Washington, Estados Unidos, 10/2/2012 – O perigo de os muçulmanos dos Estados Unidos orquestrarem atentados terroristas foi exagerado pelas autoridades nos últimos anos, segundo um estudo publicado nos Estados Unidos. O informe divulgado esta semana mostra que a quantidade de conspirações cometidas por, e de acusações contra, muçulmanos norte-americanos radicais caiu de forma significativa no ano passado, desde o máximo alcançado em 2009, contra os prognósticos da polícia e de outros responsáveis pela segurança interna.
Este estudo, terceiro de uma série anual realizada pelo Centro Triângulo sobre Terrorismo e Segurança Interna, do Estado da Carolina do Norte, indica que somente um dos 30 muçulmanos norte-americanos acusados em 2011 de tentar orquestrar um atentado conseguiu realizá-lo. O agressor disparou contra um edifício do exército fora de Washington sem causar feridos. “A ameaça continua: as conspirações violentas não caíram para zero e as organizações islâmicas revolucionárias estrangeiras continuam convocando os muçulmanos norte-americanos a cometerem atos violentos”, afirmou o autor principal do estudo, Charles Kurzman, sociólogo da Universidade da Carolina do Norte.
“Entretanto a quantidade de muçulmanos norte-americanos que responderam ao chamado continua sendo ínfima, em comparação com as mais de dois milhões de pessoas que professam essa fé nos Estados Unidos e com o número de casos violentos registrados neste país. Houve 14 mil assassinatos em 2011”, escreveu Kurzman, que publicou, no ano passado, o livro The Missing Martyrs: Why Ther Are Só Few Muslim Terrorists (Os mártires desaparecidos: Por que há tão poucos terroristas muçulmanos). A publicação deste estudo coincide com declarações de um alto funcionário do Pentágono sobre a possibilidade de Washington ter exagerado sobre a ameaça da rede extremista Al Qaeda após os atentados de 11 de setembro de 2001, nesta cidade e em Nova York.
“A Al Qaeda não era tão boa quanto pensávamos em 11 de setembro”, disse Michael Sheehan, secretário-adjunto de Defesa para operações especiais e baixa intensidade de conflitos, em uma conferência realizada no dia 7. “Francamente, o governo dos Estados Unidos dormiu sobre os louros antes do 11 de setembro. Uma organização que não era tão boa pareceu enorme” (após os atentados), afirmou. “A gente olhava para o céu e dizia: quando será o próximo ataque? E não ocorreu, em parte porque a Al Qaeda não era tão capaz”, comentou Sheehan, citado pelo jornal Army Times. Críticos do governo de George W. Bush (2001-2009), e de sua “guerra global contra o terrorismo”, afirmaram que exagerou a ameaça dessa organização e de seus seguidores nos Estados Unidos.
O último informe do Centro Triângulo se concentra principalmente no período seguinte à chegada de Barack Obama ao governo, em janeiro de 2009. De fato, nesse ano aumentou a quantidade de muçulmanos norte-americanos acusados de participar da organização ou da realização de atentados terroristas. As 47 pessoas condenadas em 2009 representaram uma quantidade substancialmente maior do que a média anual de 20 que se seguiu aos ataques de 2001.
Além disso, os atentados cometidos em 2009 custaram a vida de mais pessoas em solo norte-americano do que cm qualquer outro momento depois do 11 de setembro, o que aumentou a preocupação. No dia 5 de novembro daquele ano o psiquiatra do exército, Nidal Hasan, abriu fogo na base militar de Ford Hood, no Estado do Texas, deixando 13 mortos. Três meses antes, Abdulhakim Mohammad disparou contra dois soldados fora de um centro de recrutamento em Little Rock, no Estado de Arkansas, deixando um morto. A preocupação se intensificou no final desse ano quando o nigeriano muçulmano Umar Farouk Abdulmutallab tentou explodir um avião da empresa Northwest, procedente de Amsterdã, quando se preparava para pousar em Detroit, no Estado de Michigan.
A quantidade de muçulmanos norte-americanos acusados de orquestrar atentados terroristas caiu para 26 em 2010, mas com o carro-bomba que explodiu em 1º de maio desse ano em Times Square, Nova York, se avivou o temor de que os muçulmanos norte-americanos estavam se radicalizando. O atentado foi cometido por Faisal Shahzad, paquistanês nacionalizado norte-americano que recebeu treinamento com explosivos de um grupo extremista da região do Waziristão, no Paquistão.
Na primeira metade de 2011, funcionários norte-americanos como o diretor do Escritório Federal de Investigações (FBI), Robert Muller, e a secretária de Segurança Interna, Janet Napolitano, alertavam que a ameaça terrorista atingira seu ponto máximo desde 2001. Paralelamente, o presidente do Comitê de Segurança Interna da Câmara de Representantes, Peter King, do opositor Partido Republicano, fez uma série de controvertidas conferências sobre “o grau de radicalização dos norte-americanos muçulmanos nas mãos da Al Qaeda”.
“Este e outros alertas semelhantes prepararam os norte-americanos para um possível aumento de ataques terroristas nas mãos de muçulmanos norte-americanos, que nunca ocorreram”, segundo este estudo. “Uma consequência desses alertas é a desproporcional sensação de alta tensão a respeito da quantidade real de atentados nos Estados Unidos depois do 11 de setembro”, destacou. De fato, os muçulmanos norte-americanos consultados mostraram um baixo grau de radicalização e uma grande satisfação com suas vidas, suas comunidades e a situação do país, em relação com o público norte-americano em geral.
Dos mil norte-americanos muçulmanos consultados em uma pesquisa do Centro Pew, publicado no último verão boreal, 55% disseram que suas vidas se complicaram após os atentados de 2011, oito em cada dez se mostraram satisfeitos com sua vida pessoal e 56% com a situação do país, mais do que a média de 23% expressado pelo público norte-americano em geral. Um estudo do Gallup, publicado na mesma época, concluiu que os muçulmanos norte-americanos ouvidos mostraram maior grau de tolerância a outras religiões e maior probabilidade de se opor a atentados violentos contra civis do que qualquer outra comunidade religiosa dos Estados Unidos.
O Centro Triângulo diz que quase 200 muçulmanos norte-americanos participaram da organização de atentados violentos na década passada e que mais de 400 foram acusados ou condenados por apoiarem atividades terroristas, as quais incluem financiar organizações estrangeiras. Contudo, em 2011, o número de pessoas nessas duas categorias diminuiu e a gravidade dos casos também parece diminuir. Não só não houve morte por atividades terroristas, como a quantidade de dinheiro envolvido nos quatro casos por financiamento de organizações terroristas foi relativamente pequena, afirma o estudo. Esses quase 200 muçulmanos se dividem quase igualmente entre os nascidos nos Estados Unidos e os que imigraram. Segundo o Centro Pew, 37% dos muçulmanos norte-americanos nasceram neste país e 63% no estrangeiro. Envolverde/IPS