrarem no site www.greenpeace.org para unirem-se a nós na tarefa de conseguir que governos e empresas sejam responsáveis e apresentem soluções reais. Envolverde/IPS