Bisi Alimi, colunista do The Guardian, argumenta que não adianta oferecer o teste se não houver o apoio emocional necessário ao infectado.
A notícia de que a Food and Drug Administration (FDA), agência que regula alimentos e medicamentos nos Estados Unidos, aprovou testes caseiros de HIV foi acompanhada da esperança de que o fato reduza o estigma acerca da doença e devolva a “normalidade” à vida do infectado. Alguns médicos, instituições de caridade e prestadores de serviços especializados em HIV argumentam que esta tendência inovadora de diagnóstico precoce feito em casa proporcionará um melhor tratamento e cuidados. Já outros profissionais da área estão longe de acreditar nisso.
Apesar de um diagnóstico precoce seguido de tratamento ser o fator principal nos esforços para conter a epidemia da doença no mundo, isto não significa que essa inovação fará testes de HIV serem algo comum.
Há o risco de estarmos sendo levados pela propaganda, que trará mais benefícios à Orasure Technologies, que criou o teste caseiro OraQuick In-Home HIV Test, do que ajudará aos que receberam o diagnóstico positivo da doença.
Muitas pessoas no Reino Unido lembram dos terríveis anúncios do governo no início da década de 1980, que exibiam lápides com a mensagem “Não morra por ignorância”. Atualmente todos concordam que, por mais bem intencionada que fosse a campanha, ela acabou equiparando a aids com a morte, o que aumentou em larga escala o estigma dos infectados.
Trinta anos depois, este estigma ainda persiste. Pesquisas feitas online mostram que o preconceito é alarmantemente alto. Após um experimento de três semanas, foi descoberto que 90% das mensagens postadas em um site de relacionamentos usando perfis de homens que se declaram HIV positivo não recebiam nenhuma resposta ou basicamente “Não, obrigada. Você é soropositivo”. As mesmas mensagens, com os mesmos perfis, mas com um status de não portador do vírus, obtiveram respostas positivas.
Não deveria ser surpresa que as pessoas relutem em descobrir se estão ou não com a doença. Elas têm muito medo de cruzar essa fronteira. Não há nada que mexa mais com o emocional do que descobrir que se é HIV positivo.
Bisi Alimi, colunista do The Guardian, conta que antes de ir para Londres ele cresceu na Nigéria, durante a década de 1990, e era um jovem ativista pelos direitos dos portadores de HIV. Lá, a ética dos testes de HIV era construída sobre o que eles chamavam de “testes de HIV e aconselhamento voluntário”. Antes e depois do aconselhamento, todos eram obrigados a fazer o teste de HIV. “Isso não era para criar empregos para conselheiros. Nós sabíamos que, com todo o estigma e a discriminação, existia uma necessidade de apoio à pessoas que descobriram ser portadores da doença”, disse. Em dez anos de luta em defesa dos direitos dos soropositivos, ele conta que nunca viu ninguém que estivesse preparado para o resultado do teste.
Segundo o colunista, pessoas recém-diagnosticadas com o vírus precisam de apoio. Embora os testes caseiros tenham uma linha telefônica que oferece suporte psicológico, não há garantias de sua qualidade e, certamente, não é a mesma coisa do que ter alguém na sua frente aconselhando. As pessoas não deveriam ser deixadas em casa, sem ninguém para conversar.
“Algumas pessoas argumentam que a minha forma de lidar com os testes de HIV é muito conservadora, mas a verdade é que o apoio nesse momento já ajudou muitas pessoas a darem início ao tratamento e terem uma visão mais esperançosa de futuro”, diz Alimi. “Diferentemente do FDA e outras agências reguladoras, eu lido com seres humanos. E é a realidade deles que me mostra que o HIV não será tratado como algo normal e que testes caseiros não são a resposta para solucionar o diagnóstico tardio”, completa.
* Publicado originalmente no jornal The Guardian e retirado do site Opinião e Notícia.