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A aids avança na Europa oriental e na Ásia central

Na oriental região ucraniana de Dnipropetrovski é oferecida terapia de substituição de opiáceos. Foto: International HIV/aids Alliance na Ucrânia

 

Kiev, Ucrânia, 10/9/2012 – Apesar das promessas dos governos da Europa oriental e da Ásia central de lutar contra a aids, a epidemia cresce mais rápido nesta ampla região do que no resto do mundo. As políticas antidrogas, a discriminação e as dificuldades de acesso aos medicamentos e às terapias são os principais fatores da propagação do vírus HIV (causador da aids). O vírus não poderá ser contido, a menos que os governos mudem sua estratégia, afirmam especialistas.

“Na maioria dos países pós-soviéticos, onde o HIV continua concentrado nos viciados em drogas, as políticas punitivas e a discriminação continuam paralisando a resposta à aids”, disse à IPS o diretor do Programa Internacional de Desenvolvimento para a Redução de Danos da Open Society Foundations, Daniel Wolfe. Os números mostram um cenário cinzento. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), enquanto as taxas de infecção por HIV caem em todo o mundo, elas crescem na região definida por órgãos internacionais com Europa oriental e Ásia central (EECA).

A OMS informou que houve 170 mil novas infecções nesta região, em 2011, com alta de 22% desde 2005, e não há sinais de reversão da tendência. O uso de drogas intravenosas é um dos principais fatores: mais de 70% dos novos contágios ocorrem dessa forma, segundo a OMS. Ativistas dizem que a luta contra a epidemia deve se basear, antes de tudo, no combate ao vício de drogas injetáveis, no entanto afirmam que a atual postura dos governos sobre o problema não poderá solucioná-lo, mas, pelo contrário, pode agravá-lo.

“E necessário abandonar as políticas punitivas contra as drogas. As pessoas resistem a fazer o tratamento por temerem ser processadas penalmente ou ter outro tipo de problemas com a polícia”, explicou à IPS a ativista Dasha Ocheret, da Rede Eurasiática para a Redução de Danos. “E há situações nas quais se arriscam a pegar infecção com o HIV em lugar de ir a um centro de troca de seringas”, acrescentou. Esses centros fornecem gratuitamente material de injeção esterilizado em troca de seringas usadas, para evitar o compartilhamento destas e assim prevenir o contágio pelo HIV.

Rússia e Ucrânia são os países com os cenários mais graves. Além disso, ativistas acusam Moscou de criar obstáculos à luta contra o HIV/aids em toda a região. A terapia de substituição de opiáceos (TSO), tratamento para viciados aplicado em grande parte do mundo, no qual se oferece metadona ou buprenorfina aos consumidores de heroína, é proibida na Rússia e defendê-la é punido com prisão. Os críticos da terapia na Rússia argumentam que mantém os pacientes no vício, e que os países ocidentais a promovem apenas para obter lucro. Também afirmam que a metadona provavelmente acabará sendo vendida no mercado negro, desatando outro problema de drogas.

Nos últimos anos, a Rússia emergiu com importante doadora na EECA, e dessa forma também exportou suas políticas, incluindo sua rejeição à TSO. “A Rússia é importante ator regional, e sua política antidrogas influi em outros países da região”, apontou Ocheret. Funcionários do Programa conjunto da Organização das Nações Unidas para o HIV/aids garantem que se pode conter o vírus entre os viciados em drogas combinando a TSO com programas de troca de seringas. Entretanto, porta-vozes da organização Harm Reduction International disseram à IPS que a grande diferença nas taxas de prevalência de HIV entre os viciados em drogas intravenosas nos países ocidentais e na Rússia (de até 30%) se deve à aplicação da TSO e de programas de troca de seringas nos primeiros.

No entanto, mesmo nos países da EECA onde existem estes programas os pacientes enfrentam grandes dificuldades para ter acesso a eles. Muitos governos continuam questionando sua efetividade e se negam a apoiá-los financeiramente, fazendo com que dependam de doações, o que limita sua cobertura e efetividade. Porém, o maior problema é a perseguição dos que tentam ter acesso aos programas. Muitos viciados na região denunciam torturas, chantagens, surras e acusações falsas da polícia.

Nos países da EECA pode-se ir para a prisão por períodos prolongados pela posse de uma quantidade mínima de droga. O resíduo em uma agulha entregue em um centro de troca de seringas, por exemplo, pode ser motivo suficiente para uma condenação. Um porta-voz da International HIV/aids Alliance na Ucrânia, onde a TSO e os programas de troca de seringas contam com forte apoio oficial, disse à IPS que “a intimidação física e de outro tipo contra consumidores de drogas é rotina na prática policial”.

“Os viciados, os trabalhadores sexuais e os provedores de serviços denunciam que a polícia obtém dinheiro e informação dos consumidores mediante golpes, choques elétricos, simulação de asfixia e ameaças de violação. Também denunciam que a polícia coloca droga em suas casas e a usa como evidência para prendê-los”, afirmou o porta-voz. A discriminação também afeta os programas de distribuição de antirretrovirais. A International HIV/aids Alliance assegurou à IPS que é “um problema comum” na Ucrânia negar antirretrovirais a viciados, embora não haja forma oficial de provar isso. Já a Rede Eurasiática informou à IPS sobre incidentes semelhantes na Rússia.

A OMS estima que apenas 23% das pessoas que podem se beneficiar de remédios contra HIV na EECA os recebem efetivamente. Na África subsaariana, a proporção é mais do que o dobro. Organizações contra a aids na EECA alertam que, enquanto não forem adotados os enfoques ocidentais de prevenção e tratamento, a epidemia continuará sem controle nesta região. “Países como a Polônia, por exemplo, adotaram na década de 1990 práticas ocidentais contra o HIV/aids, incluindo a TSO, e dessa forma mantiveram o problema sob controle. Em muitos países da EECA, estes programas seguem em eternas fases de teste e nunca avançam”, enfatizou Ocheret à IPS. Envolverde/IPS