Mogadíscio, Somália, 18/11/2011 – Existem crescentes riscos de surgimento de epidemias mortais como cólera e sarampo nos acampamentos para as vítimas da fome na Somália, alertam trabalhadores humanitários, enquanto os refugiados se queixam de que a ajuda internacional diminuiu, ou parou. O líder de um grupo de voluntários somalianos que ajuda refugiados da fome em acampamentos nos arredores de Mogadíscio, Abdi Ibrahim Ahmed, disse à IPS que as condições de higiene nesses locais é preocupante, e que muitos não têm acesso a água potável.
“As condições nos acampamentos estão maduras para a propagação de doenças mortais. Os médicos já contribuem com seu tempo, conhecimento e energia, mas pedimos ao governo somaliano que leve a sério nossos alertas”, disse Ahmed à IPS. Ele contou que os refugiados já estão contraindo várias doenças, como infecções das vias respiratórias altas e baixas, sarampo, malária e meningite.
Ahmed disse que é preciso instalar unidades médicas permanentes nos acampamentos e também melhorar o saneamento. “Se chover muito forte e não houver equipes médicas móveis nos acampamentos, temo que doenças contagiosas matarão muitos”, afirmou à IPS. Embora a Somália continue recebendo ajuda, os esforços de assistência em alguns acampamentos diminuíram ou pararam.
O acampamento de Sigale, nos arredores de Mogadíscio, abriga mais de três mil pessoas, afirmou seu diretor, Mohamed Hassan Sheik Abdi. Contudo, não recebe ajuda desde o começo de agosto. “Recebemos nossa última remessa de alimentos do Catar nos primeiros dias do Ramadã (mês sagrado muçulmano). Depois, nada mais chegou. Só ouvimos no rádio que a ajuda enviada pela comunidade internacional chega diariamente, e a distribuição da comida continua em alguns acampamentos”, disse à IPS.
O diretor contou que todas as manhãs mães e pais do acampamento vão para a cidade pedir esmolas. “Regressam à noite com o que conseguiram e alimentam seus filhos, que não comem nada durante o dia”, acrescentou Abdi. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) construiu novos banheiros em Sigale e outros acampamentos, mas não são suficientes para atender a crescente população. Enquanto os adultos fazem longas filas para utilizar as poucas latrinas, as crianças fazem suas necessidades ao ar livre.
Também existe grande carência de água, e as mulheres são obrigadas a caminhar longas distâncias para encontrá-la. Além disso, muitas vezes a água está contaminada, e, portanto, ocorrem casos de diarreia, agora uma das principais causas de morte nos acampamentos. Dez pessoas, a maioria crianças menores de cinco anos, morreram de diarreia, tosse forte e difteria em Sigale desde setembro, segundo Abdi. Desde agosto, pelo menos 38 pessoas de Sigale e de outros quatro acampamentos vizinhos morreram por diarreia e outras doenças.
A organização não governamental humanitária Qatar Charity foi uma das primeiras a chegar à Somália para ajudar as vítimas da seca, considerada uma das piores no Chifre da África em mais de 60 anos. Duran Ahmed Farah, diretor do escritório somaliano da entidade, disse à IPS que sua organização havia fornecido alimento a milhares de pessoas e que agora procura resolver os problemas de saúde e saneamento nos acampamentos.
“No começo, tentamos fazer uma campanha para salvar vidas, porque as pessoas morriam de fome e precisavam comer. Agora vamos criar mais equipes médicas móveis que serão responsáveis pela atenção nos acampamentos para refugiados da fome”, informou Farah à IPS. E acrescentou que as agências de ajuda não detiveram seus esforços de assistência, mas que estão alimentando novos refugiados que chegam a Mogadíscio. “A grande necessidade aqui não pode ser atendida num tempo curto”, afirmou.
Por outro lado, a organização de ajuda Centro Comunitário Usmani começou a cavar poços de água em alguns acampamentos. “Cavamos os poços em dois acampamentos nos distritos de Hamar-Weyne e Abdel Aziz. Em janeiro, tentamos cavar nos sete acampamentos com maior número de pessoas em Mogadíscio”, disse à IPS o representante somaliano da organização, Abdulaahi Mohamed Saneey.
O porta-voz em Mogadíscio do governo somaliano, Mohamed Abdullahi Arig, disse à IPS que se procura prevenir possíveis focos de cólera e a propagação de outras doenças transmissíveis nos acampamentos. “O governo está mais vigilante, mas nossa capacidade é muito pequena. Precisamos de assistência da comunidade internacional”, ressaltou. Envolverde/IPS